15 outubro, 2009

Uma Ata sobre Segurança Pública

Querido Blog:
Aparentemente o que vou escrever abaixo andou de carro de boi, pois ocorreu há eras estratosféricas. Entre as 15h25min e 18h10min do dia 18 de maio, realizou-se uma "conferência livre" buscando sugestões para a Primeira Conferência Nacional de Segurança Pública. Eu fui lá, pensando que representava a seccional Menino Deus do Conselho de Justiça e Segurança, um híbrido comunidade-estado do governo municipa, um troço assim. Fiz um relato que abaixo transcrevo. Solicitei a quem de direito que o transmitisse a meus "pares" do tal ConJus e quem sabe lá que direito arrogou-se de não encaminhar nada, sob a alegação de que o número 2 não permite que se extraia dele a raiz quadrada por meio dos números naturais, um troço destes. A partir de agora, tudo o que será lido vem da tal "ata" que enviei e ninguém leu, pelo menos foi o que me disse um menino de rua analfabeto, até o "DdAB" usual. Depois dele -o DdAB- farei um post scriptum, desenxabido, mas bem sincerinho. Lá vai:

1. Generalidades
Na última reunião do COMJUS-Menino Deus, recebemos o convite de participarmos da Conferência Livre Preparatória a 1a. CONSEG, num evento que ocorreu hoje à tarde na Sala Maurício Cardoso da Assembléia Legislativa, aproximadamente das 15h25 às 18h10min. Esta conferência esteve focada no Eixo 4 do CONSEG, nomeadamente, Repressão Qualificada da Criminalidade. A conferência propriamente teve por título "Estatuto do Desarmamento e Políticas de Controle de Armas", sendo organizada pela OSCIP Guayí - Democracia, Participação e Solidariedade como elo de ligação local com a Caravana Comunidade Segura. Foram distribuídos dois materiais impressos: um relatório da Guayí e a Cartilha da Caravana Comunidade Segura, Campanha de 2009/Desarmamento. Coordenou a reunião a Sra. Helena Bonumá.

As atividades dividiram-se em duas partes:
.a. Mesa Redonda (presença das instituições listadas no convite, a saber, SSP/RS, Polícia Federal, COMJUS/POA, IFCH/UFRGS, Guarda Municipal, Guayí e Caravana Comunidade Segura, com, respectivamente, os seguintes representantes: Coronel Marco Antonio, Delegado Cristiano, Sr. João Hélvio, Profa. Virgínia, Sra. Maria Aparecida, Coronel Brenner e Sra. Heder (Heather?).
.b. Debate Plenário (participação de quatro membros da audiência e respostas por alguns dos painelistas)

