31 março, 2010

L'impossible...

querido blog:
antepenúltimo dia de Pescara. o horário de verão fez amanhecer mais tarde... mas agora já é dia claro, às 6h30min estivais... esta noite, ainda havia traços da lua cheia e ouvi sons estranhos vindos do Mar Adriático, do outro lado da rua. sereias, centauros, esfinges, fadas e avalovaras. tudo isto fez-me lembrar o que transcrevo retirado da internet, ergo, com grafia sofrível. a frase é do crítico de cinema Henri Agel usada como epígrafe creio que d'O Púcaro Búlgaro, de Campos de Carvalho.

Puis que l'impossible accède à la catégorie du vrai, le vrai à son tour peut accéder à la categorie de l'impossible.

nada seria suspeito, a não ser pelo fato de que - quando liguei o computador esta manhã - encontrei sobre o bloco de notas as seguintes observações um tanto futuristas.

não é impossível que a atual conjunção espaço-tempo-matéria-energia que conhecemos seja uma configuração específica de um contexto específico e absolutamente singular e efêmero. isto faz muito mais provável encontrarmos vida nesta configuração do que outra manifestação deste universo nas outras (infinitas) possibilidades de constituição de universos. em outras palavras, podemos ser tão efêmeros quanto a existência - digamos - deum burro. mas se isto é apenas possível (e não é garantidamente certo), talvez também haja outras possibilidades, como -por exemplo - a de infinitas reencernações ou do eterno retorno.

ainda assim, sobre eterno retorno, ao ler Jorge Luis Borges (Somewhere, 2008), em que nada tem a ver com o que direi, direi do mesmo jeito. entendi que - da mesma forma que a probabilidade de ocorrer um 3,5 no lançamento de um dado é maior do que a de ocorrer, digamos, um 4 ou um 1 - jamais veremos 3,5. ou seja, existe uma possibilidade, com probabilidade maior do que zero de que um dia a presente configuração do universo repita-se. mas acho que o impossível também tem lá seus limites...
DdAB

27 março, 2010

18 ou 81?


querido blog:
quando completei 18 anos (e agora não vejo a hora de inverter e chegar logo aos 81), comuniquei a minha família que iria abandonar os estudos e, por ter-me arrependido de ter aprendido tudo o que então sabia, que iria dedicar-me à bebida, pois sabia que diziam que ela faz a gente esquecer tudo, ainda que às vezes também faça a gente esquecer que esqueceu...

fiz uma lista de 314,16 itens que deveria olvidar, começando com "anacoreta" e "aniz", passando por "bactérias, algas, fungos, líquens, briófitas, pteridófitas, gimnospermas e angiospermas", e culminando com "zeugma". não listei "alfa" e o resto do alfabeto grego e do convencional, pois já os esqueci. encafifado com as 0,16 coisas que deveria esquecer, lembrei de Benoit Mandelbrot e o conceito de superfície fracionária. se bem lembro, para ele, a área da Grã-Bretanha era de dimensão 2,1416, ao contrário da mais convencional dimensão em metros quadrados e seus múltiplos e submúltiplos (eita, conhecimentozinhos bons de esquecer...).

a família considerou que já houvera outras manifestações de inquietação que se desvaneciam após o lauto prândio dominical (epa!). decidiu esperar mais alguns dias, antes de chamar os ome. meses depois, fui aprovado no vestibular da Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS. nos primeiros dias de aula do concorrido ano de 1968, cheguei à legenda: "só bebendo!".
DdAB

26 março, 2010

366

querido blog:
a certas alturas, buscando apenas "366", encontrei esta foto, que achei interessante. ou seja, peguei o bonde andando e nem sei dizer o que por ela vemos. claro que pensei que "em terra de cego, quem tem um olho é rei" e vi belas raínhas, ao lado de um destemidíssimo clube de reis. seja como for, o fato é que o ano de 2008, quando comecei este blog, era bissexto, o que - descontando a raiz quadrada de algum número desconhecido - daria precisamente apenas 366 dias do strat o direito legal de fazer comemorações. seja como for (II), o que segue é mais "economia política" do que "escritos". vá lá.

dou tratos à bola para aplicar uma das lições que aprendi com Carl Wright Mills em seu texto (apêndice ao livro capa vermelhinha da velha Editora Zahar) é que devemos "pensar ao contrário', mas agora já tiro este título de um livro - se bem lembro - de Benjamim Coriat. vou ilustrar que tipo de raciocínio fui capaz de destilar - como diria o rapaz d'"A Ideologia Alemã" - com três pensamentos. poderia lembrar de outros, mas não lembro. seja como for (III), vejamos.

o primeiro é internacional. confronta-se com o dito "el dueño queda mui lejos", talvez baseado nos latifúndios latinoamericanos cercados de famintos (e habitados também por famintos, digamos, 1899). se o dono morava em Buenos Aires ou Paris e a peonada descansava ou dedicava-se à filosofia, a produção caía. anos após, tenho ouvido esta frase direcionada à presença do estado na economia. não que me agrade perceber que não existe poder judiciário no Brasil, nem gastos de conservação do patrimônio público (ainda não transferido pelos políticos a suas declarações de renda etc.), e por aí segueria a lista. mas tampouco me agrada a idéia de que o governo é mau gestor, pois sempre dou-me conta de que na sociedade anônima, extraordinariamente importante inovação organizacional de - digamos - 1899 el duenho também queda mui lejos. nem por isto empresas com a Enron deixaram de roubar e outras como a Nestlé dão balanços tintim por tintim a seus donos os pacifistas suíços e outros menos, americanos.

segundo: esta questão de que o governo deve garantir a propriedade privada sempre me fez pensar que ele também deveria garantir a propriedade de escovas de dentes, lençóis, pratinho de comer granola etc., dos meninos de rua. e de outros apaniguados das agruras.

por terceiro lugar, tem o mantra de que se paga muito imposto no Brasil. a isto, cito apenas as contas nacionais quemostram que os impostos indiretos líquidos de subsídios representam uma cifra tão pouco expressiva que os europeus ficariam invejosos. e também digo que os empresários que clamam por reduzir ainda mais os impostos sobre os setores produtivos estão cobertos de razão! e - seguindo meu amado Mill - penso que poderíamos era aumentar os impostos que não inciedme sobre os setores produtivos, ou seja, que incidem sobre as instituições, como as famílias. não é lá das famílias que tudo veio e para onde tudo vai? então toca o imposto lá dentro. e mais ainda faz elas (epa!) elegerem governos decentes.

