Querido Blog:
Disque o primeiro Ford Modelo T foi lançado no dia first de outubro de 1908, precisos quatro meses após o nascimento de meu daddy. Também disque (creio que li numa crônica de Sérgio Faraco, escrita em Zero Hora) o primeiro morto num acidente de automóvel foi um guri, em Detroid, que sobrevivera ao naufrágio do Titanic, aquele navio do Leonardo di Caprio e Kate Winslet o.s.l.t.. Não sei se o indigitado carro foi o T ou outro. A produção de guris continuou, pelo menos até os dias que correm, ao passo que a de Modelos T foi desativada, anos após.
Por outro lado, tenho lido neste exemplar jornal (tá sabendo onde quero chegar, né?) três temas da agenda -digamos- tributária nacional que me deixam de orelha em pé:
.a. criação de imposto especial sobre depósitos avultados nas cadernetas de poupança
.b. devolução do imposto de renda para a maviosa classe média brasileira (por exemplo, juízes de direito, ascensoristas dos elevadores do Edifício da Av. Rio Branco, no Rio de Janeiro, professores do IUPERJ, e por aí vai)
.c. redução do IPVA para 2010.
Como sabe meu eventual leitor, não sou radical, o que me permite dizer apenas que tudo isto é uma grosseria inominável que só poderia ser corrigida com pau, pau e pau! O Brasil precisa de leis, a primeira dela sendo a lei do orçamento. E de cadeias, para dar tratamento decente e humanitário a todos os seus (e também meus, por que não?) políticos. A receita pública não pode ser amealhada (com meias furadas, que o dinheiro sempre tem uma fração roubada, por escoamento) com base em impostos distorcivos ou contorcivos.
Ok, defino imposto contorcivo: é aquele que os asseclas dos governantes querem encaçapar na gente, pois sabem que seu poder depende:
.a. da arrecadação de impostos e multas que eles mesmos aplicam
.b. do montante de recursos que sua repartição controla.
Tive um aluno (ou não era meu aluno?) que queria estudar o modelo de insumo-produto para saber quais os "setores vulneráveis", ou seja, os setores que ainda estavam invulneráveis às investidas do fisco, ou seja, que o governo estava cobrando menos impostos do que poderia. Eu dizia para ele: mas não era o caso de o governo cobrar o mínimo possível aos produtores? Ele dizia: mas tchê professor, nós precisamos sobreviver, entende? Eu dizia: claro que não entendo. Ele dizia: tu tá te fingindo, que eu sei que tu entende! Eu dizia: tchê, eu quero só imposto direto, pois ele incide sobre os bloco B32 e B33, deixando em paz os bloco B11 e B21. Ele dizia: tu tá ficando louco, tchó (era da região Nordeste/Cacias). Eu calei-me.
Mas fiquei pensando que ele poderia beneficiar-se de um criterioso estudo da seguinte planilha. Cujo/dela/planilha modesto título é: Salvação da Humanidade. Trata-se de uma série de matrizes de contabilidade social e de insumo-produto. Nela, os blocos B11, B13, B21, B32 e B33 estão estilizados, na versão compacta e há outras MaCS com, também, o Bloco B13. Nas linhas, registramos vendas e nas colunas fazemos o registro das compras.
Por exemplo, na interseção entre a linha 4 e a coluna 6 do Bloco B11, temos as vendas do setor 4, digamos, ferro gusa, ao setor 6, digamos, automóveis. O Bloco B11, deste modo, retrata as relações intersetoriais. O Bloco B21 mostra as vendas dos (serviços dos fatores) aos produtores, o Bloco B31 mostra as "vendas" das instituições (no caso, importações às firmas estrangeiras e impostos ao governo) aos produtores. Os Blocos B12 e B22 são deixados em branco. O Bloco B13 mostra as vendas dos produtores às instituições, o Bloco B23 é deixado em branco e o Bloco B33 mostra as relações interinstituconais, ou seja, por exemplo, o imposto de renda que minha avó paga ao governo. Por seu turno, o alambique de meu tio, que paga ICMS pela cachaça que manipula, vê esta transação registrada no Bloco B31.
E imposto distorcivo? Vejamos o Senhor Aurelião Eletrônico Ferreira: distorcer é mudar o sentido, a intenção, a substância de; desvirtuar; torcer. E ainda mudar a direção, ou a posição normal. Em outras palavras, para falarmos em imposto distorcivo, precisamos entender o que seria um imposto não-distorcivo. Ou -pior ainda- o que seria um blim-blim-blim que não distorcesse nada no sistema econômico.
