Querido diário:
Hoje, o jornal ZH está fervilhante, em matéria de juizadas. A manchete só poderia virar piada. E, depois da comédia, a tragédia.
Vejamos:
.a. manchete: Juízes querem reajuste automático de salários. Magistrados e defensores públicos do Estado apresentaram projeto para ganhar reajuste sempre que for elevado o subsídio dos ministros do STF. Comentário: os ministros do STF, by the way, são aqueles que, em breve, estarão ganhando R$ 30 mil por mês, fora os "subsídios", ou seja, as verbas contabilizadas em outras contas, todas benévolas à elevação do índice de Gini.
.b. piada: antes de ler o primeiro caderno, com esta manchete, li o segundo caderno, em que se exibem as piadas. Nem sempre as leio, nem sempre, quase nunca, leio todas. Hoje a última da página tem Thaves, aquele do Ernst e Frank: é o Ernst como réu e o Frank como advogado, ou vice-versa. Ao fundo, em diagonal (no plano?), um juiz, com cara de contrafeito, dedinhos tamborilando em sua vetusta mesa. Diz um deles (não o juiz, claro): "Meritíssimo, se a acusação de 'falar a verdade ao poder' for retirada, meu cliente vai se declarar culpado da ofensa menos grave de 'questionar a autoridade'." Só bebendo. Mas bebida mesmo requer é o seguinte.
.c. de volta ao primeiro caderno, li um artigo assinado. Por Maria Angélica Carrard Benites, juíza federal substituta, Vara do Juizado Federal Previdenciário de Passo Fundo, p.14, ao lado dos editoriais do dia.
Começa o artigo:
Na iniciativa privada, o profissional que luta pelo incremento de sua remuneração logo obtém o título de empreendedor.
Eu: Parece-me que se confunde "profissional" com "empresário". E "remuneração", menos sério, com lucro. Daí qualquer analogia com os juízes começar já complicada.
Vejamos:
Ao magistrado, por sua vez, imputa-se a ideia de que suas necessárias equidade, sabedoria, abdicação, humildade retiram-lhe a faculdade de lutar, não pelo incremento, mas pela preservação de sua remuneração - aviltada, há seis anos, pela insuficiência e, posteriormente, ausência de reajuste.
Eu: equidade? com o salário mínimo de R$ 600? Abdicação de quê? Humildade, ganhando R$ 30 mil? C'est magnifique. Preservação de sua remuneração? Real ou nominal? Se real, qual o deflator? E afinal não queremos todos menos desigualdade? Quer reajustes, reajustes e reajustes.
Parece que tem o seguinte:
[...] prestação célere e eficiente realizada cotidianamente pelos magistrados federais e trabalhistas em todo o país.
Pensei: nada dos magistrados estaduais? E toda a negadinha atrelada ao sistema judiciário, que está fazendo água em cachos? Já pulei cada coisa de arrepiar o carpim. Mas também tem:
[...] o sucateamento das carreiras da magistratura já está levando bons profissionais para outras bandas, deixando como legado um Poder Judiciário enfraquecido, despido de sua melhor definição, que é a independência.
Ora veja, estão ficando os dependentes? Ou é o estamento que se preocupa com as festanças de fim-de-ano e percebeu que a restrição orçamentária vale para qualquer chefe/chefa de família, para qualquer um que contribua para o orçamento doméstico. Talvez com exceção de Bill Gates, ou mesmo para ele?
Conclusão fulminante:
A forma como a magistratura vem sendo tratada pela sociedade, pelos poderes Executivo e Legislativo, é o próprio gol contra; contra os legítimos interesses de todos os cidadãos.
Insisto no ponto. Mesmo daqueles que ganham R$ 600 e são julgados pela turma do estamento que ganha 50 vezes mais que eles? Só bebendo, meu chapa, só bebendo. E vou começar agora mesmo. Mas não é daquelas cachacinhas que valem uma merreca. Vou para algo de mais pedigree!
DdAB
Em plena temporada de kai-kais, não resisti:
HAI-KAI DO ÃO-ÃO-ÃO
Não é com indexação
Que o nascido para ladrão
Julgará com o coração.
2 comentários:
To comecando a achar que aquela historia de eleicoes para juizes pode ser boa. Ou nao, ja que deputados sao eleitos e ganham salarios enormes. Acho que deveriamos ir pra anarquia, o que acha?
Abs
é certo, Daniel. mas o que me parece matar as duas charadas é que não haja mais de uma reeleição para qualquer cargo público: políticos ou juízes.
DdAB
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