querido blog:
em estilo diário, mas não de um alienado, mas sim engajado, sigo em postagens cruzadas entre economia política e vida pessoal. sob o ponto de vista social, nada mais me alegrou do que saber que, entre os cinco grandes imperadores romanos, não havia nenhum chamado de Duilio. de certa forma, a presença desta ausência foi registrada em minha postagem de primeiro de março e sua ausência absoluta em 26 de abril. mas há novidades, como podemos observar na foto que hoje nos ilustra. foto de Tânia Giesta, ou melhor, de sua inspiração e minha encomenda (e edição). outro agente social a enquadrou, presumo. devo indagar, descobrir mais detalhes.
a verdade é que eu não queria fazer aqui um altar do culto de minha personalidade. e a verdade verídica é que não o estou fazendo, pois informei:
.a. às vezes abrevio (especialmente em alguns e-mails) meu nome como "d", para não ser confundido com D (dos deuses...)
.b. que não há nenhum imperador Duilio
.c. que a Rua Duilio, em conjunção com a Rua Tito (pai de César Leal?) não tem este nome em minha homenagem. como diria Roland Barthes na p.118 da obra "A Câmara Clara", da Edições 70, sita à Rua Duque de Ávila, 69 r/c. Esq. - 1000 Lisboa e distribuído no Brasil pela Livraria Martins Fontes (local diverso da Rua Duilio), ao exibir a foto de André Kertész intitulada Ernst, em 1931, em Paris: "É possível que Ernst viva ainda longe: mas onde? Como? Que romance!". romances os há em todo o lugar, bem o sabemos, e aqui mesmo já pintam mais dois. o primeiro é como é que o Duque de Ávila foi parar numa rua? não seria Duílio de Ávila e se enganaram entre "que" e "ilho"? o segundo é que lembrei, com esta nota ".c.", o que lemos na p.133 do livro de Osman Lins cujo título é "A Rainha dos Cárceres da Grécia" e que li em Berlim, em narração de primeira pessoa, após evocar o poema:
Morta Laura, il passato, il presente
e il futuro, tutto gli è tormento e pena
La vita vigge e non s'arresta una ora,
e la morte vien dietro a gran giornate,
e le cose presenti e le passate
mi danno guerra, e le future ancora;
e'l rimembrare e l'aspettar m'accorda
or quinci or [...]
após rimembrare, repito, reage e filosofa:
Não, Petrarca, teu soneto não é duro bastante para celebrar o aniversário, o segundo, da iníqua morte de Julia, esmagada, cinco meses depois de dar por terminada a sua obra, sob um caminhão GM de cor verde, chassi de oitocentos e oitenta e dois milímetros, eixo dianteiro tipo viga em 1 (capacidade três mil, setecentos e cinquenta quilos), eixo traseiro flutuante dupla redução (capacidade nove mil e trezentos quilos), tanque para cento e quatro litros de óleo diesel, freios a ar, pneus de doze e catorze lonas, carregado, peso bruto total vinte e dois mil e quinhentos quilos.
supondo, desta forma, que nada do que acima consta me diz respeito diretamente, vim a colocar em perspectiva o que resta da postagem que agora entro em fase de conclusão. na Carta Capital desta semana (n.608), as p.46-48 têm uma entrevista com Carlos Lessa (já postei a respeito dele, clique aqui). a direita já lhe endereçou muitas críticas, mas -por falar em crítica- vejamos outra, que lhe faço pela esquerda. disse o indigitado economista:
[...] A grande desindustrialização aconteceu nos anos 1990 e no início dos anos 2000. No governo Lula, esse processo foi interrompido, mas ainda não há uma retomada significativa do processo de industrialização. O que creceu no Brasil nos últimos anos não foi a indústria, foi o Brasil pós-Tordesilhas, o Centro-Oeste e Amazônia Meridional. O que estamos fazendo é reproduzir o modelo da República Velha. Tormano-nos o país da soja, do boi, do etanol. Há uma única diferença. Naquele tempo, o café era todo nacional. A semente era produzida pelo Instituto Agronômico de Campinas, a estrada de ferro era em grande parte nacional, os exportadores e até os bancos eram nacionais. Hoje, a semente é produzida pela Monsanto, o fertilizante é importado. Nenhum fabricante de máquinas é brasileiro. Os defensivos não são brasileiros e, dos três maiores exportadores de soja do País, nenhum é brasileiro. Não vamos ser a República Velha. Estamos pior do que na República Velha. Éramos uma economia primária e naconal. Hoje somos primários e internacionalizados.
