21 fevereiro, 2011

Pegadinha Filosófica número 622

querido diário:
ontem pensei que iria postar estas coisas rortyanas que em instantes mostrarei à luz. e não lembrei qual o título, esta verdadeira série com infinitas possibilidades de pegadinhas filosóficas. hoje chego a dar um título mais poderoso, mais potente, mais nobre, mais elevado:

INTRODUÇÃO À FILOSOFIA
e, claro, sob este título, há certo embuste, como o há em qualquer livro de filosofia de respeito. seja como for, já no prefácio do livro

RORTY, Richard (1988) A Filosofia e o Espelho da Natureza. Lisboa: Dom Quixote

podemos ler (p.13):

Quase na mesma altura em que comecei a estudar filosofia, fiquei impressionado com o modo como os problemas filosóficos aparecem, desaparecem, ou mudam de forma, em resultado de novas assunções ou vocabulários.

de minha parte, eu não chegara a formar esta impressão, o que -em boa medida- pode estar significando que ainda não comecei a estudar filosofia. por isto, li o restante do Prefácio. de lá saquei agora, reconhecendo meu manuscrito, os seguintes dizeres: ou seja, este livro tenta isolar diversas "assunções" críticas do empirismo tradicional. já desesperado, passei à Introdução, quando, de imediato, deparei-me com (p.15):

Os filósofos geralmente pensam em sua disciplina como aquela em que se discutem problemas perenes e eternos - problemas que despontam assim que se reflecte. Alguns deles dizem respeito à diferença entre os seres humanos e outros seres e são cristalizados em questões que concernem a relação entre a mente e o corpo. Outros problemas dizem respeito à legitimação das pretensões ao saber, e são cristalizados em questões que concernem os "fundamentos" do conhecimento. Descobrir estes fundamentos é descobrir algo acerca da mente, e reciprocamente. A Filosofia enquanto disciplina vê-se então a si mesma como a tentativa para subscrever ou derrubar as pretensões ao conhecimento elaborado pela ciência, a moralidade, a arte, ou a religião. Propõe-se fazer tal na base do seu entendimento especial da natureza do conhecimento e da mente. A filosofia pode ser fundamental relativamente ao resto da cultura, porque a cultura é a montagem das pretensões ao conhecimento e a Filosofia adjudica tais pretensões. Pode fazê-lo porque compreende os fundamentos do conhecimento, e encontra estes fundamentos através do estudo do homem-como-cognoscente, dos "processos mentais" ou da "actividade de representação" que tornam possível o conhecimento. Conhecer é representar cuidadosamente o que é exterior à mente; portanto, compreender a possibilidade e natureza do conhecimento é compreender o modo pelo qual a mente se torna apta a construir tais representações. A preocupação central da Filosofia é ser uma teoria geral da representação, uma teoria que dividirá a cultura nas áreas que representam bem a realidade, que a representam menos bem e que não a representam de todo (a despeito da sua pretensão nesse sentido).

pois bem. acho que levarei décadas para entender tudo o que aqui é dito. olha daqui, olha dali, entendi que este primeiro parágrafo estava sendo um tópico frasal genial para toda a obra e que a ele deveria acorrer sempre que me sentisse em apuros. avancei a ponto de entender que as três partes (como andei postantdo antes) dizem respeito a três grandes temas: a mente, o conhecimento e a própria filosofia. retomei a primeira sentença:

Os filósofos geralmente pensam em sua disciplina como aquela em que se discutem problemas perenes e eternos - probleams que despontam assim que se reflecte.

e comecei a pensar do jeito que melhor pude: "refletir" sobre "problemas perenes, eternos": significa problematizá-los. ma é problematizá-los de acordo esta disciplina. ele mesmo dá o ponto de fuga da existência de outras, como a moral, a arte, a ciência e a religião. então comecei a redigir um glossário, pois o volume de termos que não domino amplamente começou a amplificar-se:

problematizar
refletir
disciplina.

aproveitei e pensei que -tendo-os presentes- podemos ir ao cerne: o sujeito da sentença, que vem a ser <>. sem perder a coragem, segui lendo daqui e folhando dali e comecei a pensar que talvez haja resposta, ao final da leitura diligente de todo o livro (e talvez depois da leitura dos outros dois livros de Rorty que escalei para ler a.s.a.p. e talvez ainda depois da leitura de todos os demais livros de filosofia já escritos em todos os tempos), a termos que cercam minha mente, com base em outras leituras, desde há muitos anos, como "crença" e "desejo". tais como "desejo" e "intenção". tais como "desejo" e "propósito". e também, lá adiante, vi -de relance- "convenções". parece que é tudo o que quero saber. pelo menos nesta manhã lisboeta.
DdAB
p.s. e a ilustração vem de: http://www.inovarchaves.com.br/?secao=003, que a verdade é que -quando morava em Oxford e guardava minha bicicleta no barracão do próprio condomínio, precisava enfrentar (com a cópia da chave que me alugaram) um cadeado Papaiz- pensava que estes brasileiros que o inventaram também, talvez, ainda inventem a chave de todos os problemas filosóficos e distributivos...

2 comentários:

tania disse...

Duilio: amei,amei, amei a postagem de hoje!!!! Decidi-me FILOSOFAR tambem!
A palavra FILOSOFIA é grega, é composta por duas outras: philo e sophia.
Philo deriva-se de FILIA, que significa amizade, amor fraterno, respeito entre os iguais.
SOPHIA quer dizer sabedoria e dela vem a palavra SOPHOS, sábio.
FILOSOFIA significa, portanto, amizade pela sabedoria, amor e respeito pelo saber.
FILÓSOFO: o que ama asabedoria, tem amizade pelo saber, deseja saber.
Ouso afirmar que tu és um filosofo da Economia e eu uma filosofa da Educação !
Abraço

... DdAB - Duilio de Avila Berni, ... disse...

ei, Tânia:
obrigado pela mensagem e o entusiasmo. eu tenho-me (a ênclise é estilo português castiço, pois no Brasil a regra culta é mesmo a soltura do pronome átono dentro da locução verbal) declarado "economista político". isto significa que tenho um pé na ciência econômica e outro na filosofia econômica. isto implica que poderia ser declarado filósofo, num sentido mais ralo da palavra. em sentido profundo, o próprio Richard Rorty neste mesmo livro disse (p.122): "[Kant]forneceu-nos a história do nosso tema, fixou a sua problemática e profissionalizou-o (no mínimo or haver tornado impossível que alguém fosse levado a sério como <> sem antes ter dominado a primeira " (itálico em "crítica").
DdAB