Querido Blog:
Hoje é domingo, todos sabemos. Eu nem sabia se ia postar, que é cedo e em poucos momentos estar-me-ei dirigindo ao Parque Marinha do Brasil. Pedalar, alongar, respirar, ou vice-versa. Mas, enquanto folhava, descompromissadamente, Zero Hora, cheguei ao primeiro erro do dia: na p.2 do caderno "Dinheiro", um setor circular intitulado "Para Entender Economês" explica o que é "contrato futuro": "[...] outraa [...]". O resto não interessa, o que marcou-me como uma flecha foi o erro! Outraa? Novo substantivo autoadjetivável ou artigável?
Ce n'est pas un blog serieux... Ainda assim, folhei mais e -induzido pela capa- fui ver o que se diz sobre o Final Feliz. Tinha Nouriel Roubini, e aí gelei: que diz "o homem que previu a crise"? Cara, eu já dizia que milhares de outros também previram a crise, todo mundo prevê crises no capitalismo, basta ler o jornal (eu disse "jornal", ainda que me contente em ler Zero Hora). E, uma vez que houve, há e haverá milhares de crises, somos forçados a refrear nosso pessimismo com Umberto Eco: "não espereis demasiado do fim-do-mundo". Pois Roubini esperou e deu-se mal. Não tenho, infelizmente, condições mentais de seguir-lhe os escritos, a fim de testar de quantas previsões corretas recende sua fama.
Ce n'est pas tout. A crise não acabou, claro. Mas Roubini está preparando uma saída honrosa. Na p. 5, ZH cita o que ele disse em 16/ago/2009: "Se ela [id est, a crise] terminar -como parece- no fim de 2009, terá sido três vezes mais longa e cinco vezes mais profunda do que as últimas duas recessões." Então, e mais ainda, um ano antes, tudo era possível, inclusive o fim-do-mundo. Mas alguns otimistas tentaram achar que esta hipótese extrema era um tanto extrema. Roubini, em 19/out/2008 disse: "[... não] se pode descartar a perspectiva de uma recessão em forma de L, que dure uma década inteira [...]." Claro que não se podia, como não se podia descartar a hipótese de que o mundo vai acabar precisamente daqui a 24 horas (sinto tremores).
E o pior ainda é que a bailarina Lydia que dá título à postagem, cujo marido era conhecido por todos como Maynard -se não por apelidos-, talvez confundisse a referência a seu bacán na mesma p.5 com oura referência ao pai dele, seu sogro. John Neville Keynes, John Maynard Keynes. Pensei que os autores da reportagem em que Roubini é confrontado com seu pior inimigo, nomeadamente, suas próprias previsões sobre os rumos da economia mundial, nomeadamente, Alexandre de Santi e Rodrigo Münzel, tinham inventado chamar o Maynard de John Keynes. Olhei no Google, há vários outros. Pelo domingo, por tudo isto, lembrei-me de meu colega Darci Geraldo da Costa Vieira, presidente da turma da sala 104, cuja família conhecia por "Geraldo" e nós -seguindo o costume dos professores de designarem os alunos pelo prenome (exceto, creio, Joões, Josés e Marias)- chamávamos de "Darci". John Maynard, no Brasil, virou John, pois a regra de três permite:
Darci está para John
assim como
Geraldo está para Keynes.
Ontem, fiz exaltados elogios ao poder dos modelos lineares. Hoje, estou exproprando este tipo de regra de três: Darci está para Geraldo assim como John está para Maynard. Keynes e Costa Vieira é que não são lineares, isto é que é certo...
Carpe diem!
DdAB
p.s.: Mês novo, novo novembro. Peesses passam a ser Twitters:
Um : esqueci de dizer: citado no mesmo local, no mesmo dia do pedido de arreglo de Roubini, Paul Krugman (16/ago/2009, p.5 deste domingo) disse: "Parece que não teremos uma segunda Grande Depressão. O que nos salvou? A resposta, basicamente, é: O Grande Governo." esqueci de indagar: Roubini não sabia que o keynesianismo produziu o Grande Governo?
Dois :: tem duas piadinhas reacionárias boazinhas, nas p.3 (Marco Aurélio) e 12 (Sérgio da Costa Franco)
.a. nave cabralina chegando e o vigia diz: "Terra à vista"; dentro do Brasil, vemos um militante do MST dizendo: "Terra a prazo".
.b. artigo intitulado: O Primeiro Magistrado. Tópico frasal: "O presidente Lula não parece muito familiarizado com a história brasileira, como, aliás, com outras disciplinas do Ensino Fundamental".
Três ::: e o Moacyr Scliar na p.6 do caderno "Donna"? Fala sobre morte, finados e Freud:
E aí a pergunta emerge: o que podemos dizer a nós mesmos para afastar o espectro que teimosamente nos persegue? Numa entrevista dada ao jornalista americano George S. Viereck, disse Sigmund Freud: "Vivi mais de 70 anos. Tive o bastante para comer. Apreciei muitas coisas: a companhia de minha mulher, meus filhos, o pôr-do-sol. Observei as plantas crescerem na primavera. De vez em quando tive uma mão amiga para apertar. Vez ou outra encontrei um ser humano que quase me compreendeu. Que mais posso querer?".
Estava Freud mentindo a si próprio? Estava desempenhando o papel que o mundo (ao menos o mundo psicanalítico) esperava dele, o papel de supremo guru? Pode ser. Não sabemos o que terá ele pensado, ou sentido, no momento do derradeiro suspiro, da palidez final. O que podemos fazer é falar ou escrever, é transformar nossa ansiedade em palavras.
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