seja como for (IV), amanhã vai ser outro dia, e declaro encerradas as comemorações do primeiro ano bissexto com blog (ou algo parecido)!
DdAB

25 março, 2010

365

querido blog:
tenho duas amigas -SM & NdO- que, neste sábado, vão-se a Barcelona. fiz-lhes um pedido que parece inusitado, mas que -em sua volta a Pescara- quando a encomenda chegar-me às mãos, veremos que a realidade é composta por mais dimensões que as 365 que regem o ano modal. por cabalístico, hoje comemoro a postagem de número 365 neste blog. a primeira, do tempo do UOL (alguma coisa ainda está no cyberespaço), ocorreu no final de setembro de 2004. já tenho história. amanhã, comemorarei os 366 dias de postagem (na verdade, andei fazendo mais de uma em um mesmo dia...). e daqui a quatro anos, or so, celebrarei os 10 anos or so. seja como for, nestes dois anos de blogspot, fiz mais do que "each another day", alcançando meu propósito -explicitado no site- de "postagens diárias ou quase". espero que, em certo futuro, minhas postagens -se bem atijoladas- dêem lugar a um livro sobre a natureza humana e suas 365 peculiaridades já catalogadas por mim.

seja como for, eis o caminho a ser percorrodo por quem viver o dia que envolve todos os demais dias e, o que é mais diabólico, a si mesmo, naturalmente, em Barcelona:
.a. identificar a principal rambla de Barcelona, certificando-se de que ela ainda existe
.b. caminhar, sem provocar suspeitas, pelo passeio público do lado direito, no sentido mar-rotunda
.c. na rotunda, identificar, mantendo a direita, a loja "El Corte Inglés"
.d. entrar na loja (sem provocar suspeitas)
.e. seguir em frente, até alcançar a escada rolante que leva ao primeiro piso
.f. sair da escada, tomando agora o rumo da esquerda e chegando -a 45 graus de ângulo da escada - a uma prateleira de pocket books
.g. buscar, olhando de frente (sem provocar suspeitas) a antepenúltima prateleira (de cima para baixo), buscando nela um livro que terá escrito na lombada, entre outros dizeres, os seguintes: "Alianza Editorial", "Jorge Luis Borges" e "Narraciones" (com dois "enes-nn").
.h. encontrando-o, comprá-lo (sem despertar suspeita); caso haja mais de um, trazê-los a Pescara
.i. ao entregar-mo-lo(s), dizer: "foi então que vi o Aleph", caso se trate mesmo do livro que abarca todos os demais livros do mundo e -o que é mais diabólico- a si próprio, caracterizando a vitória alcançada em 365 dias, o que abarca todos os anos do mundo e -o que é mais diabólico- à curva do tempo que é função envoltória (envelope) de todos os tempos. sem provocar suspeitas.
DdAB

24 março, 2010

sem ser economista...

querido blog:
procurei no Google Images a seguinte expressão: "sem ser economista", para ilustrar o de que falarei em seguida. achei trivialidades, como aquele mesmo porquinho do outro dia, desta vez carregado por duas mãos humanas como se fossem servas de Mamón (era isto?). passei a "sem ser" e achei esta foto peculiar. studium e punctum, na visão barthesiana. meu punctum é o carinha sem camisa (é?) agarrado à escada, mais para o lado da água do que do solo. que pensava ele? que o fez pensar o que pensava? o original, dizia-se, era "caminhar sobre as águas sem ser jesus". pensei, antes de lê-lo, que a profundidade daquele espaço é que não era lá essas coisas. mas também pode ser que o banhista (?) tivesse reunido todas as suas forças para pular e ainda não tivesse caído 100% no mundo newtoniano da atração gravitacional plena.

deixemo-los, mas retenhamos nossas preocupações com o modelo conjetural (Carlo Ginzburg e demais gênios). quero agora ilustrar que certas hipóteses têm vida tão curta quanto a liberação gravitacional de um boi ou de um banhista. neste caso, pensemos na natureza das moléculas que dão suporte ao que chamamos de vida é razoavelmente imutável. ainda assim, não podemos negar que:
.a. o universo já comemorou sete bilhões de anos e segue expandindo-se
.b. a vida tem dois bilhões de ano e segue reproduzindo-se de maneiras não muito diferentes daquelas em que o fez, digamos, quando tinha apenas dois milhões de anos...
.c. a vida pode seguir reproduzindo-se durante mais alguns bilhões de anos, talvez os próprios sete bilhões que ainda faltam para decretarmos o final dos tempos...

neste caso, haverá alguma diferença no tamanho dos átomos que compõe os seres vivos originais e seus sucessores contemporâneos, para não falar dos que ainda vão nascer, como teria dito Brecht. é? a menos que a "matéria escura" é que esteja expandindo-se e os átomos e todo o resto da matéria-energia-espaço-tempop estejam conservando este tipo de propriedade. é?
DdAB

23 março, 2010

Sociedade do Futuro e Fotografias

querido blog:
tá tudo no Google Images, não é mesmo? conhecer Escher perturbou-me mais do que conhecer os Rolling Stones, mal comparando. e nada melhor do que uma de suas gravuras para refletir sobre fotografia. procurei com "sociedade do futuro", como na epígrafe. e veio-me alguma coisa interessante, inclusive o livro Walden, de Henry David Thoureau.

um dia, refletirei sobre, como se diz em alemão, "dudo chundo 'reunido", ou seja, Swift, Morus, Defoe, Rousseau, Skinner, Huxley, essa macacada toda que escreveu sobre utopias e distopias. não sei se foi o Armstrong do jazz ou outro jazzista (Gilespie?) que teria dito que preocupa-se com o futuro, pois é lá que vai viver. no outro dia, falávamos sobre epitáfios e Antonino falou em um mais ou menos assim: "foi bom, não é mesmo? vemo-nos em breve aqui embaixo". em resumo, a menos que aquelas teorias sobre as caixas de neutrinos e o Cinema Cacique, sei lá, estejam certas, não há muito o que esperar do porvir. seja como for, fica-me a frase de Ray Bradbury que aprendi em Berlim (mas que ele disse sei lá aonde): vivemos numa espaçonave cuja tripulação vai trocando ao longo da viagem.

