27 abril, 2011

Salário não é renda...

querido diário:
claro que salário é renda. claro que depende do conceito de renda. claro que "renda da terra" como sinônimo de"renda" está parcialmente certo, pois renda da terra (ou seja, aluguel e aliás até aluguel de máquinas e carros etc.) também é renda. e quem mais é renda, além da renda da terra? pela conceituação do manual de contabilidade social da ONU, temos:

.a. salários (remuneração paga pelos produtores aos serviços prestados pelo fator trabalhador pelos trabalhadores selecionados pelas famílias para dirigirem-se ao mercado de trabalho; naturalmente, os que não se dirigiram, ficaram no bar bebendo não ganham renda, nem -mais tragicamente- os que se dirigiram mas não garraram emprego)

.b. lucros (remuneração que os produtores recolhem, depois de terem pago seus compromissos com os trabalhadores e com o governo. nesta condição, eles são os chamados de "residual claimants")

.c. impostos indiretos líquidos de subsídios (remuneração do governo, um imposto desagradável que incide sobre os produtores -qua produtores- e gera distorções dentro do mais profundo âmago aprofundado do sistema produtivo).

falei "remuneração" dos trabalhadores, dos capitalistas e do governo? claro que falei, pois usei o termo no sentido de "pagamento por parte dos produtores". no chamado (por mim e outros iluminados) modelo completo do fluxo circular da renda:

.a. os produtores percebem que haverá demanda para algum/ns que eles estão dispostos e aptos a produzir

.b. ato contínuo, deslocam-se ao mercado de fatores de produção, contratando os serviços dos fatores (trabalho e capital) que são propriedade das famílias. e já sabem que terão que molhar a mão do governo, que -caso contrário- não os declararia produtores legais.

.c. os pagamentos pelos usos dos fatores contratados pelos produtores são, naturalmente, creditados a estes, que os transferem às famílias que detêm sua propriedade. posse e uso: posse pelas famílias e uso pelos produtores.

.d. as famílias pegam este dinheirinho que receberam dos produtores (salários e lucros), associam-nos a outras receitas (e.g., ganho da loto, ganho da pensão do filho milionário) e despesas (e.g., pagamento da pensão para o pai perdulário e impostos diretos) e gastam tudo em bens e serviços e o que sobra chamam de poupança.

.e. e o dinheirinho que os produtores pagaram ao governo são também transferidos à instituição governo que o gastará como lhe aprouver (e, enquanto a lei do orçamento não for mais sagrada do que a lei da cachaça, não haverá usos decentes, com muita corrupção e gastos beneficnando mais que proporcionalmente os mais bem aquinhoados from scratch).

ou seja, diferentemente do título (um tanto enganador) desta postagem, salário é renda, como o é o lucro e o imposto indireto. ok, falemos dos impostos. de acordo com Teeteto, quando pensamos nos impostos, devemos dividi-los em diretos e indiretos, abarcando todos os impostos concebíveis. não foi ele?

agora: os impostos indiretos, como sugeri acima, baseado em um modelo, ou seja, não me baseei na realidade (o modelo de preços de Leontief), são absolutamente distorcivos sob o ponto de vista da alocação dos recursos produtivos da sociedade. no mesmo instante em que pensei nestes "agora", também pensei que os impostos diretos não incidem sobre os produtores, nem os pagos pelas empresas, pois estes são pagos ao governo não no processo de "geração" do valor adicionado, mas no de sua "apropriação". ou seja, são pagamentos que os residual claimants fizeram aos proprietários de suas habilidades empresariais e estas sim é que recolherão partes deles aos governantes (veja só que penso sempre em governantes e não em governo, pois os primeiros aparelharam-se no segundo, em busca de vantagens pessoais e familiares, o afamado patrimonialismo).

ou seja, nunca haverá imposto de renda incidindo sobre o produto, mas apenas sobre a renda, em suas diferentes formas: salário, lucro e impostos indiretos.

pois bem. a Zero Hora de hoje fala, aqui e ali, em temas que me levaram a refletir as -por isto mesmo- reflexões acima. dificuldades de caixa na previdência estadual, agonia do partido DEM, que a CartaCapital praticamente sempre chamava -carinhosamente?- de ex-PFL e a maldição que pesa sobre o imposto de renda no Brasil.

já faz milhares de anos que sugiro que uma solução para o odioso problema dos altos salários...

(salários? eu disse salários, estou misturando a negadinha que ganha R$ 30mil mensais com a que arrebanha R$ 545?, mais ainda, eu disse "salários", quando também estamos falando no "talo" dado às burras estaduais pelos funcionários de R$ 30.000 e mais e até menos, todos, pelo pagamento de aposentadorias e pensões? claro que não, estes são transferências, não fazem parte do valor adicionado!, ainda que façam parte -evidente- da receita do neguinho e de sua família).

