provocou muitos comentários a frase que colhi de um motorista de táxi na conhecida cidade de Roma, Itália. haverá pelo menos 2.700 Romas, nos Estados Unidos, se posso julgar por Brazil, Oxford, Cambridge, Westminster, Winchester, Old York, Medium York & New York, e por aí vai. e aqui ela vai:
boa vida não é fazer o que a gente quer,
mas valorizar o que a gente faz
mas valorizar o que a gente faz
pois, tentando aprofundar estas espantosamente filosóficas reflexões, decidi refletir, como não poderia deixar de ser, sobre elas. contrastei-a com:
.a. devemos aproveitar a vida
e
.b. o bom da vida é ser feliz.
então pensei que poderia ser de algum proveito pensar nesta de "devemos aproveitar a vida". minha primeira pergunta, baseada nas lições que ganhei de Carl Wright Mills, é pensar em seu oposto: o que será "não aproveitar a vida"? não respirar, não tomar banho, não ter um coração impetuoso? não ser delicado? ser delicado? ser dedicado? ser indexado pelo DOPS? ser terrorista, para falar no tema da moda discutida no Brasil contemporâneo.
o aurelião diz:
tirar proveito, vantagem de; valer-se, utilizar-se de, tornar proveitoso, útil ou rendoso; não desperdiçar; dar emprego; aplicar, consagrar; lucrar; ser proveitoso, útil, conveniente; ter aproveitamento; fazer progresso; adiantar-se; utilizar-se, prevalecer-se, valer-se.
uma vez fiz uma redação no "Julinho" com o título de "da vida só levaremos o que houvermos dado". claro que a contradição aparente iluminou-me o espírito para as sutilezas da língua, como -mal comparando- a ironia afetou a "Infância" de Graciliano Ramos. talvez tenha sido este pensamento (árabe?) que ajudou-me a fixar que a contabilidade de dupla entrada é importante. levaremos, débito; o que houvermos dado, crédito.
algumas aurealiadas são circulares, mas destaco idéias originais em "tornar proveitoso", "fazer progresso" e "adiantar-se". adiantar-me, na verdade, não é bem "aproveitar", pois -teria dito Raul Seixas- cada dia que passa aproxima-me do dia de minha morte. mas, se isto não acontecesse, eu não aproveitaria a vida; como parar o tempo? teria dito Brennan: "não envelhecer? só se eu pegar o tempo e o amarrar num poste". gostei da frase e até hoje não achei o poste que me sirva...
eu acho que aproveitar a vida é expandir meu espectro de individuação, ou seja, valorizar o que faço, mesmo que seja ficar doente, brigar com o chefe. claro que a gente aprende a valorizar o domínio da língua inglesa, o conhecimento das obras chave de Portinari, a capacidade de extrair raiz quadrada de 2 e a de 4, essas coisas. em que a briga com o chefe pode valorizar-me enquanto ser humano? em que a dor no pé ajuda? em que a dor de cotovelo me põe de bem com a vida?
tem que valorizar o que tem. mas acho melhor dizer: tem que valorizar o que tem em condiçoes normais. claro que penso na dupla médico judeu e médico nazista. e, claro, no prisioneiro judeu e no soldadinho ariano. inimigos inconciliáveis, e que faz um judeu, como Anne Frank, ao saber que sua saída (no sentido amargo de "finalidade" a que já me referi há tempos) era a morte. e assim foi. e se fosse tempo de internet, eu diria que seus manuscritos teriam sido forjados, que também tenho minhas desconfianças de tudo e de todos, mas -felizmente- não o tempo inteiro.
no limite newtoniano, acho que aproveitar a vida é olhar esses dois brother pandas e dizer: que bom que sei o que é um urso, que bom que sei o que é brother, que bom que sei o que é polegar opositor, que bom que sei que pandas são vegetarianos, que bom que sei escrever, que bom que sei sofrer, que bom que sei sair do sofrimento, que bom que tenho genes de Pollyana, bom que tenho este blog...
DdAB
2 comentários:
Oi Duílio,
a imagem dos pandas está linda!Parecem felizes e tranquilos.
Que bom que sei ler!
MdPB
às vezes acontecem coisas estranhas: apenas agora, dois anos e tantos meses depois do comentário da Da Paz é que o vi e a ela!
DdAB
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