Num sentido menos dicionaresco, podemos definir -com proveito- que os impostos distorcivos distorcem apenas a alocação dos fatores e, como tal, a produção. Não parece haver maior proveito em pensarmos que o imposto distorcivo distorce inclusive a duração das fases da lua ou os teoremas de geometria plana. Neste caso, deixemos de considerar que os pagamentos das instituições (e.g., famílias) ao governo (Bloco B33) distorcem o que quer que seja. Também não parece especialmente útil pensarmos que variáveis que não constam da MaCS distorcem coisas de dentro da MaCS. Tal é -ou não é?- o caso da oferta monetária, do estoque de capital, do aparato institucional, sei lá que mais. (Nâo precisamos esquecer que o estoque de capital origina-se da acumulação dos investimentos registrados no Bloco B13, mas não tem pobrema com isto. Nem com o fato de que a oferta monetária liga-se com a renda por meio da equação quantitativa MV = PY.
Explorando os sentidos vulgares do substantivo "distorcer" (ou este troço era um verbo?), podemos dizer que tudo o que está dentro da MaCS é endógeno. Como tal, consideremos o caso de um automóvel que gastava, em sua produção, 1kg de ferro gusa e passa a gastar meio quilo. É óbvio que todas as demais variáveis do sistema serão afetadas na transição entre duas posições de equilíbrio do sistema. [Um menino de avenida (da Av. Ipiranga, ponte) não entende o que é equilíbrio ex ante, o que o impede de perceber que estou falando de duas posições ex post, ainda que possa usar o modelo de Leontief para esboçar a transição entre uma e outra, numa modelagem ex ante.]
A economia deste meio quilo de ferro deve ser saudada com júbilo, pois evidentemente representa um ganho de produtividade do sistema. Se nada mais mudar, ela vai representar uma queda no valor de todas as mercadorias geradas no sistema, ou ainda, uma queda no valor gerado! Tu entendeu? Uma queda no valor adicionado! Como sabemos, valores e preços convivem numa relação estável entre tapas e beijos. O mesmo ocorre com preços e produtividade. Mas podemos registrar o funcionamento de uma lei geral do funcionamento das economias monetárias: os valores se transformam em preços. E os preços caem quando a produtividade se eleva. Id est, a produtividade é inimiga do valor, um troço mais ou menos assim.
É craro que esta estilização que acabo de fazer, no sentido de economizarmos ferro para matar meninos por meio de atropelamentos automobilísticos, resultou numa queda no valor adicionado. Mas não esqueçamos que a geração do valor adicionado poderia levar a que um dos fatores associados à distribuição funcional (trabalho ou capital) capturasse a diferença de valor de meio quilo de ferro e a embolsasse (amealhasse?). Ou seja, a queda na coluna do automóvel na MaCS (o meio quilo de ferro) seria compensada por uma elevação na própria coluna, com o valor monetário de meio quilo de ferro cabendo -adicionalmente- ao valor monetário auferido por trabalhadores, capitalistas (que estamos no Bloco B21) ou governo (impostos indiretos, que estamos no Bloco B31).
Concluo, olimpicamente, acompanhando Stanislaw Ponte Preta, quando este escreveu a crônica intitulada "Vamos acabar com esta folga", em que recomendava aos brasileiros mais compostura. Eu penso que ele queria dizer mesmo era que os governantes deveriam parar de afanar os $$ públicos, ligar-se ao orçamento universal, parar de cobrar impostos distorcivos (isto é, sobre os produtores) e cobrar impostos apenas das instituições famílias, ou seja, imposto de renda, do patrimônio e da herança. Como não sou fumante, acho que ele também poderia cobrar impostos indiretos (bloco B31) dos produtores de bens de demérito, why not?
Concluo realisticamente, apenas a ladroagem oficial é que gasta o tempo que o "contribuinte" paga, realizando lucubrações sobre como elevar a receita pública sem mexer no imposto de renda. Ou, ainda mais desavergonhadamente, mexem no imposto de renda de um jeito hipócrita: atrasando as devoluções do imposto indevidamente retido na fonte. Se fôssemos panglossianos, diríamos que isto é uma alíquota adicional. Se formos do clube do Monteiro Lobato e da Carolina de Michaelis, diríamos que precisamos baixar pau, pau e pau nessa corja, exigindo uma política tributária decente, que esqueçam a caderneta de poupança e que aumentem o IPVA e não o reduzam, para evitar o atropelamento de meninos nas ruas de Chicago (ou era Detroid?).
DdAB
Um comentário:
Apesar de o artigo ter sido esclarecedor, solicito ao autor maior objetividade nos próximos artigos, pois poderia ter sido escrito com menos da metade do usado no texto.
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