seja como for, ninguém sabe com exatidão o que será do futuro, exceto uma categoria muito especial de meninos, descritos por seus pares -há algumas décadas- como "adivinhão". naturalmente, suas previsões distinguem-se das que alcançamos com o uso de técnicas mais modernas, como a leitura espelhada do céu estrelado e a tomografia das vísceras dos animais domésticos. na verdade, li na agora já saudosa Zero Hora há algum tempo uma crônica de Moacyr Scliar em que ele dizia que a batalha final ocorrerá entre os que têm animais domésticos (cães, em particular) e os normais. eu acho que este é mesmo um tema importante e associo-me a Eduardo Dusek na palavra de ordem: "troque seu cachorro por uma criança pobre". mas, mais malvado, sou de opinião que cachorro de rico também deveria pagar imposto de renda. (mas cachorro de pobre também!).

mais importante do que esta clivagem entre cães e homens, pobres e ricos, existe o espantoso divisor de águas entre decência e inconveniência dado pela legião de batedores de foto (os de filmezinhos de telefone já caíram no opróbrio mesmo nos dias que correm). strange days indeed, disse o John. a verdade verídica é que, quanto menos tu aparecê nas foto, maiores serão teus créditos para a aquisição de bens ou serviços que te empurrem a uma curva de indiferença superior à da macacada do click-na-tua-cara.

prevejo que nosso bem-estar (estamos do mesmo lado, não é mesmo) botará no chinelo o dos donos de cães e gatos e dos batedores de foto de telefone.
DdAB

22 março, 2010

Economia e Incentivos

querido blog:
como sabemos, bem sei que nem todo incentivo recebe ou deve receber a forma de incentivo material e, dos materiais, a forma de dinheiro. mas as verdinhas deixam todos de água na boca, a julgar por mim próprio e a julgar pela própria perda de calor comparada às cédulas de diferentes tamanhos do euro.

em outras palavras, sigo (segue-se?) com o tema "que é fazer economia". primeiramente, não posso deixar de registrar que tem dentista, sapateiro, ascensorista, produtor urbano, produtor rural, produtor celestial que nunca abriu um livro da ciência econômica e é mais economista do que muitos daqueles que escreveram os livros e não o são em sua plenitude. eu mesmo já escrevi dois ou três livros e sigo tentando fugir a algumas aplicações escorreitas do manual-do-bom-economista-em-sua-vida-privada.

ontem falei em dois paradigmas (ainda que não lhes tenha devotado este nome, palavrado muito na moda no início dos anos 1980, pelo menos nos círculos que então eu frequentava). Worland era o carinha do texto clássico, mas eu já chegara a ele com o maravilhoso artigo de Oskar Lange a que também referi ontem. não falei de Worland, não é mesmo? neste caso, confrontava-se o paradigma da alocação de recursos com o dos conflitos do poder. eu, claro, sou filiado a ambos.

alocação: acho que ninguém melhor do que um economista pode dizer qual o volume de moeda emitido pelo banco central, encaixe compulsório, essas coisas, que não causa inflação, ou que causa, sei lá. ao mesmo tempo, minha preocupação central é ricardiana: conflitos do poder, em particular meu interesse há quarto de século na dimensão distributiva da ação econômica societária.

mas existe um terceiro front que pode estar mais encaixado no da alocação do que no dos conflitos sociais. trata-se da visão de que a ciência econômica é essencialmente voltada ao estudo dos processos decisórios. claro que, desde nossas ancestrais bactérias móveis, é casca decidir prá onde ir... e, em muitos casos, esta decisão custa a vida, para não falar em recursos pagáveis com suor e lágrimas, do agente.

acho que é pensar pequeno colocar toda a riqueza dos problemas econômicos sob a única chave da decisão. além do mais, há decisões que claramente não são econômicas: é melhor eu pedir a noiva em casamento numa noite de lua minguante ou crescente?; em meu aniversário, pedirei para cantarem "parabéns a você" em italiano ou português? não vejo aí verdadeiros problemas decisórios para os quais a ciência econômica tem desenvolvido técnicas. claro que a associação economistas-psicólogos ampliou o espectro das questões, mas há coisas que claramente são alheias ao espectro decisório original e talvez eterno: escassez ou conflito.

em qualquer caso, especialmente, o problema dos incentivos comparece aceleradamente. na questão da alocação de recursos, obviamente, incentivos e recompensas são as principais motoras da ação produtiva do indivíduo humano e mesmo responsáveis pela coordenação da ação isolada para gerar ação grupal. inclusive os paradoxos e o problema da falha de coordenação neste tipo de ação. da parte dos conflitos do poder, caímos em todo o espectro da economia política moderna, no sentido de Lange e de Buchanan e associados. a ação coletiva.
DdAB

21 março, 2010

Friedman fazia economia

querido blog:
continuo no tema de "fazer economia" e "ser economista". já li bastante a respeito e cheguei, se bem lembro, a escrever um artigo na revista Ensaios FEE sobre o tema, ou os temas, os três, se incluirmos o que é "economia".

claro que não pretendo dar uma resposta frontal a todas estas questões (e obviamente não é por falta de capacidade, pois tenho-as perfeitamente respondidas em minha mente e mesmo escritos aqui e acolá). primeiro, há duas economias: a realidade econômica e a ciência econômica. economista é todo aquele que estuda a realidade econômica. alguns economistas valem-se da ciência econômica para gerarem seus achados.

realidade econômica é um objeto perfeitamente definido. é algo "do mundo lá fora", ainda que me afete. por exemplo, uso roupas, o que -em si- nada tem a ver com economia, mas -não fosse a divisão do trabalho na sociedade, não fosse o progresso da ciência do tingimento de tecidos, e milhões de outros recortes do cotidiano- eu não estaria usando precisamente as roupas que porto no presesente instante. e o que é o "mundo cá dentro"? é meu mundo das idéias. penso que o existe um mundo lá fora. aparentemente ele existe, ergo eu também existo e -comigo- minhas roupas, meu macacão de zuarte, meu automóvel...

a ciência econômica é que tem mais facetas do que a própria realidade que ela descreve. claro, pois a ciência econômica é algo em que pensamos, nós, os economistas interessados nela. por exemplo, meninos de rua, quando voltam-se a assaltar velhinhos, também podem ser declardos economistas, pois fizeram cálculos criteriosos que lhes impuseram o caminho do crime sobre o da virtude.