... pagos pela administração estadual poderiam ser resolvidos com a retenção como imposto de renda que obedecesse a alíquotas decentes. todos são iguais perante a lei, logo os receptadores de salários e de lucros devem obedecer à mesma alíquota. agora, fazer neguinho cuja renda familiar é de, digamos, R$ 4 mil chegar rapidinho à mesma alíquota do desembraguilhador dos R$ 45mil é tão aviltante quanto outros rapazes meterem a mão na merenda da petizada de Sapiranga. quem ganha menos de R$ 5.000 deveria ser isento. quem ganha mais deveria obedecer a uma decente tabela de alíquotas progressivas, até, digamos, 99,999999999999999999999999999%. isto significa que os apaniguados sempre seguirão ganhando mais que seus inferiores hierárquicos. ou seja, quem abocanha mais engole mais!

então deslocamo-nos, à la Teeteto, para as razões que impedem o próprio governo estadual e sua influência na montagem das leis federais (digamos, as afinidades ideológicas entre as necessidades do tesoureiro do governo e as bandeiras democráticas defendidas pelo deputado federal seu amigo dileto) de terem sucesso. por que ninguém jamais pensa seriamente em reforma tributária no Brasil? hoje o mesmo jornal diz que a "base governista" federal é de 90%, dada a débacle do ex-PFL e do próprio PSDB, esconjurado pela conjura de três lideranças: Aécio Neves, sobrinho de Tancredo, José Serra, economista, e Geraldo Alkmim, parente afastado do ramo amineirado da família). se a base governista tem 90% dos votos, ela não faz a reforma adequada porque não quer, ou melhor, o que ela considera ser uma reforma adequada não é mais que uma reforma inadequada, ou seja, nada. ou seja, manutenção do status quo tributário, com aquelas vergonhosas transferências de impostos indiretos precisamente para as camadas mais carentes da população. isto porque (lá volto com a equação de preços de Leontief) estes impostos são integralmente repassados aos consumidores. logo, quanto mais pobre for o consumidor, maior será o peso dos impostos sobre suas despesas. isto é regressivo, isto é distorcivo, isto é odioso. isto é oficial no Brasil e não serão os míseros 90% de maioria parlamentar que modificarão.

tento agora dar meu pitaco sobre a grande crise que se tornou patente na "oposição" brasileira, nomeadamente, o PSDB e o ex-PFL. a manifestação visível foi a criação do PSD, ou relançamento do partido cuja sigla foi cassada pelo primeiro governo militar. o segredo está no SD de ambos. no primeiro, SD quer dizer social-democracia, que -por lapso datilográfico- chamei de sócio-demografia... eo segundo SD é "social democrata", ou seja, a mesma coisa. por que o PSD não enturmou -termo na moda no RS, por causa da reabertura de escolas de acampamentos, assentamentos de famílias despidas de propriedade, mas que querem o direito de ficar, de ter onde morar- no PSDB? e por que FL -frente liberal- não colou no Brasil? por que a social-democracia do PT, tão social quanto podemos ver pelas grandes reformas propostas (conjunto vazio), tornou-se vencedora?

é muito assunto. mas quero falar mais sobre a alternativa a ela, a social-democracia petista. tenho a impressão que o PT considera que seu dever foi cumprido ao institucionalizar, de maneira irreversível (é?), a "bolsa família", filhota bastarda da "renda básica", mas que é o que a sociedade vestida de enorme véu de ignorância (não estou-me referindo a John Rawls) rejeita. não pode dar dinheiro para pobre! nem educação. nem nada que habilite o pobre a abdicar de sua condição econômica e tornar-se um remediado.

pois bem, o PT ficou no rema-rema. e a oposição? esta, então, ficou ainda pior, ficou na marré de ré, ou de si... esta não responde pelo título de social-democracia. esta tem-se tornado cada vez mais "frente liberal". esta tem defendido a "meritocracia" mais que a "igualdade". como seria medíocre falar em "meritocracia", muito se fala em "mobilidade". mas a mobilidade é algo que não ocorre na sociedade desigual. no Brasil, filho de pobre apenas entra na universidade portador de enormes lacunas na formação básica.

a oposição, que brandia uma palavra de ordem social-democrata adequada aos primeiros embates da vida pós-ditatura militar, perdeu a primazia para o PT. e não conseguiu radicalizar no igualitarismo, ir mais à frente do que o próprio PT, ou seja, por exemplo, lutar pela lei do orçamento que defenda um gasto público regressivo e uma tributação progressiva. se fizesse isto, estou certo de que até eu iria eleger-me deputado (e defender meus R$ 30mil...). mas por que não o fará? por que o PT tampouco o fará? parece que, por hoje esgotei minha cota de perguntas. mesmo porque parece que o assunto se encaminha para a discussão das marcas de chiclé balão, de estrangeirismos, como o de mascar chiclé, e não sobre como deletar uma classe política absolutamente representativa de seus próprios interesses e de suas dignas (?) famílias. (como tornar digna uma família herdeira de patrimônio roubado ao poder público? resposta: imposto sobre heranças, que também é imposto direto! queres mais perguntas? tê-las-ás em breve...)
DdAB
a foto veio de um site pouco afinado com meus ideais sócio-político-demográficos-etc.: aqui.

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