23 setembro, 2012

Racistas ou Imbecis


Querido diário:
Falo de Monteiro Lobato, Érico Veríssimo e Graciliano Ramos. Ou seja, não falo de racistas nem de imbecis. Mas há racistas aqui e ali e imbecis lá e acolá. Agora a moda é criticar Monteiro Lobato por ter escrito

Tia Nastácia, esquecida dos seus numerosos reumatismos, trepou, que nem uma macaca de carvão.
(Caçadas de Pedrinho)

A ofensa aos racistas enrustidos está no fato de que se associa uma pessoa a uma macaca ou o macaco ao carvão?

Já fiquei em dúvida se eu sou um estúpido, um imbecil ou um idiota, pois vangloriava-me de ter lido todas as obras infantis do homem que adivinhou que o Brasil nadava sobre petróleo! E nunca notei que esta frase encontra-se lá no meio das "Caçadas de Pedrinho". Não lembro, tampouco, do restante do contexto. Juro que não havia racismo e que não foi isto o que me fez um agente social que odeia todos os tipos de preconceitos, estereótipos e etnocentrismos. Inclusive apelidos depreciativos.

Pois bem. Vejamos Érico:

Clarissa se lembra dum negro velho que tocava cordeona lá na estância.
(Clarissa)

Puro racismo, né, meu? Um senhor de idade que tocava concertina. E quem dançava o solidó? E agora com isto?

A seu lado, Cleonice caminha com um pacote de doces para os negrinhos.
(Música ao longe)

Negrinhos? Efebos? Por sinal, Monteiro Lobato tem o conto "Negrinha", que faz chorarmos solidários com o sofrimento da pequenina.

Ok, Graciliano:
Sim senhor! Mandar o preto convidar-me! Era, sem contestação, uma ofensa mortal.
(Caetés)

Sem contestação, agora o racista é o João Valério (narrador) ou o então jovem Graça? Ou ele seria apenas enviesado contra os índios?

Guardo um ódio feroz ao Neves, um ódio irracional, e dissimulo, falo com ele: a falsidade do índio.
(Caetés)

Pera aí: se o carinha vai declarar-se um caeté, assumindo a falsidade como estilo de conquistar, então ele é racista? Mas vejamos esta viagem de macaquices.

Notei a singularidade quando principiaram a elogiar o meu paletó cor de macaco.

 E agora a confissão:

Conformado, avaliei o forro, as dobras e os pespontos das minhas ações cor de macaco.
(Infância)

Agia com a cor do macaco. Logo odiava os índios, está comprovado. Uma vez que essa sentença ali dele é antecedida por

Essas moças tinham o vezo de afirmar o contrário do que desejavam.

Isto é,  como se diz em Rio Negro (epa!), as moças lhe estavan tomando el pelo. E eles, nenhum dos três, não podem ser acusados de racismo por entenderem que a palavra "branco" (ou era "neve"?) pode ter mais de 20 significados.

DdAB
As três imagens vêm do espetacular site clicável aqui. E eu já falara antes neste negócio da ironia aqui.

2 comentários:

Bípede_Pensante disse...

Duilio,

meu orientador de doutorado uma vez contou uma história: que ele, quando criança, estudava piano e desejava ser músico e compositor quando crescesse. Aí, quando começou a aprender mais e mais músicas, chegou à conclusão que todas as músicas maravilhosas já haviam sido compostas e desistiu: foi estudar filosofia. Lembro de ter pensado, na época, que ele provavelmente ficou frustrado igual - hehehe. No final das contas, parece que nascemos tarde demais, num mundo velho demais. Ao ler isso aí que vc escreveu, pensei que o mundo, além de velho demais, também está ficando chato demais com essas neuras do politicamente correto pra lá e pra cá. Para nossa sorte os três, que não eram mesmo nem racistas nem imbecis, escaparam dessa chatice toda...

Brena.

... DdAB - Duilio de Avila Berni, ... disse...

è vero, B.P. ainda vou escrever uma história de ficção científica em que os indivíduos humanos trabalharão uns 15seg em seu curso de alguns bilhões de anos de vida. Claro que vão preparar-se para isto uma enormidade, mas ainda assim será cada vez mais difícil expandir a fronteira do conhecimento humano, não apenas na música ou na filosofia. Por contraste, as burradas, imbecilidades, prosseguirão sendo mais ou menos do mesmo teor que têm as contemporâneas.
DdAB