bem, não é bem isto o que Milton Friedman quis dizer, ainda que um monte de meninos acéfalos por aí pensem. primeiro: não interessa, para estes fins, que Friedman tenha apoiado a ditadura chilena; aprendi com Marx que não devemos julgar Balzac por sua admiração pela ascendente burguesia, mas pela sua capacidade de descrever sentimentos e emoções humanas. ok, deixemos a Bachelet e seu sucessor no opróbio a que já os condenei, anyway...

agora, falando em que faz um economista etc., ocorreu-me de falar de Friedman, que -a meu ver e para minha formação - teve pelo menos três importantíssimas repercussões. a primeira veio com mais ou menos o que caricaturei acima sobre a qualidade das premissas dos modelos não ser elemento importante para seu julgamento. parece que foi Mark Blaug que escreveu que "Friedman is Popper with a twist to economics". claro que ambos são Mont Pélerin oslt. mas não é disto que estou falando... esta questão da "economia positiva" é importante para descrever os contornos da ciência econômica.

talvez a semente de Friedman tenha caído tão profundamente em meu terreninho (epa!) simplesmente porque este teria sido arado adequadamente por Oskar Lange, no artigo do livro da editora Zahar editado por David Horowitz e intitulado "A Economia Marxista e a Moderna Teoria Econômica". há alguns anos, decidi intitular-me economista político, precisamente por apreciar both a "economia marxista" e a "moderna teoria econômica". claro que Lange nada falou sobre a teoria da escolha pública, pois nem a criou nem ninguém, antes dele, foi capaz de fazê-lo.

ainda assim, não precisava ser o criador para fazer dela o que fez, por exemplo, Samuel Bowles, com sua formação marxista, neoclássica/econométrica e austríaca. e mesmo antes de Bowles eu já entendera a importância de coisas que ele, como ninguém, sintetizou e deu sentido para mim. ele, Bowles, é o mundo lá fora. e o que ele deixou em meu mundo lá dentro é impagável. claro que Friedman também...

voltemos a Friedman: segunda contribuição. em minha maneira de ver o livro de Macroeconomia de Wendy Carlin e David Soskice (o primeiro livro dos dois, mas o segundo não nega em absoluto), o conceito mais importante da macroeconomia é a taxa de desemprego não aceleradora da inflação - NAIRU. e, em minha maneira de ver Friedman e seus escritos monetários e os de alguns comentadores, foi precisamente ele o fundador do conceito. parece óbvio, depois de explicitado. se há algum nível de equilíbrio entre inflação e desemprego, haverá -lógico- outros de desequilíbrio. Teethetus diria: um grupo de desequilíbrios tem a ver com inflação e outro grupo terá lá suas contas a prestar à deflação. e daí? segue-se logicamente que podemos pensar num nível de equilíbrio geral (geral? com posições decentes no mercado de trabalho e no de crédito, não mais que isto) em que o desemprego, os preços, os salários reais, a taxa de inflação, a taxa de câmbio, o consumo das famílias pobres, o gasto em aparatos repressivos, tudo estará em equilíbrio. ou com inflação nula ou com inflação mantendo-se em determinado patamar. isto implica logicamente que sou favorável à manutenção do Dr. Henrique Meirelles na chefia do Banco Central do Brasil (e eu quase ia dizendo "na gerência" da agência brasileira do Banco Central Mundial...).

pois bem. em minha opinião, a maior contribuição de Milton Friedman para o século XXI (pois foi nele que li sistematicamente pela primeira vez sobre a renda básica). o lado chileno não conta, mas a motivação de Friedman tem a ver com "liberdade". para ele, o exercício da liberdade apenas pode ser iniciado a partir de um nível mínimo de necessidades atendidas. claro que ele terá lido Maslow e talvez Rawls, concordando com um e discordando do outro. o fato é que ele foi o carinha que teve a coragem de retomar o tema de 50 anos antes lá de seus escritos sobre o papel da "esmola". e sacou a questão via imposto de renda: se quem ganha muito paga mais do que quem ganha menos, quem ganha certo montante não paga nada, é lógico que quem ganhe menos do que certo montante decente deve ganhar imposto de renda de volta!

em minha opinião, isto organiza o mundo do século XXI: a humanidade chegou num ponto de poder viver sem trabalhar, pois tem gente que gostará de trabalhar para ganhar incentivos espetaculares que se associarão aos selecionados postos do labour market. só para rimar o final: acho que a dupla Serra-Dilma será capaz de acelerar a implantação da renda básica, ainda que não com os contornos que considero adequados. mas é melhor vê-los na presidência do que gente do porte de Alain Delon, Silvio Berlusconi, John Wayne ou Vladimir Putin.
DdAB

20 março, 2010

mais louco é quem diz...


querido diário:
não sou muito bom nisto. mas lembro que havia Alandelon, do Esporte Clube Bahia, lá por 1982, quando nem todos os cachorrinhos já haviam nascido... seja como for, não é de futebol que me vêm as emoções. no passado, emocionei-me com filmes de Alain Delon, the French one.

como o marcador que hoje uso é "Escritos", posso falar rapidamente da economia mundana: Alain Delon acaba de firmar um contrato para fazer um filme, uma produção, presumo, ítalo-francesa, como bem já outras vi... e teria assinado o contrato por E$ 2.000.000. nem me emocionei tanto, pois desconheço a média de contratos do monsieur e mesmo a média mundial de atores de 1982 e antes.

seja como for, pensei: "se eles são Del Mondo (não era isto?), sou Alain Delon. e, se fosse mulher, talvez quisesse fazer o fake de Dorothy Mallone, pois jamais esqueci que vi uma garota com este nome listada entre os aprovados do vestibular da Universidade de Caxias do Sul, num tempo em que alguns cachorrinhos já haviam nascido, mas talvez nem todos...