tem tanta coisa no artigo que me deixa corado. achei que este trecho poderia merecer maiores reflexões. nem vou fazê-las, mas apenas mostrar que fiz uns cálculos que não pretendo explicar aqui. peguei dados do IPEA sobre o PIB real e do IBGE sobre o emprego, uma mixórdia de dados, fontes, coisas de louco. só no Brasil! (ainda prevejo que o IBGE entrará em greve antes do final do Censo que já está chegando às ruas). seja como for, fazendo o melhor que pude cheguei à conclusão que a produtividade do trabalho no setor primário cresceu cinco vezes entre 1950 e 2009. cinco vezes! uma vez que pelo menos serviços bancários e fertilizantes não são bens primários, segue-se que houve grande integração entre a agropecuária e a indústria.
ainda vou escrever mais sobre a tese da reprimarização da economia brasileira, tese esposada por Carlos Lessa e que me deixa fora de combate, ou seja, toda a evidência de que disponho sugere que o lado produtivo da economia brasileira não vai de mal a pior, que seu problema é distributivo, que o fechamento do país para o comércio exterior foi o grande vilão da exclusão do povão (epa, rimas?). minha visão do processo econômico, cada vez mais, desloca o foco da atenção de quem produz (os produtores, encastelados nos setores econômicos) para quem consome (as instituições, entre elas destacando-se as famílias pobres, que abarcavam 70% da população e 15% do consumo em 1980).
parece inegável que o bem-estar do brasileiro médio e mesmo do pobre médio aumentou nestes 60 anos, para não comparar com a turma da República Velha. vive-se mais, ainda que não se disponha de muito maior consumo per capita (comer salmão retirado do lixo não é comer decente). a questão com os 10% inferiores e mesmo os 1% mais pobres não é que lhes falte bem-estar por problemas de carência de produção de alimentos, mas de carência de redes de distribuição a preços compatíveis com suas rendas.
afortunadamente o Brasil desindustrializou-se, afortunadamente a economia é tão integrada que os "centros dinâmicos" são de tal maneira pulverizados que não mais podemos falar em "economia primário-exportadora". ou melhor, podemos, podemos falara até em capacidade de carga de caminhões, quando fazemos poesia. podemos tudo, mas poesia é da vida pessoal, ao passo que produtividade é da economia política.
DdAB
em estilo diário, mas não de um alienado, mas sim engajado, sigo em postagens cruzadas entre economia política e vida pessoal. sob o ponto de vista social, nada mais me alegrou do que saber que, entre os cinco grandes imperadores romanos, não havia nenhum chamado de Duilio. de certa forma, a presença desta ausência foi registrada em minha postagem de primeiro de março e sua ausência absoluta em 26 de abril. mas há novidades, como podemos observar na foto que hoje nos ilustra. foto de Tânia Giesta, ou melhor, de sua inspiração e minha encomenda (e edição). outro agente social a enquadrou, presumo. devo indagar, descobrir mais detalhes.
a verdade é que eu não queria fazer aqui um altar do culto de minha personalidade. e a verdade verídica é que não o estou fazendo, pois informei:
.a. às vezes abrevio (especialmente em alguns e-mails) meu nome como "d", para não ser confundido com D (dos deuses...)
.b. que não há nenhum imperador Duilio
.c. que a Rua Duilio, em conjunção com a Rua Tito (pai de César Leal?) não tem este nome em minha homenagem. como diria Roland Barthes na p.118 da obra "A Câmara Clara", da Edições 70, sita à Rua Duque de Ávila, 69 r/c. Esq. - 1000 Lisboa e distribuído no Brasil pela Livraria Martins Fontes (local diverso da Rua Duilio), ao exibir a foto de André Kertész intitulada Ernst, em 1931, em Paris: "É possível que Ernst viva ainda longe: mas onde? Como? Que romance!". romances os há em todo o lugar, bem o sabemos, e aqui mesmo já pintam mais dois. o primeiro é como é que o Duque de Ávila foi parar numa rua? não seria Duílio de Ávila e se enganaram entre "que" e "ilho"? o segundo é que lembrei, com esta nota ".c.", o que lemos na p.133 do livro de Osman Lins cujo título é "A Rainha dos Cárceres da Grécia" e que li em Berlim, em narração de primeira pessoa, após evocar o poema:
Morta Laura, il passato, il presente
e il futuro, tutto gli è tormento e pena
La vita vigge e non s'arresta una ora,
e la morte vien dietro a gran giornate,
e le cose presenti e le passate
mi danno guerra, e le future ancora;
e'l rimembrare e l'aspettar m'accorda
or quinci or [...]
