Querido diário:
Sempre que ouvia o tal Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação dizer que a carga tributária do Brasil é elevadíssima, ficava de orelha em pé, pois isto rima com má fé. Ou seja, achava que havia algo errado nestas cifras. Não que eu ache que a carga tributária deva ter algum teto ditado por regras de ouro macroeconômicas, ao contrário. Depois que entendi que a Malásia tinha/tem um coeficiente de exportações pelo PIB de 104%, passei a entender que não existem números ótimos para este tipo de variável. Também no caso dos impostos, penso que nada requer de modo absoluto que estes devam ser inferiores a 100% do PIB, nem inferiores a 1.000% do PIB.
Claro que uma sociedade que escolher (eu disse 'escolher') ter uma política tributária escalafobética pode ter impostos indiretos líquidos de subsídios. Sabemos que a renda interna a preços de consumidor (Y) é um troço mais ou menos assim:
Y = RE + EOB + II - Su,
onde, além de Y, RE é a remuneração dos empregados, EOB é o excedente operacional bruto, II são os impostos indiretos e Su são os subsídios. Como exemplo, consideremos o caso em que a remuneração dos empregados é de 1, o excedente operacional também e os impostos indiretos também e os subsídios são de 2. Então o PIB é, claro, 1. E os impostos indiretos são 100% do PIB, não é mesmo?
No outro dia, comprei umas garrafas de cachaça
oslt no supermercado pagando a quantia de R$ 76,23. Vi, abismado, que de minha sagrada receita familiar foram retirados R$ 22,05 ou 28,93% pelo malvadão do governo, que faz sabe-se lá o que com esta dinheirama. Eu e mais uma turma pagamos, diz-nos a fonte deste cálculo, de acordo com a própria nota fiscal do supermercado que tem o mau hábito de ser assaltado (dias atrás, quatro rapazes encapuçados o fizeram e fugiram, segundo testemunhas, para um baile de funk), um trilhão de reais em impostos no ano passado, uns 36% do PIB. Bem mais do que eu achei naquele exemplo vagabundinho.
Fiquei pensando: quanto é que o sr. Zaffari paga ao IBPT para ter em sua nota fiscal estas cifras (22,05 e 28,93) e, como sempre, por que não contrataram o departamento tribuário do Planeta 23 para fazer estes cálculos? Pensei em seguida: quem é
rent-seeker não é bem este blog...
Já falei antes neste blog (falei?) que a metodologia destes caras deveria ter algo de errado, algo denunciante de sua ideologia e de sua má fé, ou melhor, de sua escalavrada campanha pelo estado mínimo, ou tributação zero, sei lá. Nos estatutos do Planeta 23, há um artigo que garante que o bom mesmo é termos impostos indiretos incidindo apenas sobre os bens de demérito, nunca com o objetivo de elevar a receita, ou o que seja, mas com a intenção de reduzir-lhes o consumo! E que a tributação verdadeira deve ser baseada no imposto de renda sobre os ganhos da pessoa física (progressivo) e também da pessoa jurídica (proporcional).
E qual seria o erro fundamental que eu intuía? Seria e é o erro de inserirem as taxas (coleta de lixo, etc.) no cálculo deste coeficiente (segundo eles, nem o IBGE nem o governo omitem este negócio de seus cálculos, erro grosseiro, pois se é para calcular a "participação do governo", devemos incluir a petrobrás, o banco do brasil e milhares de outras sinecuras). Hoje vi lá naquele link deles estas coisas:
.a. incluem mesmo as taxas e as contribuições (taxa paga serviço, logo não é bem "governo")
.b. incluem as contribuições de previdência e o FGTS como impostos (a academia insere na remuneração dos empregados)
.c. não descontam do montante arrecadado o total dos subsídios devolvidos às empresas (que deveriam incidir nem tanto sobre os amigos do rei mas sobre os bens de mérito de produção mercantil) [e acrescento as transferências e gastos da previdência].
Meu ponto: os impostos indiretos são muito altos no Brasil e deveriam ser substituídos pelos impostos diretos, como é o caso dos países capitalistas avançados. A tributação não dá nenhum sinal de alcançar algum valor crítico. Se, por exemplo, passássemos a tributar apenas os bens de demérito e elevássemos o imposto de renda para 50% do PIB, poderíamos contratar aquelas empresas juniores de centros acadêmicos de reputadas universidades europeias e expandir a ação do governo especialmente na provisão de bens público (segurança) e de mérito (educação).
Infelizmente, o estrago é tão grande que nem dá para pensar em decência tributária em menos, digamos, de 20 anos. No outro dia, já referi que o trio juros-câmbio-salários está requerendo uma modificação substantiva que deverá acompanhar a gradativa eliminação dos impostos indiretos da estrutura produtiva nacional.
DdAB
P.S: o IBPT entrou na boca de vender serviços que talvez seus lobistas mesmo é que tenham mandado criar, ou seja, ingressou no clube dos sinecuristas, se é que jã não o fizera antes.
P.S.S.: a visão do IBPT é meramente jurídica e os economistas que se baseiam nela, a fim de fazerem lá suas análises econômicas são é uns jurisconsultos, ou o que o valha.