é nome: Sócrates (goleiro), Aristóteles, Adão de Cristo, Newton e Leibnitz (alas e zagas), e por aí vai o cálculo... pois bem, o Alain original e seu filme de E$ 2.000.000, diz "El Centro", o jornal dos Abruzzos, como diz aqui, na edição de ontem, sexta-feira, informa ao incauto leitor (que eu sou mesmo...), dizem respeito a uma biografia do Comendatore Berlusconi e os escândalos sexuais em que ele (ambos?) envolveu-se.

só bebendo.
DdAB

19 março, 2010

Fazer Economia

querido blog:
entre terça e quarta-feira, passei umas 18 horas na República de San Marino, dormindo (o Brasil em seu leito esplêndido e eu num hotel) algumas delas... seus 60km^2 confrontam com os 450 (oslt) de Porto Alegre, seus 30 mil habitantes confrontam com os tipo 35 mil do Bairro Menino Deus. claro que isto levou-me a pensar no "estado mínimo". sou municipalista, acho que o Planeta Earth (e suas sedentárias 24 horas) deveria organizar-se e constituir uma federação de municípios independentes livremente associados. e, em minha opinião, o Bairro Menino Deus e, em especial, a turminha de perto da Praça Estado de Israel, deveríamos declarar nossa independência (ou morte?; não, claro, ou vida e mais vida etc.). qual seria o limite mínimo para a área de um município. ainda não pensei nisto, mas não veria problema em declararmos minha casa um município independente, livremente associando-me aos vizinhos respeitadores de minha liberdade. ok, enough para a filosofia política.

mais sério ainda é o que segue sobre economia política e suas inserções em nossas vidas. claro que a primeira forma de inseri-la é estudá-la. obviamente, manter laços com o mundo econômico nada tem a ver com economia política. dizemos "estudar economia", escondendo a ambiguidade do termo: estudar uma ciência que estuda um ambiente, o econômico. além da ciência econômica, já cataloguei milhares de outras ciências. analogamente, além do ambiente econômico, já cataloguei milhares de outros ambientes frequentados por seres humanos, israelitas e palestinos, sanmarinenses e meninodeusinos. outras ciências? antropologia, botânica, contabilidade, dentística restauradora, e por aí vai. outros ambientes? o religioso, o artístico, o esportivo, o educacional, e por aí também vai...

pois quem quiser estudar economia política deverá saber o que é fazer economia. no Brasil Contemporâneo, é enrolar-se numa faculdade e pagá-la regularmente e receber do Sr. Martinho da Villa um canudo de papel. por isto, gostaria de lembrar as jovens gerações que buscan neste blog conforto para suas indecisões profissionais o que me levou a estudar economia. foi o entendimento de que fazer economia era o que mamãe fazia quando me dava apenas meio bife no almoço...

mas outras razões também levaram outros gulosinhos a estudarem esta controversa ciência. a filha de um daqueles velhinhos disse-lhe que "economia é meu pai brincando com aqueles papéis e desenhos". outro rapaz, mais pragmático, disse que economia é aquilo que os economistas fazem. por pragmático que eu mesmo seja, achei de pouco proveito esta definição, pois -com isto- não sei se o que faço é economia ou se não sou economista, logo eu que acabo de pagar um dinheirão para poder usar uma carteirinha de economista...

o animador de televisão Abelardo Jurema teria dito a um rato de biblioteca que "economia é a base da porcaria", o que ressoaria nas estradas de Santiago do Boqueirão com a versão de "atalho dá trabalho". por seu turno, nesta linha de argumentação, não estamos distanciados do problema da escassez, o que nos força a filosofar (era filosofia política ou economia política?) embalado no tango de Enrique que queremos ouvir "el que no llora no mama". e ainda no samba bam-bam-bam "quem não chora não mama, segura, meu bem, a chupeta". uns troços assim.
DdAB

15 março, 2010

O Censo de 2010

querido blog:
semanas atrás, o blog http://anasimandro.blogspot.com, que tanto prezo, fez algumas previsões para 2010. eu não queria deixar passar todo o ano, o que me facilitaria o serviço. por exemplo, hoje consigo prever pilhas de coisas verídicas sobre 2009. seja como for, faço uma previsão para 2010: "o IBGE vai entrar em greve bem no dia da contagem da população, que parece ser lá pelo primeiro de setembro." e isto não é manifestação de mau-humor, mas apenas de perplexidade, pois creio que desde 1960 só houve censo sem turbulência no ano de 1970, quando eles tiveram o bom-senso de me contratar como entrevistador.
DdAB

10 março, 2010

acabo de ouvir 428 tangos

querido blog:
acabo de rever o título do paper de Sala-i-Martin dizendo que acabou de rodar um milhão de regressões para testar todas as imagináveis hipóteses sobre a incorporação de progresso tecnológico nas funções de produção, ou sei lá aonde. por outro lado, acabo de ouvir (desde ontem( 428 tangos, ou sei lá quantos) que tenho gravados em meu iPod, five years old.

sobre os 428, devo dizer que existem dois tipos de universos. os finitos e os infinitos. interessam-me aqui, em continuação, apenas os finitos que podem ser transformados em infinitos. por exemplo, 428 tangos podem ser ouvidos um número finito de vezes: 428, mas posso ouvi-los aleatoreamente, já dá, digamos 428!, não é? um número grande prá burro. e mais, posso ouvir aleatoreamente essas pilhas fatoriais iniciando pelo n.123, depois pelo 234, depois pelo 3, e assim por diante. depois posso escolher o 47, seguido do 48 e o resto vindo aleatoreamente. e assim não chego ao infinito.

mesmo sem a pretensão de chegar ao infinito, posso pensar que os qutro instrumentos fundamentais de La Boca e seu Caminito, nomeadamente, o violino, o piano, o bandoneón e o contrabaixo, podem tocar cada um desses bilhões de combinações entre os 428, elevando-as para 4! x bilhões. ainda assim, não é infinito. e variamos a entrada dos instrumentos. e variamos os acordes em fá menor, e fazemos improvisações em todos os si bemóis. e nunca chegaremos ao infinito. e depois podemos acoplar os conjuntos já existentes e por existir. ainda assim...

se tudo isto couber em meu futuro iPod, quem não terá tempo para apreciar serei eu mesmo...
DdAB

07 março, 2010

VIOLÊNCIA E SEGURANÇA PÚBLICA


Querido Blogue:
Li (Somewhere, p.1947) que o Sr. Marshall Rosemberg (não sei quem é) disse que a violência nada mais é do que a “manifestação trágica de necessidades não atendidas”.

