Escrevi esta encrenca que segue há dez anos. Vejamos o que reeditarei e o que ficará intocado. Mas há frio em minha barriga: será que publiquei isto em outro de meus blogs?
Houve um "impacto financeiro" de medidas anunciadas pelo Poder Legislativo da ordem de R$ 30 bilhões, dado o chamado “efeito cascata”. Ganha o juiz, ganha o deputado federal, ganha o estadual, o vereador municipal, seus assessores, e por aí vai. Os tribunais brasileiros dizem que não se pode reduzir vencimentos de funcionários públicos, pois qualquer conquista salarial é “direito adquirido”. A isto, ouvi Bresser Pereira, certa vez, dizer na televisão: “Privilégio não é direito adquirido.”
Ora, R$ 30 bilhões (a preços de 2005) financiam praticamente todos os 10 milhões de emprego oferecidos pelo Presidente Lula, ainda em seu programa de governo. Estes bilhões poderão ser destinados aos contra-cheques de governadores, deputados, delegados, vereadores, vice-delegados, secretários de assessores de vereadores, juízes, desembargadores, secretários de adjuntos de desembargadores, ascensoristas dos poderes legislativo e judiciário e tutti quanti. 30 bilhões constituem mais da metade do superávit primário conquistado a tão alto custo pelo Sr. Palocci e pela disciplina fiscal de milhares de prefeitos, os governadores e os ministros, para cessar de listar os gastadores que tiveram seus ímpetos refreados pela "sanha arrecadatória", como dizem alguns.
Pensemos agora no “custo de oportunidade” desse montante. Com o salário mínimo do ano passado e seu PIB, este gasto representaria menos de 40% do superávit fiscal que foi alcançado. Com menos do que todo o valor do superávit fiscal, pagar-se-ia mensalmente o salário mínimo esses 20 milhões de atuais detentores de “empregos precários”. Sufocaríamos a bolsa-escola, a bolsa-família, abono do gás, abono do transporte urbano dos velhos, o Fome Zero e as frentes de trabalho nordestinas. Contracheques do Tesouro Nacional começariam a ser emitidos diretamente para os indivíduos, que não poderiam disfarçar sua posição, ganhando duplamente etc. Ou seja, a corrupção nestas formas assistencialistas seria banida. Claro que, em meu exemplo, um emprego neste “Serviço Municipal”, estes trabalhadores ingressariam em suas funções despidos de qualquer bem de capital. Mas podemos pensar em apenas 5 milhões empregos, caso em que cada integrante do "Serviço Municipal" terá R$ 780 por mês para comprar insumos, contratar parentes, essas coisas relevantes da vida moderna.
Supondo que ambos os gastos sejam absolutamente impostergáveis para toda a eternidade, ainda assim, poderíamos pensar em financiar meus 20 milhões de empregos com uma elevação da alíquota do imposto de renda. Por exemplo, nada mais do que elevar o atual imposto cobrado aos 10% mais ricos do país em menos de 10%. Mas sabemos que existe um feitiço contra o uso da expressão "imposto de renda" no Brasil. A elite econômica (incluindo mesmo alguns de nós, professores ou jornalistas), ou seja os 10% mais ricos, seriam os perdedores muito claramente estabelecidos, o que evita que o assunto deixe de ser tratado de modo sobrenatural.
O que estranho é que haveria dois grupos de ganhadores muito evidentes com esta medida, com poder de fogo para exigir a reforma fiscal. Em primeiro lugar, trata-se dos governadores dos estados. Caso o imposto de renda fosse elevado radicalmente, com alíquotas bem pesadas para quem ganha mais de, digamos, 50 salários mínimos, os cofres dos governos estaduais seriam recompensados pelos pagamentos dos altos salários, pois o imposto de renda recolhido pelo Tesouro Estaduais nos estados fica.
O segundo grupo é constituído pelos empresários. Estes vivem queixando-se (cobertos de razão) de que seus clientes gozam de baixíssimo poder aquisitivo, pois os preços que vendedores cobram estão infectados por elevadíssima carga tributária. Obviamente, eles estão falando dos impostos que infectam preços das mercadorias que vendem, ou seja, dos impostos indiretos. O cliente paga, o empresário vende menos, mas deve recolher o imposto, ou seja, é chefe de uma exatoriazinha estadual.
Na medida em que os impostos indiretos são altamente regressivos, os empresários poderiam fazer uma cruzada em favor de sua substituição pelos impostos diretos, ou seja, deveriam clamar por uma reforma tributária mais assemelhada à dos países capitalistas avançados. Não é temerário afirmar que esta mudança alavancaria suas vendas ao ponto de lhes gerarem lucros capazes de fazê-los parar de se incomodar com o imposto de renda.
Mas o feitiço é mais forte do que argumentação racional. Parece que o único jeito de termos uma sociedade igualitária no Brasil é todos virarmos assaltantes.
DdAB
Imagem daqui. O cartão vermelho é, naturalmente, para o índice de Gini do Brasil. Mas aproveito e o traslado para os dados que vi divulgados ontem pela ONU e Oxfam: os 1% mais ricos do mundo têm um patrimônio que vai igualar em breve o valor dos 99% mais pobres.
