17 abril, 2011

Drogas: literárias e as demais

querido blog:
querido? claro! tem muita gente querida na parada. desde sempre. e também tem aqueles que entram em minha vida como um rastilho de pólvora, culminando com uma explosão de desencanto. tal foi o caso hoje, ao ler Zero Hora. todos sabemos que este jornal, edição dominical, é distribuído no sábado. mas eu, invariavelmente, deixo para lê-lo no domingo. em outras palavras, escolhi o nanico dos gaúchos para acompanhar minha vida, o que devo saber sobre o mundo. e se, hoje, pouco ou nada sei sobre a Líbia, sobre o Usbequistão, sobre sei lá, é que eles nada disseram...

seja como for, no domingo tem uma página de artigos assinados, em que se confrontam, pelo menos, dois empederinidos reacionários: Sérgio da Costa Franco e Percival Pugina. e penso que quinzenalmente, tem o progressista Marcos Rolim, de quem falei por aqui há alguns dias. pois hoje rolou o sr. Sílvio Holderbaum, com o artigo "Em Boca Fechada Não Entra Mosca", um título, digamos, maravilhoso, sob o ponto de vista da originalidade. mas o que poderia fazê-lo um pouco mais palatável para um negão de meu porte é que ele faz uma contundente censura ao direito à palavra do governador do estado do Rio Grande do Sul, o sr. Tarso Genro. eu mesmo postei sobre o assunto aqui. e achei legal um governador dizer o que todo mundo sabe.

a questão central sobre o uso de drogas é se aceitamos ou não o conceito de consumo recreativo. quem não aceita, ou nunca ouviu falar nele, é movido pela ignorância ou pelo puritanismo. eu sou, óbvio anti-drogas, o que não me impede de envolver-me em consumo recreativo de, por exemplo, café, champanhe e ouvir rock em volume atordoante. dizem que é uma droga... claro que Holderbaum não se caracteriza pela sutileza embutida no título do artigo nem na importantíssima informação
"Também afirma nosso governador que 'a Cannabis sativa (nome científico da maconha) é diferente da heroína. Muitos especialistas dizem ffazer menos mal do que o cigarro. Dizem. Eu nunca vi uma pessoa matar por ter fumado um cigarro de maconha.'."

neste caso, eu estava sendo apenas vulgar ao falar, no outro dia, em THC, o tetra-hidro-canabinol? e ele, quem é este "publicitário" para meter bronca com tanta desenvoltura contra os mais esclarecidos? ele diz uma de arrepiar:

"Com relação a esta afirmação, eu gostaria que o nosso governador participasse apenas uma vez de um grupo de apoio ou tivesses tempo de ouvir um pai ou uma mãe que tem seu filho dependente dessa droga."

sem falar muito mais a respeito deste tipo de visão de mundo, faço o mesmo tipo de chamamento retórico: eu gostaria de saber quanto os pais da guriazinha de 13 anos que, no outro dia, matou a anciã de 93 anos pagariam aos traficantes para deixarem sua filha em paz. ou quanto eu mesmo ou ele pagaríamos, a bolsa de longevidade que toparíamos dar à pobre velhinha, que talvez nem saiba o que é THC, nem crack nem nada.

quero dizer a visão legalista defendida por Holderbaum é melancólica: ele não se dá conta daquela metáfora que tenho divulgado: a lei da gravidade é menos incisiva do que a lei da oferta e procura. ele, Holderbaum, não saberá do que está falando. está solidarizado com o lado certo, claro. passou um pito em um governador de estado! mas o resto de sua prédica ajuda precisamente a "adoção de crianças por traficantes", cito entre aspas, pois havia uma propaganda: "cuide de seu filho antes que um traficante o adote."

claro que consumo recreativo de café e maconha deveria ser proibido a jovens. mas por que será que um rapaz do porte deste publicitário deveria decidir o que um coroa de meu porte deve consumir? ele assusta-se ao pensar que "[...] teremos de ter no futuro mais tolerância também com heroína, LSD, cocaína, êxtase, crack e tantas outras drogas que temos no mundo."

claro que alguém lá da Zero Hora terá lido e aprovado este tipo de pito nos governantes. por isto é que a chamo, volta e meia de Zero Herra, e lamento que os jornais sul-riograndenses sejam todos nanicos.
DdAB
p.s.: este cartaz tirei-o daqui, mas parece que tem xabu na parada.