2. Destaques
(não se trata de ata, mas de tópicos que me interessaram e comentários que fiz a alguns rasgos da reunião)
.a. O coronel Marcos associou o aumento do mau uso das armas com o consumo de bebida (alcoólica). Falou que deve-se regular e controlar a oferta e a demanda. Também destacou que o RGS, por ser região de fronteira, vem-se tornando rota do tráfico de armas.
.b. O Delegado Cristiano sugeriu que consultemos o site www.dpf.gov.br. Falou da entrega das armas da campanha, ele mesmo dizendo haver burocracias elevadas no processo. de minha parte, fiquei pensando no caso que, para ele, parece normal que a PF exija de quem recolhe uma arma uma declaração de idoneidade da arma, desconsiderando que o próprio ato de comparecimento já dá uma lição de idoneidade do portador. não entendo bem que diabos quer dizer esta declaração: um "x" num formulariozinho? uma declaração assinada por cinco testemunhas e firma reconhecida? acho que este tipo de medida serve para dificultar a entrega de armas de procedência duvidosa, ou seja, ponto contra o desarmamento... disse ele que o povo deixou a entrega para última hora, no dia 31/dez/2008, o que formou filas e até hoje há material não processado, por causa daquele acúmulo de última hora. de minha parte, fiquei pensando que eles foram é incapazes de prever a demanda pelo serviço e, mais ainda, se não conseguiram colocar o serviço em dia, não estavam preparados mesmo para ajudar a desarmar o que quer que fosse. disse que o prazo foi prorrogado até 31/dez/2009. fiquei pensando que um programa destes deve ser periódico, ou seja, se fechar agora deve reabrir, digamos daqui a dois anos e sempre ter -de tempos em tempos- divulgação da campanha recebendo armas. mais ainda, penso que as recompensas (de R$ 100 a R$ 300) deveriam ser substancialmente elevadas (por que não R$ 1.000 ou R$ 3.000?). parece-me evidente que é necessário usar o mecanismo de mercado onde ele possa ser útil para o alcance de determinados objetivos sociais. e também fiquei pensando em indagar (mas tive medo...) sobre qual o controle que fazem das alfândegas e estradas, a fim de evitar o contrabando. [eu sou favorável ao fechamento das alfândegas, mas contra o comércio ilegal de armas. nada tenho contra o comércio legal].
.c. João Hélvio nominou conselheiros de alguns bairros da cidade, sugerindo que o enfoque correto para a questão não é propriamente o delineamento de uma política de segurança, mas de justiça comunitária. pensei: hoje sabemos que o mercado falha (não fornece bens públicos, como a segurança pública, se não houver produção ou provisão pelo governo ou comunidade, não haverá segurança pública), que o estado falha (grupos de interesse, corrupção) e que a comunidade falha (linchamentos, ostracismo). mais ainda: pensei que é importante sabermos diferenciar o que é segurança pública da segurança privada. no caso, nesta linha de raciocínio, a segurança pública é um bem público, no sentido técnico do termo, querendo dizer que o mercado não consegue isolar pagantes: se houver segurança para um, haverá para todos. logo, num local em que não há segurança para todos, claro que pode haver segurança privada, o que nada tem a ver com os temas (jamais esquecerei que uns rapazes paulistas que tentaram assaltar o filho do proprietário dos Supermercados Pão-de-Açúcar foram fuzilados por seus guardas de segurança privada). já que estamos no assunto: justiça e liberdade têm similaridades: não há justiça para mim se há injustiça para ti, nem tens o direito de ter-me como escravo, pois tenho o direito à liberdade. voltando a nosso vizinho João, ele disse que o que queremos é montar o sistema de segurança pública, de sorte que a política do setor seja de estado e não apenas de governo.
.d. a profa. Virginia convidou a todos a participarem da Conferência Livre que a UFRGS vai promover no dia 18 (e não ouvi bem se é de junho ou de julho). disse que seu núcleo de estudos está convidando outros professores, por exemplo, de informática (sistemas de informação sobre violência, posse de armas, roubo de veículos, etc), medicina legal, engenheiros de tráfego, a fim de contribuírem para o equacionamento do problema da segurança pública no Brasl.
