13 março, 2012

O Eixo-Primário Exportadador e a Fisiocracia


querido blog:
este é o relato do, como diz acima, seminário que apresentei ontem no IPEA, em Brasília, como diz acima e, como diz acima, sob o título acima. enigmático, vice-rei da confusão. digo, aqui. o seminário não deixou margem a confusão: minha visão neo-heterodoxa deixou claro que esta é uma escola de pensamento econômico florescente em todo o Brasil. algumas das posições compartilhadas por muitos brasilienses, expostas tanto por eles themselves quanto por seus convidados ourselves, o que me inclui. e obviamente também houve candentes protestos quanto a este tipo de encaminhamento, cuja ênfase repousa precisamente no tipo de argumento que leva a que muitos pensem que a exportação de suco de laranja e minério de ferro é casca grossa.

off the record, deixei muito claro que não é uma deslavada mentira eu dizer que a presidenta Dilma foi minha estagiária, digamos, em 1974, na Fundação de Economia e Estatística da gradeada cidade de Porto Alegre. também lhes disse que pesquisei em todas (nada falei sobre generalização com base em amostra de conveniência, hehehe) as casas da cidade e em todas elas vi grades e cães de guarda, dado o desvelo (digo, desmazelo) com que os governantes tratam o setor serviços (sistema de segurança/justiça) no Brasil.

um detalhe importante é que a moldura de meus slides (vai um exemplo aqui) foi declarada como inspirada no cubo mágico (o meu é made in China). nele também vemos o nome do prof. Joal de Azambuja Rosa, meu co-autor no paper de 90 páginas que originou nosso paper de 33 páginas cujo resumo lá exibi, com estas molduras.
este negócio de cubos mágicos e tudo o mais made in China recebeu um comentário acre de minha parte: comerciar com a China não é cultivar o livre-comércio. lá existe uma escandalosa manipulação da taxa de câmbio há milhares de anos. além disso, lá existe um escandaloso dumping social, até mais pernicioso para a humanidade do que a própria discriminação da taxa de câmbio. isto não é livre- comércio, nem aqui nem na China e -dizíamos em Matto Grosso- nem na Carolina (hoje, mais viajado, indago-me se era a do norte ou a do sul).

mas revelei, durante as discussões, meu sonho de que o Brasil crie a Universidade da Mandioca (e talvez milhares de outras, estudando a árvore de produtos tropicais [esta frase é estranha, por ser metafórica: árvore é vegetal, árvore de produtos dá apenas no papel, como modelagem acadêmica da natureza; produtos tropicais são a mandioca e o inhame, além do cupuaçu e do açaí]). disseram-me que outros seminaristas já falaram nisto e, o que é principal, que a própria China tem-se dedicado a estudar o que mais pode ser feito com a mandioca. chegou-se mesmo a sugerir que não deveria surpreender-nos ver paredes de mandioca. não falei -e não foi por timidez- que imagino que os próprios chineses, mas o bom mesmo seria que fizéssemos e exportássemos para eles (além de resolvermos nossos problemas habitacionais) paredes divisórias de casca de arroz aglutinada com cola de mandioca).

outro ponto maravilhoso que me foi trazido à reflexão é sobre o limite da racionalidade de uma ideia que apregoa haver uma composição setorial ótima para uma economia. minha resposta é (não dei no seminário): obviamente não. o máximo a que cheguei por perto dela é entender que o limite, na linha do Efeito Excel, de que falarei abaixo, é todo o valor concentrar-se nos serviços. e, dentro deles, nos intermediários financeiros e, dentro deles, nos seguros generalizados de Keneth Arrow. e isto não é ideal, mas simplesmente tendência. claro que levará mais anos do que meu cérebro permite acompanhar...

os pontos centrais do paper enfatizados no seminário são que

.a. é um mito dizer que o Brasil está piorando, pois está cultivando um modelo de reprimarização, baseado no desempenho da pauta exportadora: muito produto agrícola e muito minério.
.b. parece que há desindustrialização precoce (não desindustrialização convencional, à inglesa), mas talvez o que haja mesmo a constatação de que teria havido uma industrialização precoce.
.c. a salvação da lavoura, por assim dizer, é investir-se em educação, saúde, segurança pública, previdência, justiça, essas coisas. ou seja, usar a força governamental para motivar-se e à comunidade para promover medidas que levem à sociedade igualitária.

houve muito mais coisa que apenas a posteridade saberá in totum. off the record, apenas agora, deixo claro que estou mesmo é sugerindo que paremos de rezar pela cartilha convencional tão do agrado dos neo-desenvolvimentistas contemporâneos, e seu viés fisiocrático. há gente que não consegue pensar que o setor serviços (ou melhor, as empresas diversificas, os conglomerados, os grupos econômicos que prestam serviços, além de fazerem dezenas de outras coisas) pode ser o polo dinâmico de uma economia como a brasileira. a este respeito, falei do Efeito Excel: em Porto Alegre, a agropecuária responde por zero por cento do PIB, mas há pêssegos produzidos na Vila Nova e cavalos, em Belém Novo. isto não significa que eles sejam inúteis. claro que precisamos de cultivo de peixes e asininos, mas eles não são dinamizadores intrínsecos da economia precisamente devido ao fato de que seu valor é reduzidíssimo.

mais off de record: falei que aprendi com Leontief o conceito de "quantidade monetária", que é o que integra a matriz de insumo-produto. reflexões posteriores levaram-me a dar-me conta do ensinamento da primeira aula do curso de ciências econômicas: M*V=P*Q, ou seja, o valor adicionado (ou seja, o PIB, a renda ou a despesa, que os três são iguais) é igual à quantidade de moeda em circulação. se M*V é igual a 100, então o PIB não pode ser 99 ou 101, nem 999, nem qualquer outro valor diferente de 100. então de onde vem o valor? obviamente vem de um volume de dinheiro que a sociedade avaliza. e penaliza os erros de si própria com inflação ou deflação. essencialmente expando o assunto para o conceito de NAIRU (ou seja, a taxa de desemprego que não acelera a inflação, que prefiro ver na visão moderna, que substitui a palavra "desemprego" por "utilização da capacidade instalada"). de onde vem o valor? do montante de moeda fiduciária disponibilizado pelo sistema monetário, pelas autoridades monetárias, pelo presidente do Banco Central. então: quem determina o valor das mercadorias? a sociedade!
DdAB
P.S. de 10/abr/2012: esse negócio de 'valor é MV' tem obviamente na inflação uma distorção ampliativa e nos aumentos de produtividade do sistema outra distorção, só que redutiva.

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