27 agosto, 2010

Eleições etc.: deu no Faoro

querido blog:
teria dito Machado de Assis: se tu pesca muito, então tu lê pouco. ou melhor, quem teria dito esta sentença pouco aquerenciada ao português machadiano poderia ser o Gaúcho da Fronteira, cantor escorreito e candidato a deputado que, se bem entendo, tentará contratar-me ou a algum outro economista de aguda visão para ministrar-lhe um curso de teoria da escolha pública. ah, essa política brasileira contemporânea.

e teria dito Machado de Assis: "ah, essa política brasileira contemporânea", não é mesmo? e que teria dito Raymundo Faoro do que teria dito Machado de Assis? agora sim: "A nação não sabe ler." quem não lê mal ouve, mal fala, mal vê. quem mal ouve, mal fala, mal vê não pode votar decentemente. quem não se interessa por política devia ser proibido de votar. quem não tirar pelo menos nota cinco num exame de nível intermediário de teoria da escolha pública devia ser proibido de votar. votar, claro, é uma forma de fazer política. outra, como é meu caso, é dizer:

"política no Brasil? não vote. mas, se tiver que votar, anule o voto!"

a chapa Serra-Dilma deixou-me louco, o que foi agravado pelo fato de que não me foi dado lançar tarrafas sobre eles, como observamos um colega na maravilhosa foto acima, cuja fonte está aqui.

no maravilhoso livro

FAORO, Raymundo (1976) Machado de Assis: a pirâmide e o trapézio. 2ed. São Paulo: Nacional.

Raymundo Faoro (lá na ficha catalográfica, ao contrário da capa etc., fala em 'raimundo'. se eu me chamasse Raimundo, então não me assinaria Raymundo) fala o seguinte, dos tempos machadianos, na p.127:

Quem fazia política no Segundo Reinado? Havia os eleitores e os eleitos, e, à margem dos primeiros, tênue orla de pessoas que vagamente participavam dos pleitos e da luta eleitoral. Além deles está o vácuo inquietante no seu silêncio. Numa crônica de 1876, comentou Machado de Assis o recenseamento do Império, que revelava o índice de 70% de analfabetos. 'A nação não sabe ler". As consequências políticas do fato estão à vista, nunca desdenhadas pelo escritor, atento ao funcionalmetn do mecanismo institucional. 'As instituições existem, mas por e para 30% dos cidadãos' [...]". Embora sombrio o retrato que ele apresenta da nação, está muito aquém da verdade. Nas eleições de 1881, compareceram 96.411 eleitores, pela primeira vez diretamente confrontados com os candidatos, para uma população de provavelmente 12 milhões de habitantes. Menos de 1% da população votava, o que é escandalosamente pouco, mesmo se comparado com época diferente do país. Em 1945, para uma população de 45 milhões de pessoas, o eleitorado alvançou 7.350 mil, cerca de 16,3%. Na década de 20, para uma população de 30 milhões de habitantes, o eleitorado subia apenas a cerca de 4%. Um aspirante à Câmara dos Deputados disputava a eleição, considrados os círculos em que se dividiam as províncias, num grupo, em média, composto de 800 pessoas.

Machado estaria mais correto do que Faoro, não fossem requererimentos auxiliares (mulher não vota, pobre não vota etc.): dos 30% que podem votar, desejaram fazê-lo apenas 100 mil. e daí? por isto defendo o voto voluntário. o próprio coeficiente de abstenção já é um indicador não digo da adesão à política, mas ao sistema eleitoral. agora, torna-se claro que Faoro está falando em "agentes da política", conceito que aprendi com Jorge Vianna Monteiro, em seus livros de 1982 ( cap.6) e 2004 (cap.1): contamos seis agentes ou grupos de agentes atuando no mercado de arranjos institucionais (inclusive monetários). trata-se do cidadão, os legisladores, o chefe do poder executivo, os burocratas, os grupos de interesse socialmente organizados e os juízes.

penso que esta massa disforme pode -mesmo que, provavelmente sim, com a ajuda externa de seus "intelectuais orgânicos"alcançar a famosa consciência de si de que falou Marx. e penso que isto se dará contra os atuais políticos brasileiros, e não com seu auxília. fora da chama Serra-Dilma, temos a utopia conservadora de Plínio de Almeida Sampaio e o destrambelhamento descontente de Marina da Silva. se Plínio tem candidatura juvenil, que dizer de outros?
DdAB

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