Ora, o Sr. Aurelião diz de violência: 4.Jur. Constrangimento físico ou moral; uso da força; coação.

Neste caso, torna-se claro que a violência consiste em ação da parte de um indivíduo ou grupo, inclusive governantes, que restringe a liberdade de ação de outro/s. Ou seja, forçar comportamentos nos outros que atendam aos interesses do “violento”.

Ademais, parece-me que “necessidades não atendidas” abarca todo tipo de ação, pois – sabemos desde a primeira aula do mais elementar curso de Introdução à Economia – as necessidades humanas são ilimitadas. Neste caso, a bondade e a habilidade de nunca desafinar no canto orfeônico também são manifestações de necessidades não atendidas. Cá entre nós... Ficaria a diferença no “trágica”, o que me parece insuficiente.

O desejo de segurança é algo tão básico que sequer pode ser considerado uma criação humana. Ora, os animais também desenvolveram a função de segurança individual e coletiva, perfeitamente delegada pela coletividade a alguns indivíduos (formigas, lobos etc.). Pensando em diferenciar-se dos animais, os indivíduos humanos organizam-se em comunidades (aliás, como os bichinhos) e estas vieram a constituir o estado (lá esta maldade os bichinhos não produziram e, se o tivessem feito, não escreveriam com “e” maiúsculo, I guess). O estado exerce funções que não podem ser desempenhadas pelo mercado, ainda que possa atuar em paralelo com este. Ao mesmo tempo, o Estado atua por delegação da comunidade, ainda que, às vezes, possa agir contrariamente aos interesses desta (como a corrupção dos políticos). Dizer que a segurança existe quando os indivíduos (“as pessoas”) cuidam umas das outras evade a questão: quem deve cuidar de minha segurança essencialmente, além de mim próprio e dos membros de minha comunidade mais próxima (vizinhos), é o Governo, que foi constituído precisamente para prestar este tipo serviço cuja provisão pelo mercado é impossível.

A ação dos indivíduos na provisão dos serviços de segurança pública tem dois óbices importantes. Primeiro, eles não têm poder de polícia, nem atribuição de administrar a justiça. Em segundo lugar, não existe um incentivo emanado do mercado que permita que os indivíduos prestem segurança pública aos demais. A ação do Estado torna-se possível, pois ele tem o poder de tributar e, como tal, presta o serviço que – de outro modo – não teria financiamento. No jargão econômico, diz-se que a segurança pública (além de outros serviços, como a iluminação pública e as amenidades ambientais) é um bem público, significando que:

.a. se houver provisão para um, haverá provisão para os demais, sem que o custo se eleve (diferentemente de um restaurante, em que a provisão ilimitada é impossível, pois a cozinha não pode atender a todos, nem haverá garfos) e

.b. o consumo de um não exclui o consumo dos demais (diferentemente do restaurante, em que quem não paga não come).

Acho evidente que meu sentimento de segurança é uma das causas meu bem-estar. Por seu turno, a segurança, evidentemente, é conseqüência da ação de um governo sério. E a insegurança é conseqüência da ação de governos como os que temos visto no Brasil desde os anos 1970: incompetentes, anti-democráticos e incapazes de entender a natureza das aflições da população. Ou seja, do loteamento do setor público para cooptar as elites e seus filhotes em troca de apoio político para a implementação de reformas anti-democráticas que nos distanciam do socialismo.

Por mais que atuemos em defesa da segurança pública, enquanto indivíduos e mesmo enquanto membros de alguma associação comunitária, nossos resultados serão modestos. Não podemos substituir as funções do sistema judiciário. Para não falar no encarceramento dos juízes que ganham R$ 27.000 por mês, podemos argumentar com as funções de polícia: prevenção, repressão e punição. Mas que será que podemos fazer para que o aparato governamental pare de roubar o dinheiro público ou gastá-lo em fins esdrúxulos (patrocinar o vôlei, promover coquetéis de lançamento de shows de música)?

Existe uma explicação da ação governamental que se chama de “teoria da troca voluntária”. Esta diz que eu pago impostos em troca do recebimento da ação governamental que considero adequada. Neste caso, creio que nossa responsabilidade não é de criarmos “segurança pública”, o que é uma função muito mais estatal do que comunitária. Ainda que possamos desempenhar ações comunitárias, tenho a sensação de que o diferencial realmente será dado pela ação governamental. E temos a responsabilidade de cobrar ação dos governantes.
DdAB

06 março, 2010

Individuação e Escassez

querido blog:
nada há de mais turístico do que contemplar esta foto, especialmente, se procuras por "islay" na wikipedia internacional (inglês). pois muito menos turística é a realidade daquelas ilhas do norte da Escócia ("surrounded by waters temperamental enough to test the most skilled captain"), tanto é que elas tradicionalmente acomodaram pouca população. e, a julgar pela National Geographic (em inglês, jan/2010, p.55-77). considerando que "Islei" é nome de mulher, no Brasil, somos forçados a concluir que este "Islay" se refere a uma ilha, uma das ilhas que foi objeto dessa maravilhosa reportagem fotográfica da N.G.. mas que tem isto a ver para declarar "economia política" o marcador desta postagem, que até agora cheira mais a "escritos"?

resposta fácil: o seguinte trecho::

The famous cranky 18th-century London intellectual Samuel Johnson declared that mainlanders to the south knew no more of them than they did "of Borneo or Sumatra." What little was written focused on "improvindg the islands: What crops could be grown? What resources exploited? How large a population could the varios islands support, and what sort of rents could they generate for their landlors?" Johnson mostly filled the journal of his Hebridean journey with complaints about the difficulties of travel and the rustic aaccomodation tha he endured.

eu já ouvira falar em Samuel Johnson, mas não mais que uma vaga lembrança... fui à Wikipedia (não tem registro em português), agora sei um pouco mais, pois há milhares de Johnsons, Samuels, mas fixei-me naquele que viveu entre 1709 e 1784. parece-se com um "intelectual". vamos ao que diz a National e que diz ela que acima disse ele.

ele estaria dizendo que os moradores daquele cafundó mal sabiam quem eram. e eu, apressado, já achei que ele queria dizer que aquela turma sabia tanto de si quanto os aborígenes de Bornéu e Sumatra. mas não faz mal. se Johnson sabia o que é "bornéu", não haveria maiores problemas em que o habitante médio das Ilhas Hebrides (não tem na wiki/pt), em média, o soubesse.