2 comentários:

Bust Noris disse...

Também li e fiquei impressionado com a quantidade de preconceitos sem qualquer embasamento científico presentes no texto.
Primeiro ele coloca todos que vivem na "clandestinidade" no mesmo saco. Incluem-se ali os traficantes, ladrões e assassinos, e desta forma coloca também os Maconheiros no mesmo nível, pois também usufruem de sua droga na clandestinidade.
Depois ele afirma que se fumar um baseado a pessoa talvez não cometa crime, mas depois do terceiro, quarto já pode estar roubando e partindo para outras drogas. Este comentário também é de um total desconhecimento científico. Se sabe que a Maconha não tem efeito cumulativo, diferente de álcool, cocaína, heroína. Nunca na história do Planeta foi registrado 1 só caso de overdose de Maconha. Quando se chega a um certo estágio de "chapadeira", não importa quando outros baseados se fume, não vai passar daquele estágio, no máximo a pessoa vai ficar com sono ou larica. Quanto a partir para outras drogas por que ela já "não tem mais o efeito desejado por causa do estado de dependência", como ele afirma no texto, também é de uma hipocrisia total. Novamente, Maconha não tem efeito cumulativo, o efeito vai ser o mesmo em uma pessoa que fuma a 20 anos. O que pode levar a experimentação de outras drogas é a curiosidade, e como alguns pesquisadores apontam, o fato da ilegalidade, pois na falta de uma droga o traficante vai tentar vender outra no lugar e incentivar o usuário a partir para uma droga mais pesada, o que seria dificultado com a legalização, pois traficantes não teriam tanto acesso aos usuários. Também é meio estranho que usar maconha possa levar a pessoa a usar cocaína, pois são drogas completamente diferentes. Uma tem efeito relaxante e outra estimulante, conheço vários usuários de maconha que experimentaram mas nunca partiram para o uso de cocaína, justamente por não gostar de seu efeito.
Por último ele coloca a maconha no mesmo saco que todas as outras drogas, cocaína, heroína, LSD… Se vamos colocar tudo no mesmo saco, devemos incluir também o álcool, tabaco, cafeína, etc… conforme você mesmo comenta no texto, que também são drogas, causam dependência e fazem mal a saúde. Devemos para achar que todas as drogas são iguais e tratar cada uma com suas individualidades e educar a população neste sentido.
O Debate sobre legalização da maconha deve ser aberto com urgência. O usuário não é um criminoso e também não quer contribuir com o tráfico de drogas, se tivesse alternativa eu tenho certeza que a maioria não se importaria de pagar imposto para ter algo de acordo com as leis. E também temos que deixar de tapar o sol com a peneira achando que um maior combate vai acabar com o tráfico, os maus elementos estão infiltrados em nossa polícia, justiça e política. A verdade por trás da proibição é que tem MUITA gente ganhando dinheiro com isso, e não são só os traficantes.

... DdAB - Duilio de Avila Berni, ... disse...

gente!
que ocmentário interessante e bem informado. muito agradecido. acho que existe um divisor de águas nesta questão que o pessoal que estuda a felicidade (os economistas e filósofos utilitaristas) fala em "consumo recreativo". isto é importante. todos (exceto, óbvio, as crianças, criminosos e loucos) têm direito de exercer suas escolhas. o moralismo acachapante é mais pernicioso para a sociedade do que o consumo chapante...
DdAB