.e. a Sra. Heder recomendou a consulta ao site www.comunidadesegura.org (não tem ".br"), a fim de recolhermos o "manual de boas práticas em todo o país" sobre como lidar com a segurança pública e que também há o que chamou de "indicadores de boas políticas", voltados a medir se o estado está desempenhando adequadamente seu papel. disse que não é tão relevante criarem leis, se estas não forem implementadas. eu pensei que a sociedade deverá conscientizar-se, no devido tempo, que a forma de fazer com que as leis sejam cumpridas é forçarmos as representações parlamentares a inserirem itens viabilizando as promessas legais em outra lei, desta vez a lei do orçamento público, que não é levada a sério por ninguém, nem eles, deputados e vereadores, nem pelos detentores de posições no poder executivo. a Sra. Heder citou alguns dados sobre os custos em que a sociedade incide por não ter maior controle sobre armas de fogo. disse ela que, em São Paulo, o mercado de armas ilegais elevou o preço de R$ 800 para R$ 1.300. eu pensei que isto se deveu precisamente à lei e, pior que isto, à incapacidade dos governantes envolvidos com o problema da segurança em usar o mecanismo de mercado, lembrando que na hora pensei que, se o mercado negro está pagando R$ 1.300 por uma arma ilegal, que tal se o governo oferecesse R$ 2.000? Tenho razões para jurar que haveria um dreno de armas ilegais que a Polícia Federal ficaria ainda mais embasbacada com o tamanho das filas. nem corrupção haveria, pois quem quisesse empalmar os R$ 2.000 deveria preencher uma ficha cadastral com seus dados pessoais (sem precisar dar lá tanta explicação sobre a idoneidade moral da própria arma...). disse ela que 95 pessoas morrem por dia vitimadas por armas de fogo, especialmente jovens. São R$ 93 milhões em cinco anos. eu pensei que, em um ano, este dinheiro paga 3.200 funcionários com um salário de R$ 500, talvez mais eficaz do que as medidas em que este dinheiro foi aplicado. também chamou a atenção para as empresas de segurança privada, que têm itens de regulamentação na lei do desarmamento. e listou o que cada um pode fazer. anotei apenas o que segue: conhecer o estatudo e difundi-lo, olhar o site www.deolhonoestatuto.org.br, ler as cartilhas, ficar de olho, estimular postos alternativos.
.f. o coronel Brenner também diferenciou a segurança pública da segurança privada, sugerindo que se deve apostar na política nacional de segurança e aprofundar a restrição e controle de armas, também requerendo que os governantes dêem visibilidade às estatísticas sobre o controle de armas de fogo.
.g. o Sr. Paulo manifestou preocupação com "os menos favorecidos", que devem receber educação e qualificação. o Sr. Pires sugeriu que as empresas de segurança privada, como a STV, Rudder e HSS, devem receber regulamentação, a fim de não forçarem seus trabalhadores a jornadas de 12 horas diárias, o que pode tornar as armas que portam perigosas para a comunidade.
.h. eu mesmo aproveitei e disse que não entendo a ênfase em outros pontos, pois a sociedade parece apontar como seus maiores problemas a segurança e o desemprego e me parece evidente que a criação de empregos na segurança resolverá os dois simultaneamente. ia fazer mais um pouco de propraganda do programa da renda básica universal, mas contive-me...
.i. a palavra voltou aos painelistas. destaco o que disse a Sra. Heber, que é o que já ouvi dizerem sobre os meninos de rua, mutatis mutandis: precisamos brigar pelo direito de não ter armas. no outro caso, a questão não é se o menino tem o direito de ficar na rua (parece-me evidente que não!), mas que ele tem o direito de não ficar na rua (e já o imagino estudando a tabuada, a colocação de pronomes átonos, essas coisas). Também tem a EPAVI, salientando que a Rudder não tem zeladoria e limpeza, ao passo que a STV tem TV e banda larga.
.j. e eu, ao ouvir, no final, o coronel Marcos falar em substitutos para as armas de fogo como "machados e pedras" e, embalado por minha sugestão de emprego de milhões de pessoas no serviço municipal (a mando da Guarda Municipal, que é como hoje vejo este encaminhamento), lembrei-me que achei em Machado de Assis (nada sobre pedras...) uma personagem que foi atendida pelo "inspetor de quarteirão". não sei bem o que era isto nos tempos machadianos (do império). Mas imagino tratar-se de um funcionário público (emprego mata a violência) que exerce funções comunitárias (entre elas a manutenção da ordem).