e o que permitiu a um saber e aos demais não conhecerem? Johnson, se bem entendo, foi meu colega. não, não no St. Peter's, mas no Pembroke's. meu próprio college, se bem lembro, fundou-se apenas em, digamos, 1926 (mais velho que a USP e com fama de ser um dos mais pobres, aliás, todos gostariam de ser o mais rico e ter a fama de querer ser o mais pobre...). todo graduado por Pembroke, desde o ano zero, terá que saber essas coisas fundamentais para o escanhoamento correto do rosto, como era o caso da foto da wiki/eng.

mas não foi apenas a falta de educação, no sentido oxfordiano. faltaram-lhes também meios de poderem descolar, como diriam os próprios ingleses, "a mão da boca". quem vive pensando na próxima refeição ou é gordo ou é pobretão. mas, descontando o ano zero, se recuarmos mais 13.000 anos, chegaremos a um espaço coberto por uma montanha de gelo. global warming? claro, não fosse este hoje considerado vilão, não estaríamos contemplando os verbetes que tão orgulhosamente a Wiki/inglês exibe.

qual o tamanho ideal da população a ser carregada pelas ilhas? esta pergunta de Johnson é boa. eu mesmo, durante a ditadura militar, achava que era proibido falar em "controle demográfico", "planejamento familiar", essas coisas. mas o problema não estava errado, o erro era dos proponentes da discussão, a milicada, em achar que o que achava era o melhor para o Brasil. eu acho que quem acha que sabe o que é melhor para o Brasil tem o direito de achá-lo e mesmo de expressá-lo, com eu mesmo penso que o faço. o que não temos direito, eu e os demais pensadores, é de dar um golpe de estado e depois arrancarmos unhas a desafetos políticos et pour cause.

em resumo, a capacidade de carga das ilhas é uma realidade. já pensou se ela abrigasse toda a população de São Paulo? e a da Índia, a da China e de Jaguari, irmanadas? o conceito de capacidade de carga do planeta é algo absolutamente sólido e causador de preocupação. é claro que há coisas a fazer para amenizar o "efeito estufa", essas coisas. a segunda, claro, é melhorar a tecnologia anti-poluidora. e a primeira, óbvio, é não exagerar no crescimento populacional.

a primeira questão fundamental da economia ("o que, quanto produzir"), diz o livro texto, fala em "mais agora ou muito mais depois", os canhões ou manteiga de Paul Samuelson. e parece óbvio que mais população agora significa menos crescimento depois, pois temos uma gama de desvalidos que fariam inveja aos aborígenes australianos e aos britânicos de Isley Whatever. ouvi dizer que tem gente entrando com liminares para impedir que pessoa que ganha menos do que a renda básica universal seja declarada "gente".

de onde veio meu mote para falar em individuação? como é que pode alguém que desconhece conceitos falar sobre eles? como é que pode alguém que desconhece noções comezinhas de geografia (heliocentrismo), biologia (o macaco é descendente do peixe...), psicologia (nossa percepção do mundo é originada de nosso inconsciente), essas coisas, falar sobre elas? como pode questionar-se de onde veio e para onde vai? como pode, enfin (com "n", pois é pronunciado em francês), individuar-se? como pode valorizar o que faz, se nem sabe o que quer?
DdAB

05 março, 2010

aproveitar a vida

querido blog:
provocou muitos comentários a frase que colhi de um motorista de táxi na conhecida cidade de Roma, Itália. haverá pelo menos 2.700 Romas, nos Estados Unidos, se posso julgar por Brazil, Oxford, Cambridge, Westminster, Winchester, Old York, Medium York & New York, e por aí vai. e aqui ela vai:


boa vida não é fazer o que a gente quer,
mas valorizar o que a gente faz

pois, tentando aprofundar estas espantosamente filosóficas reflexões, decidi refletir, como não poderia deixar de ser, sobre elas. contrastei-a com:
.a. devemos aproveitar a vida
e
.b. o bom da vida é ser feliz.

então pensei que poderia ser de algum proveito pensar nesta de "devemos aproveitar a vida". minha primeira pergunta, baseada nas lições que ganhei de Carl Wright Mills, é pensar em seu oposto: o que será "não aproveitar a vida"? não respirar, não tomar banho, não ter um coração impetuoso? não ser delicado? ser delicado? ser dedicado? ser indexado pelo DOPS? ser terrorista, para falar no tema da moda discutida no Brasil contemporâneo.

o aurelião diz:
tirar proveito, vantagem de; valer-se, utilizar-se de, tornar proveitoso, útil ou rendoso; não desperdiçar; dar emprego; aplicar, consagrar; lucrar; ser proveitoso, útil, conveniente; ter aproveitamento; fazer progresso; adiantar-se; utilizar-se, prevalecer-se, valer-se.

uma vez fiz uma redação no "Julinho" com o título de "da vida só levaremos o que houvermos dado". claro que a contradição aparente iluminou-me o espírito para as sutilezas da língua, como -mal comparando- a ironia afetou a "Infância" de Graciliano Ramos. talvez tenha sido este pensamento (árabe?) que ajudou-me a fixar que a contabilidade de dupla entrada é importante. levaremos, débito; o que houvermos dado, crédito.

algumas aurealiadas são circulares, mas destaco idéias originais em "tornar proveitoso", "fazer progresso" e "adiantar-se". adiantar-me, na verdade, não é bem "aproveitar", pois -teria dito Raul Seixas- cada dia que passa aproxima-me do dia de minha morte. mas, se isto não acontecesse, eu não aproveitaria a vida; como parar o tempo? teria dito Brennan: "não envelhecer? só se eu pegar o tempo e o amarrar num poste". gostei da frase e até hoje não achei o poste que me sirva...

eu acho que aproveitar a vida é expandir meu espectro de individuação, ou seja, valorizar o que faço, mesmo que seja ficar doente, brigar com o chefe. claro que a gente aprende a valorizar o domínio da língua inglesa, o conhecimento das obras chave de Portinari, a capacidade de extrair raiz quadrada de 2 e a de 4, essas coisas. em que a briga com o chefe pode valorizar-me enquanto ser humano? em que a dor no pé ajuda? em que a dor de cotovelo me põe de bem com a vida?

