27 julho, 2009

Mundo dos idosos

Querido Diário:
Tu sabe o que é hiperbibasmo? Não vou dizer... E tu sabe o que é colisão? Pois colisão é o título desta postagem, ou melhor, o título desta postagem é uma colisão, que é, aurelianamente:
6. E. Ling. Aliteração que produz som desagradável.[Ex.: Nunca que ela quisesse semelhante absurdo; O Sr. Soares sentiu sumamente a sua falta.]. Como sabemos, meu récord é algo um tando Dadá, na linha de "da virada dada da vida da dadaísta", um troço destes. E mais, aparentemente, o palhaço da foto diverte-se mais do que o velhinho que lhe ocupa o lado.

Mas que terá a ver a abóbada com o infinito? É que na p.16 de Zero Hora de ontem, encontramos o artigo de Sérgio da Costa Franco intitulado -ele, o artigo, e não ele, o articulista- de "O mundo dos idosos". Reflete o historiador sobre o ano 2040, acreditando que lá não mais existirão os octogenários de hoje, mas dando alguma colher para gente de meu porte, ou seja, os sexagenários. No outro dia, levei um susto ao ouvir minha mulher dizer "Quando fiz 50 anos...".

Mas diz mais ele, o articulista, se não lhe distorço os sentidos, ainda que lhe edite o texto, que:

Homens e mulheres estão vivendo muito mais, e, concomitantemente, procriando muito menos do que no passado. E as consequências disso aí estão, gritantes: segundo os cálculos dos demógrafos, em breve as crianças serão menos numerosas do que os idosos. [...]
Esse mundo dos idosos será provavelmente mais pacífico e ajuizado que o atual. Há de se praticar menos violência, haverá menos paixões, menos desatinos e menos consumo de produtos duráveis. Mas, em contrapartida, se não houver uma reação positiva da taxa de natalidade, o percentual dos grupos etários em atividade produtiva vai decrescer, cairá o grupo de contribuintes da Previdência, ao mesmo passo em que aumentará, além de todas as previsões, o efetivo dos aposentados e pensionistas. Nos orçamentos públicos, embora venham a pesar menos as verbas das escolas e da saúde infantil, é provável que se acresçam os gastos com hospitais, medicamentos e seguridade social. Velhinhos são mais dispendiosos que as crianças. Disso decorrerão consequências negativas para o produto interno dos países. Enquanto não se descobrir alguma fórmula milagrosa, a regra é “quanto maior o percentual de idosos, menor o PIB”.
Serão graves os problemas dessa sociedade de velhos. Como compensar o desequilíbrio das receitas e despesas da Previdência Social? [...]
Já estamos vivendo a glória de viver mais tempo e com melhores condições de saúde do que ocorria no passado. Mas se essa sobrevivência acrescida se tornar um fenômeno de massa, desequilibrando todas as previsões da seguridade social, creio que muitas concepções deverão ser revistas e algumas mudanças radicais precisarão acontecer, para que a sociedade não mergulhe em completa estagnação.

E por que gasto eu meu latim lendo-o diligentemente e postando-o por cá? Primeiramente, a imagem que lhe guardo é de empedernido reacionário. E daí? Acredita ele que este maravilhoso mundo futuro, sem violência, mais ajuizado, "não possa seduzir ninguém". Pois andei jurando que a mim me seduz e pretendo mudar o mundo atual (ver "Governo Paralelo" no site), precisamente para chegar a este ponto da paz.

O que há de bom em ser intelectual, como Sérgio da Costa Franco? É que ele também tem sacadas interessantes, como a de que "haverá menos consumo de produtos duráveis". Mas aí começa precisamente sua incapacidade de ver o mundo da paz. A visão fisiocrática esposada mesmo por economistas contemporâneos é que agricultura + indústria é que geram bem-estar. O que chamei de efeito Excel ilustra como, em breve, estes dois setores representarão 0% do PIB, ainda que sigamos comendo alface e acoplando produtos da transformação de minerais não metálicos a nossos dentes. Mas o que gerará valor (not to speak do presidente do banco central) será o trabalho do cozinheiro que preparará a salada de verduras e do dentista que nos consertará o dente (que deixará de ser roído pelo streptococcus mutans).

Vejamos, inicialmente, com mais vagar duas Leis de Franco:
.a. Velhinhos são mais dispendiosos que as crianças. Claro que esta lei só é válida sob a cláusula do "ceteris paribus". Dadas certas condições, velhinhos são, por que negar?, mais baratos que crianças. De que crianças estamos falando, de que velhinhos estamos falando? Conheço um velhinho que não gasta nem P$ 1,oo (um pila por unidade de tempo), pois vive na Rua da Amargura desta cidade prefeitada por Mr. Fogaça.

.b. o PIB é afetado negativamente por velhinhos. Claro que não! Mas apenas por velhinhos enfiados na política, como Sarney, na fábrica, como hectagenários, no hospital, como auxiliar de portaria, e por aí vai, comprometem a produtividade do sistema. Mas a solução não é matá-los, apenas retirá-los (let them retire, no original...).

Em outras palavras, quanto mais velhinhos houver na sociedade e quanto maior for a produtividade agregada dos trabalhadores. E esta não depende, obviamente, do número de trabalhadores. Ao contrário, quanto menos trabalhadores por unidade de produtor, melhor! Disse que me disse o menino de rua: "Pobre gosta de lazer, rico é que gosta de trabalho". Eu pensei: "Rico? rico não é burro e passa todo o tempo praticando esporte e produzindo ou consumindo obras de arte. Lá isto é trabalho ou também é lazer?"

Depois, que quer dizer mesmo "empedernido reacionário"? Não estou dizendo que ele é empedernido coração, algo assim. Reacionário é o neguinho que -lê-se na Enciclopédia GangeS- reage às forças do progresso, aferrando-se aos costumes em vigor, considerando-os ditados por uma autoridade superior, que deve ser obedecida impensadamente. Acho que um empedernido reacionário é quem pensa que é impossível elevar a produção sem elevar o emprego, quem pensa que é impossível articular uma sociedade que deseja e merece maiores níveis de bem-estar sem trabalho escravo, quem pensa que, no prazo secular -em que mesmo a tecnologia é variável.

As contradições do próprio discurso humano é que são interessantes, pois no último parágrafo, Sérgio da Costa Franco diz: "[...] creio que muitas concepções deverão ser revistas e algumas mudanças radicais precisarão acontecer, para que a sociedade não mergulhe em completa estagnação." Sempre defendi mudanças radicais. Somos colegas! Serei, então, um empedernido reacionário? Não me aferro aos costumes em vigor, ao contrário, desejo destruir muitos deles, como o trabalho escravo, a infibulação, a tortura, a discriminação ao gênero e à etnia, essas coisas. Sobre o futuro da humanidade, hierarquizando de modo crescente, desejo a seguinte mudança radical:
.a. renda básica universal
.b. proventos da aposentadoria
.c. salário mínimo industrial
.d. rendimentos do mercado de trabalho.
Claro que a + b + c + d deveria exaurir o valor adicionado calculado pela ótica da renda. E claro que isto nada (nadicas de nada?) tem a ver com geração setorial do produto ou a absorção da produção (i.e. despesa).
Tudo isto porque acredito -associando-me aos "maximalistas" citados por Martin Bronfenbrenner- que dizem que, na sociedade do futuro, não precisaremos trabalhar mais de dois anos durante todo nosso curso de vida. Isto é inconcebível? Apenas para empedernidos reacionários, no sentido GangeS do termo.
DdAB

Nenhum comentário: