15 abril, 2012

Vésper Desponta


querido diário:
é cedo, mas é certo que Vésper despontará, afinal há regularidades mundanas capturadas por meus sentidos. tenho uma pergunta para humanos e bichos, mas tenho a certeza de que, se alguém responder, será o prof. Conrado. tudo começou num versinho que me veio à cabeça:

abrem-se flores, Vésper desponta, cantam os anjos ave Maria. 

o que é isto? depois de rápida pesquisa no Google, vi pilhas de referências: poema de Fagundes Varela, progressista município do RGS. o que essa galera, mistura de gringo com autóctones, têm a ver com o poeta de Rio Claro?

mas daí fiz as seguintes e importantes ponderações (em rimas) ao refinado professor Conrado:

.a. vespertino é de manhã? as flores abrem-se de manhã, mas Vênus nasce à tardinha; e

.b. já que estamos no assunto: estival é um adjetivo para verão.  e veranil? e outono é outonal?, inverno é hibernal? e primavera é primaveril?

foi este o cerne do teor da mensagem. depois de lê-la, pensei que, se me fosse dado um CC para refazer o afamado poema, eu reescreveria este/s verso/s como "no convento, era uma cheirosa tarde primaveril". pode? da mensagem  conradiana editei algumas coisinhas. respondeu o preclaro professor [que, gentilíssimo, tomou a liberdade de não dar bola para minhas vírgulas e ce-cedírgulas]:

"abrem-se as flores, Vésper desponta, cantam os anjos ave Maria"

As flores, de fato, se abrem de manhã, mas é possível pensar que também se abram quando chega a primavera, não? Ora, se isso é verdade, pouco nos importará a hora do dia. Resgatamos, assim, a verossimilhança do poema.

Vespertino vem de vésper (lat. Vesper = Vênus). Ora, esse planeta, que a olho nu parece uma estrela (tanto que lhe chamamos também "estrela da tarde") se mostra à tardinha. Daí dizermos 'vespertino" ou "vesperal" para mencionar o que se dá à tarde. Também "véspera(s)" tem essa origem, embora, por alguma razão, seu sentido mais conhecido se refira àquilo que se realiza no dia anterior ou nos dias anteriores a certo dia de referência.

Para verão os adjetivos são "estival" e "estivo"; para outono, "outonal", "autunal" e "outoniço"; para inverno, "hibernal", "hibernoso", "hiemal", "invernoso".

 e que direi eu? que muito aprendo com ele! que ele tem um dos poucos marcadores de meu blog.
DdAB
p.s. e como melhor ilustrar esta aula? com a imagem capturada em abcz. e que diria ele deste "melhor ilustrar". uma colega dele diz que o adjetivo melhor não tem o direito legal de modificar o verbo ilustrar, pois quem modifica verbo é advérbio. diria? ela não diria que melhor é, neste caso, advérbio, como parece que -diz ela- seu irmão encontrou algo na linha de "melhor cheirar" no Próprio Machado de Assis.

p.s.s. e que tem a ver prato de verduras com o prof. Conrado? tem que, na condição de abstêmio, ele pode cometer as maiores loucuras, inclusive fornindo-se de verdes mares, digo, o Rio Guaíba está tomado por algas, esverdeando-o. mas, no caso, seriam apenas verdes saladas, pois verdes mares leva a confusão com Castro Alves (o nome, obviamente, de um município, pois com cinco mil municípios e milhares de vereadores, não haverá poeta que fique sem sua homenagem). não era ele?

p.s.s.s. e de onde tirei que há gringos em Fagundes Varela? o sr. Aurelião diz que 'gringo' vem do espanhol 'griego'. eu ouvira dizer que vem dos mexicanos xingando os americanos: 'green go' [green uniforms: go back home, you expropriative devils!]. mas, para nós, abitantes do Rio Grande do Sul, homens com o agá que faltou acolá, quer dizer 'italiano' ou 'de origem'. tão estranhos são os gaúchos que 'vesperal', no município de Clark Gable, oslt, já designou sessão matutina de cinema. de sua parte, o Uébster -que, se não é melhor do que o Aurelião, sê-lo-á muito mais grosso- não chega até o grego, e não reluta em dizer que é uma burundanga originária do espanhol. ok, ok, ele não fala em burundanga, o que me veio do Leonel Vallandro (Editora do Globo, 1954). de sua parte, para burundanga, o Aurelião fala em palavreado confuso; algaravia, mistura de coisas imprestáveis; mixórdia; confusão, embrulhada, trapalhada; cozinhado malfeito, ou sujo e repugnante. e até mezinhas empregadas na feitiçaria.

p.s.s.s.s. Esta nota escrevi-a na postagem de 18 de abril de 2012, quase 10 anos depois! Lá vai:
Escrevo em 6/abr/2021, 9h10min. Veio-me à cabeça o nome "vesper" e queria lembrar seu alias. E não lembrei, mas agora sei, "fósforo". Pois vim ao blog, pois ainda tinha quente na memória esta postagem. Ativei o motor de busca do canto superior esquerdo da página inicial do blog. E eis que encontro aqui uma deliciosa explicação a minha pergunta feita diretamente ao prof. Conrado de Abreu Chagas. E lá encontramos sua refinada resposta.

2 comentários:

PROF. CONRADO disse...

Eis aí talvez o próprio cerne da arte literária, my dear friend, es decir: "on fait beaucoup de chose à partir de presque rien".

Mas é preciso conhecimento de língua e, sobretudo, muita criatividade, coisas que não te faltam, Dondo.

Grande abraço!

... DdAB - Duilio de Avila Berni, ... disse...

a bondade do prof. Conrado quanto 'à mes écrits' é proverbial. além disso, ele deu-me uma ideia: as postagens que carregarem exclusivamente o marcador 'Vida Pessoal' deverão ser assinadas como 'Dondo', que é como a srta. minha neta me balbucia.
DdAB, digo, Dondo.