3. Síntese da Reunião
O coronel Brenner fez um resumo da reunião e encaminhou para aprovação a eleição do princípio de "afirmação estratégica do controle de armas". e como diretrizes a efetivação do estatudo do desarmamento, o compartilhamento de informações, campanhas esclarecedoras, integração dos órgãos policiais e cuidados com os serviços de segurança privada.

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este ambiente sugeriu-me encaminhar para discussão em nossa própria Conferência Livre os seguintes
:::: princípios:
.a. aceitação de que não há futuro para uma sociedade justa e pacífica sem a ocupação de sua população em idade economicamente ativa
.b. a solução do problema da segurança no Brasil não passa pela ação do mercado, mas da aliança estado-comunidade
.c. a participação do estado deverá dar-se pela afirmação dos programas por meio
.c.1.:: da inserção de verbas específicas na lei do orçamento público
.c.2.:: da ação afirmativa por meio das Guardas Municipais
.c.3.:: por meio da unificação das forças de segurança, dissolvendo as fronteiras entre os guardas armados das forças públicas estaduais e guardas municiapais.

e retirar-lhes como decorrências as seguintes

:::::: diretrizes:
.a. criar ou fortalecer as guardas municiapais em todos os municípios do Brasil
.b. criar mecanismos legais e financeiros para a implementação da Brigada Ambiental Municipal, supervisionada pela Guarda Municipal, com incumbência de resgatar os desempregados e detentores de empregos precários, criando emprego decente voltado a:
.b.1.:: ofertar três horas diárias de aulas de empreendedorismo (português, matemática, montagem de planos de negócios etc.)
.b.2.:: requerer três horas diárias de exercícios físicos e expressão corporal e artística
.c.3.:: requerer três horas de trabalho comunitário (cuidar de crianças, cuidar de velhos, limpeza urbana, capina, florestamento das margens das águas internas etc.).
.d. mudar a legislação penal voltada a dar tratamento de combate mais eficaz ao crime organizado (drogas, armas etc.), instituir a prisão perpétua para crimes hediondos e de morte, e ainda punir severamente o indivíduo que levantar armas brancas ou de fogo em direção aos policiais no cumprimento do dever.

para nossa própria conferência sugiro pensarmos nos seguintes encaminhamentos:
.a. local: Assembléia Legislativa, ou Câmara Municipal ou Salão Paroquial do bairro, escola, sala de reuniões de algum condomínio residencial, clube etc. (integração com a comunidade extra-mercado)
.b. expedir convites conforme o modelo da Conferência Livre sobre Desarmamento (que recebemos)
.c. distribuirmos aos participantes um documento que ainda redigiríamos, reunindo nossas "reflexões sobre a promoção da sociedade justa" (quero dizer, propaganda do programa de renda básica substituindo a bolsa família, o serviço municipal (aos cuidados da guarda municipal) como um incentivo material ($$$) adicional ao programa da renda básica universal
.d. fazermos uma mesa redonda, com convidados que fariam intervenções breves, encaminhamdo a discussão plenária
.e. planejarmos uma atividade (e.g., exposição por pessoa não integrada à mesa redonda), para dar início aos trabalhos na hora marcada, lidando positivamente com o eventual atraso de alguns participantes e brindando os participantes de nossa conferência com o início no horário previsto
.f. acho que um intervalo entre a mesa redonda e o debate é importantíssimo, para permitir interações entre diferentes conselheiros (ou seja, nós mesmos)
.g. controle sobre a redação e aprovação dos princípios e diretrizes a serem listados no relatório da atividade da Conferência.
DdAB
p.s.: "nossa conferência" foi realizada. o tema que mais me interessava era ver aprovada a moção em favor da renda básica universal provocou alguma discussão e terminou sendo derrotado numa votação. um neguinho argumentou (convincentemente) que o país precisa de mais 500 anos para amadurecer esta idéia e, se eu desejasse, poderia seguir na campanha até o ano de 2509, que ele -então- votaria comigo. eu sofri com a possibilidade de sobreviver a todos os meus entes queridos, pensei que poderia (sem saber) ser a personagem do livro de Simone de Beauvoir (intitulado "Todos os Homens são Mortais"), enfarar-me de tanta vida que desisti da idéia. ainda assim, levei como lição de tentar nunca mais colocar nenhuma das proposições que faço em votação. ou seja, na linha do conceito de ótimo de Pareto e a regra da unanimidade que dele derivamos, só aceito -a partir de 19 de maio pretérito- decisões consensuais. ou seja, quem não quiser ver minhas idéias levadas adiante poderá vetá-las liminarmente.

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