após rimembrare, repito, reage e filosofa:
Não, Petrarca, teu soneto não é duro bastante para celebrar o aniversário, o segundo, da iníqua morte de Julia, esmagada, cinco meses depois de dar por terminada a sua obra, sob um caminhão GM de cor verde, chassi de oitocentos e oitenta e dois milímetros, eixo dianteiro tipo viga em 1 (capacidade três mil, setecentos e cinquenta quilos), eixo traseiro flutuante dupla redução (capacidade nove mil e trezentos quilos), tanque para cento e quatro litros de óleo diesel, freios a ar, pneus de doze e catorze lonas, carregado, peso bruto total vinte e dois mil e quinhentos quilos.
supondo, desta forma, que nada do que acima consta me diz respeito diretamente, vim a colocar em perspectiva o que resta da postagem que agora entro em fase de conclusão. na Carta Capital desta semana (n.608), as p.46-48 têm uma entrevista com Carlos Lessa (já postei a respeito dele, clique aqui). a direita já lhe endereçou muitas críticas, mas -por falar em crítica- vejamos outra, que lhe faço pela esquerda. disse o indigitado economista:
[...] A grande desindustrialização aconteceu nos anos 1990 e no início dos anos 2000. No governo Lula, esse processo foi interrompido, mas ainda não há uma retomada significativa do processo de industrialização. O que creceu no Brasil nos últimos anos não foi a indústria, foi o Brasil pós-Tordesilhas, o Centro-Oeste e Amazônia Meridional. O que estamos fazendo é reproduzir o modelo da República Velha. Tormano-nos o país da soja, do boi, do etanol. Há uma única diferença. Naquele tempo, o café era todo nacional. A semente era produzida pelo Instituto Agronômico de Campinas, a estrada de ferro era em grande parte nacional, os exportadores e até os bancos eram nacionais. Hoje, a semente é produzida pela Monsanto, o fertilizante é importado. Nenhum fabricante de máquinas é brasileiro. Os defensivos não são brasileiros e, dos três maiores exportadores de soja do País, nenhum é brasileiro. Não vamos ser a República Velha. Estamos pior do que na República Velha. Éramos uma economia primária e naconal. Hoje somos primários e internacionalizados.
tem tanta coisa no artigo que me deixa corado. achei que este trecho poderia merecer maiores reflexões. nem vou fazê-las, mas apenas mostrar que fiz uns cálculos que não pretendo explicar aqui. peguei dados do IPEA sobre o PIB real e do IBGE sobre o emprego, uma mixórdia de dados, fontes, coisas de louco. só no Brasil! (ainda prevejo que o IBGE entrará em greve antes do final do Censo que já está chegando às ruas). seja como for, fazendo o melhor que pude cheguei à conclusão que a produtividade do trabalho no setor primário cresceu cinco vezes entre 1950 e 2009. cinco vezes! uma vez que pelo menos serviços bancários e fertilizantes não são bens primários, segue-se que houve grande integração entre a agropecuária e a indústria.
ainda vou escrever mais sobre a tese da reprimarização da economia brasileira, tese esposada por Carlos Lessa e que me deixa fora de combate, ou seja, toda a evidência de que disponho sugere que o lado produtivo da economia brasileira não vai de mal a pior, que seu problema é distributivo, que o fechamento do país para o comércio exterior foi o grande vilão da exclusão do povão (epa, rimas?). minha visão do processo econômico, cada vez mais, desloca o foco da atenção de quem produz (os produtores, encastelados nos setores econômicos) para quem consome (as instituições, entre elas destacando-se as famílias pobres, que abarcavam 70% da população e 15% do consumo em 1980).
parece inegável que o bem-estar do brasileiro médio e mesmo do pobre médio aumentou nestes 60 anos, para não comparar com a turma da República Velha. vive-se mais, ainda que não se disponha de muito maior consumo per capita (comer salmão retirado do lixo não é comer decente). a questão com os 10% inferiores e mesmo os 1% mais pobres não é que lhes falte bem-estar por problemas de carência de produção de alimentos, mas de carência de redes de distribuição a preços compatíveis com suas rendas.
afortunadamente o Brasil desindustrializou-se, afortunadamente a economia é tão integrada que os "centros dinâmicos" são de tal maneira pulverizados que não mais podemos falar em "economia primário-exportadora". ou melhor, podemos, podemos falara até em capacidade de carga de caminhões, quando fazemos poesia. podemos tudo, mas poesia é da vida pessoal, ao passo que produtividade é da economia política.
DdAB
2 comentários:
Amigo Duílio: muito original tua ideia de utilizar a foto da Rua Duilio aqui!
Parabéns pela competencia em escrever e pela criatividade!
oi, Tânia:
obrigado pela presença. é um passo adiante este de comentares. citei a fonte, fiquei com medo de desagradar. mas alegra-me ver tua aquiescência.
abraços
DdAB
Postar um comentário