querido diário:
as festanças continuam. minha euforia é que as eleições acabaram, as denúncias vão parar, os times de futebol vão continuar sua trajetória em heróicas tentativas de não se desligarem do clube da baixaria, os mendigos seguirão na rua, os assantantes seguirão exercendo suas funções. pelo menos por uns tempos. a questão é quanto tempo, quanto tempo. será que algo mudará, digamos, num ritmo que nos permita ver que mudou o ritmo?
vivo falando no conceito de sociedade justa trazido à agenda da filosofia política por John Rawls num livro de 1971 e que foi publicado -in due time- pela Universidade de Brasília. diz Rawls que, na sociedade justa, a liberdade é o princípio absolutamente soberano. eu sempre digo: sou livre precisamente por não ter direito de ter escravos (pois obviamente o assunto começou com o direito do "outro" de não ser escravo). depois, Rawls fala que, na sociedade justa, todos terão livre acesso aos cargos públicos. ou seja, não teremos nepotismo nem, talvez, loteamento de cargos. qualquer um, como a turminha da figura capturável (aqui), poderá ser dirigente da Petrobrás, não apenas os amigos do rei (ou, agora, da rainha).
(por fim, Rawls fala que, na sociedade justa, se houver desigualdade, esta deve ser administrada de sorte a favorecer os menos aquinhoados. entendo como imposto de renda e, mais recentemente, depois da argúcia de Milton Friedman, o imposto de renda negativo e, assim, a renda básica universal).
o que me deixa preparado ao desencanto é observar que os políticos (logo, ladrões, remember?) não falam tanto de programas de governo, mas de ganhar "pastas" quetenham gordos orçamentos. que quer dizer gordos orçamentos? num país de controles orçamentários edêntulos, sabemos bem do que estão falando: das propinas, dos 10%, dos desvios de verbas, dos presentes "por fora", das associações, do nepotismo, desta série infindável de burlar não apenas o princípio da abertura dos cargos públicos a todos. mais que isto, o que vemos é que, por petitio principii, entram os parentes e a "companheirada" e depois a companheirada ajuda a melhorar o desempenho distributivo privado dos amigos dos amigos.
e de onde irei tirar forças para arrancar alegria ao futuro? creio que do resíduo deste gasto público que pode ajudar a criar condições para a mudança em certo e longínquo horizonte de tempo: gasto em educação, gasto em segurança pública, gasto em saúde e saneamento, esses gastos que, ainda que gerando propinas, uma vez feitos, tornam-se redistributivos.
mas ainda tem mais. caso o mundo mantenha-se próximo a uma depressão prolongada e ativadora de uma corrida cambial e protecionismo (coisas que previ -usando não mais que o prefácio de meu livro de graduação de macroeconomia- precisamente no dia em que comecei a pensar na crise de setembro de 2008, juntamente com desemprego e inflação). e isto tem a ver com exercícios de análise estrutural por decomposições propiciada pelo modelo de insumo-produto: as fontes do crescimento econômico brasileiro sempre estiveram majoritariamente associadas ao mercado interno. é possível que agora um programa de "redistribution with growth" possa fechar estas duas pontas da ponte. em boa medida, foi isto o que aconteceu durante os últimos 10 anos.
DdAB
Nenhum comentário:
Postar um comentário