22 março, 2010

Economia e Incentivos

querido blog:
como sabemos, bem sei que nem todo incentivo recebe ou deve receber a forma de incentivo material e, dos materiais, a forma de dinheiro. mas as verdinhas deixam todos de água na boca, a julgar por mim próprio e a julgar pela própria perda de calor comparada às cédulas de diferentes tamanhos do euro.

em outras palavras, sigo (segue-se?) com o tema "que é fazer economia". primeiramente, não posso deixar de registrar que tem dentista, sapateiro, ascensorista, produtor urbano, produtor rural, produtor celestial que nunca abriu um livro da ciência econômica e é mais economista do que muitos daqueles que escreveram os livros e não o são em sua plenitude. eu mesmo já escrevi dois ou três livros e sigo tentando fugir a algumas aplicações escorreitas do manual-do-bom-economista-em-sua-vida-privada.

ontem falei em dois paradigmas (ainda que não lhes tenha devotado este nome, palavrado muito na moda no início dos anos 1980, pelo menos nos círculos que então eu frequentava). Worland era o carinha do texto clássico, mas eu já chegara a ele com o maravilhoso artigo de Oskar Lange a que também referi ontem. não falei de Worland, não é mesmo? neste caso, confrontava-se o paradigma da alocação de recursos com o dos conflitos do poder. eu, claro, sou filiado a ambos.

alocação: acho que ninguém melhor do que um economista pode dizer qual o volume de moeda emitido pelo banco central, encaixe compulsório, essas coisas, que não causa inflação, ou que causa, sei lá. ao mesmo tempo, minha preocupação central é ricardiana: conflitos do poder, em particular meu interesse há quarto de século na dimensão distributiva da ação econômica societária.

mas existe um terceiro front que pode estar mais encaixado no da alocação do que no dos conflitos sociais. trata-se da visão de que a ciência econômica é essencialmente voltada ao estudo dos processos decisórios. claro que, desde nossas ancestrais bactérias móveis, é casca decidir prá onde ir... e, em muitos casos, esta decisão custa a vida, para não falar em recursos pagáveis com suor e lágrimas, do agente.

acho que é pensar pequeno colocar toda a riqueza dos problemas econômicos sob a única chave da decisão. além do mais, há decisões que claramente não são econômicas: é melhor eu pedir a noiva em casamento numa noite de lua minguante ou crescente?; em meu aniversário, pedirei para cantarem "parabéns a você" em italiano ou português? não vejo aí verdadeiros problemas decisórios para os quais a ciência econômica tem desenvolvido técnicas. claro que a associação economistas-psicólogos ampliou o espectro das questões, mas há coisas que claramente são alheias ao espectro decisório original e talvez eterno: escassez ou conflito.

em qualquer caso, especialmente, o problema dos incentivos comparece aceleradamente. na questão da alocação de recursos, obviamente, incentivos e recompensas são as principais motoras da ação produtiva do indivíduo humano e mesmo responsáveis pela coordenação da ação isolada para gerar ação grupal. inclusive os paradoxos e o problema da falha de coordenação neste tipo de ação. da parte dos conflitos do poder, caímos em todo o espectro da economia política moderna, no sentido de Lange e de Buchanan e associados. a ação coletiva.
DdAB

2 comentários:

Sílvio e Ana disse...

Eu, que ainda penso que fazer economia é somente guardar moedas no cofrinho, imaginei o quanto seria útil existirem economistas populares. Uma banquinha na Rua da Praia, um economista lá dentro e uma placa dizendo: "Consultas Econômicas - R$ 5,00". As pessoas poderiam perguntar de tudo: "Será que é bom eu comprar nas Casas Bahia em 48 prestações?", "Eu peço para a minha própria família cantar o parabéns no meu aniversário, ou contrato tenores italianos?", "Pedirei a minha noiva em casamento na lua minguante, quando a pesca é melhor e recebo mais dinheiro, podendo levá-la a jantar, ou na crescente, momento em que estarei duro?".
Que maravilha! E tudo isso por R$ 5,00.
(Sílvio)

... DdAB - Duilio de Avila Berni, ... disse...

ei, SdS: eu também já pensei em colocar minha banca na esquina da Rua da Praia e Borges. o que me impediu de fazer foi que vim a descobrir que Borges, a exemplo do Júlio de Castilhos de minha escola, eram caudilhos autoritários e dromedários. usando o modelo de Cournot da formação de preços em duopólio, vim a entender que mesmo o preço de R$ 2,50 não se manteria por mais de uma rodada. cheguei ao preço de equilíbrio de R$ 0,01 e desisti.
DdAB