Houve um "impacto financeiro" de medidas anunciadas pelo Poder Legislativo da ordem de R$ 30 bilhões, dado o chamado “efeito cascata”. Ganha o juiz, ganha o deputado federal, ganha o estadual, o vereador municipal, seus assessores, e por aí vai. Os tribunais brasileiros dizem que não se pode reduzir vencimentos de funcionários públicos, pois qualquer conquista salarial é “direito adquirido”. A isto, ouvi Bresser Pereira, certa vez, dizer na televisão: “Privilégio não é direito adquirido.”
Ora, R$ 30 bilhões (a preços de 2005) financiam praticamente todos os 10 milhões de emprego oferecidos pelo Presidente Lula, ainda em seu programa de governo. Estes bilhões poderão ser destinados aos contra-cheques de governadores, deputados, delegados, vereadores, vice-delegados, secretários de assessores de vereadores, juízes, desembargadores, secretários de adjuntos de desembargadores, ascensoristas dos poderes legislativo e judiciário e tutti quanti. 30 bilhões constituem mais da metade do superávit primário conquistado a tão alto custo pelo Sr. Palocci e pela disciplina fiscal de milhares de prefeitos, os governadores e os ministros, para cessar de listar os gastadores que tiveram seus ímpetos refreados pela "sanha arrecadatória", como dizem alguns.
Pensemos agora no “custo de oportunidade” desse montante. Com o salário mínimo do ano passado e seu PIB, este gasto representaria menos de 40% do superávit fiscal que foi alcançado. Com menos do que todo o valor do superávit fiscal, pagar-se-ia mensalmente o salário mínimo esses 20 milhões de atuais detentores de “empregos precários”. Sufocaríamos a bolsa-escola, a bolsa-família, abono do gás, abono do transporte urbano dos velhos, o Fome Zero e as frentes de trabalho nordestinas. Contracheques do Tesouro Nacional começariam a ser emitidos diretamente para os indivíduos, que não poderiam disfarçar sua posição, ganhando duplamente etc. Ou seja, a corrupção nestas formas assistencialistas seria banida. Claro que, em meu exemplo, um emprego neste “Serviço Municipal”, estes trabalhadores ingressariam em suas funções despidos de qualquer bem de capital. Mas podemos pensar em apenas 5 milhões empregos, caso em que cada integrante do "Serviço Municipal" terá R$ 780 por mês para comprar insumos, contratar parentes, essas coisas relevantes da vida moderna.
Supondo que ambos os gastos sejam absolutamente impostergáveis para toda a eternidade, ainda assim, poderíamos pensar em financiar meus 20 milhões de empregos com uma elevação da alíquota do imposto de renda. Por exemplo, nada mais do que elevar o atual imposto cobrado aos 10% mais ricos do país em menos de 10%. Mas sabemos que existe um feitiço contra o uso da expressão "imposto de renda" no Brasil. A elite econômica (incluindo mesmo alguns de nós, professores ou jornalistas), ou seja os 10% mais ricos, seriam os perdedores muito claramente estabelecidos, o que evita que o assunto deixe de ser tratado de modo sobrenatural.
O que estranho é que haveria dois grupos de ganhadores muito evidentes com esta medida, com poder de fogo para exigir a reforma fiscal. Em primeiro lugar, trata-se dos governadores dos estados. Caso o imposto de renda fosse elevado radicalmente, com alíquotas bem pesadas para quem ganha mais de, digamos, 50 salários mínimos, os cofres dos governos estaduais seriam recompensados pelos pagamentos dos altos salários, pois o imposto de renda recolhido pelo Tesouro Estaduais nos estados fica.
O segundo grupo é constituído pelos empresários. Estes vivem queixando-se (cobertos de razão) de que seus clientes gozam de baixíssimo poder aquisitivo, pois os preços que vendedores cobram estão infectados por elevadíssima carga tributária. Obviamente, eles estão falando dos impostos que infectam preços das mercadorias que vendem, ou seja, dos impostos indiretos. O cliente paga, o empresário vende menos, mas deve recolher o imposto, ou seja, é chefe de uma exatoriazinha estadual.
Na medida em que os impostos indiretos são altamente regressivos, os empresários poderiam fazer uma cruzada em favor de sua substituição pelos impostos diretos, ou seja, deveriam clamar por uma reforma tributária mais assemelhada à dos países capitalistas avançados. Não é temerário afirmar que esta mudança alavancaria suas vendas ao ponto de lhes gerarem lucros capazes de fazê-los parar de se incomodar com o imposto de renda.
Mas o feitiço é mais forte do que argumentação racional. Parece que o único jeito de termos uma sociedade igualitária no Brasil é todos virarmos assaltantes.
DdAB
Imagem daqui. O cartão vermelho é, naturalmente, para o índice de Gini do Brasil. Mas aproveito e o traslado para os dados que vi divulgados ontem pela ONU e Oxfam: os 1% mais ricos do mundo têm um patrimônio que vai igualar em breve o valor dos 99% mais pobres.
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