tem que valorizar o que tem. mas acho melhor dizer: tem que valorizar o que tem em condiçoes normais. claro que penso na dupla médico judeu e médico nazista. e, claro, no prisioneiro judeu e no soldadinho ariano. inimigos inconciliáveis, e que faz um judeu, como Anne Frank, ao saber que sua saída (no sentido amargo de "finalidade" a que já me referi há tempos) era a morte. e assim foi. e se fosse tempo de internet, eu diria que seus manuscritos teriam sido forjados, que também tenho minhas desconfianças de tudo e de todos, mas -felizmente- não o tempo inteiro.

no limite newtoniano, acho que aproveitar a vida é olhar esses dois brother pandas e dizer: que bom que sei o que é um urso, que bom que sei o que é brother, que bom que sei o que é polegar opositor, que bom que sei que pandas são vegetarianos, que bom que sei escrever, que bom que sei sofrer, que bom que sei sair do sofrimento, que bom que tenho genes de Pollyana, bom que tenho este blog...
DdAB

04 março, 2010

Larangeiras, mangericões e alfavaca

querido blog:
no outro dia, eu falava com um menino de rua (ou seja, não estava em Pescara...) e lhe disse (menti) ter feito um curso de psicologia do macarrão. ele abriu a bocarra e ruminou sobre meus dizeres. mais ainda passei eu a ruminá-los, digo aos fios do spaghetti e, at the same time, ao que quero dizer com psicologia de objetos inanimados, como o spaghetti, o fidelini, o felicitômetro e outros derivativos do número pi e suas frações.

pois bem, com curso ou sem ele, não me é difícil informar que o spaghetti número cinco servido no prato acima está passado. não quero dizer que foi além do "al dente", mas que virou uma pasta que, ao ingressar na boca do menino de rua (ou de qualquer outro comensal) torna-se um macarrônico amontoado de quarks, átomos, moléculas, partículas, ventrículos, sei lá.

ato contínuo, indaguei ao indigitado "futuro do Brasil" o que ele entendia por mangericão. ele disse-me desconhecer o significado (mas não o sabor, pelo que vim a constatar, instantes após, ao submetê-lo a um teste organoléptico) desta palavra grafada com "g", de gato, como em "políticos". ato contínuo, mostrei-lhe a efígie abaixo:
ele, menino de rua, remember?, não se deu por axado e disse que esta Google Image não era "mangericão" com "g" (de "gato" etc.), mas manjericão. a verdade é que vi-me em braços para achar algo (e não o fiz) com "mangericão" no Mr. Images. fui ao dicionário que, por puro acaso, saltara da janela de uma assembléia de políticos, que brigavam por um butim associado à construção de algumas pontes ("para ampliar as moradias para mendigos", diziam os favoráveis a reduzir de 10% para 9,75% a propina.

o dicionário disse que lugar de ladrão é na cadeia, logo todos os rapazes daquela reunião deveriam recolher-se ao xilindró. depois, outro dicionário disse que mangericão não tem não, e eu pensei que estão faltando dicionários nas pugnas políticas. um dia, voltarei a este assunto. seja como for, no "manjericão", li:

1.Bot. Designação comum ao manjericão-cheiroso e ao manjericão-dos-jardins.

e fiquei ainda mais convencido de que aquele dicionário comprado aos borbotões pelos políticos a um amigo que estava-se iniciando na indústria gráfica, estava malhado. descontente com os rumos da política brasileira, procurei no Google Images a palavra "alfavaca". e achei:
e, no aurelião, encontrei:

1.Bot. Planta herbácea labiada (Ocimum basilicum), de folhas opostas, pecioladas, ovaladas, verdes-escuras, e flores brancas, róseas, ou purpúreas, espiciformes ou racemosas. [Var.: alfábega, alfádega, alfádiga, alfavega, alfávega. Sin.: (bras.) quioiô]

pensei na pobreza mental de certos dicionários, como é o caso do citado. e na assimetria que existe, naquele caso, entre a alfavaca e o manjericão. para não falar que beringela pode também ser escrito como berinjela, mas não nas páginas lá dela. refeito destes dois revezes, fui à Wikipedia, o que me levou a repensar sobre o assunto, quando voltar para casa e puder ler o aurelinho (o Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa). e lembrei que, como "mangericão", também "larangeira" deixa-se regisrar apenas como nome ou apelido. no caso de "larangeira", ocorre-me o nome de Elsa Larangeira, se bem lembro, uma cientista social. e, no caso do tempero, ouvi falar de Ana Mangericão, uma bailarina de escol.

em resumo, todo menino de rua devia ser encaçapado numa escola, todo político é ladrão etc., toda bailarina devia dançar para mim e todos os dicionários deveriam ser constituídos apenas pela palavra "paz".
DdAB

02 março, 2010

Clube das Fadas

querido blog:
a fotografia é a mãe da magia. não sei se sempre gostei de fotos, o que deixou de ser questão assim que li "A Câmara Clara", de Roland Barthes há 25 anos (ou mais...). acabo de ler um livro para "ragazzi", comprado como presente gêmeo a EdSM, a quem fiz um apelo dramático pela leitura na dedicatória. olhar fotos é um desafio intelectual poderoso. dizem que os mais rematados imbecis olham apenas para a fisionomia do fotografado, como se lhe fosse capturar a alma com uma simples mirada.

na imagem, parece que vemos mulheres de Bangladesh, não é foto. quantos anos de evolução foram necessários para a criação do olho humano? quantos anos de evolução humana foram necessários para "copiar" a natureza por meio do binômio mão-cérebro (e no caso o primo da mão e do cérebro, nomeadamente, o olho). quantos anos mais foram necessários para que o homem pudesse aprisionar o som que ele e os demais habitantes da natureza emite?

há quem diga que nada há de moderno desde a fotografia, acho-os uns pessimistas, pois hoje vemos verdadeiros milagres revelados sem câmara obscura. hoje também parece irrelevante sabermos o que acontecia na câmara obscura, não mais do que o que acontece quando entramos numa mina de carvão de 1.250m de profundidade, sem iluminação.

lá no centro da terra, ou sua fração correlata (raio da terra = 49.000/(2 x pi) = 7.000, logo estamos falando de 1.250/7.000, um arranhaozinho no calorão...), podemos ficar a sós conosco, mas o bom mesmo é projetarmo-nos para o futuro, quando viveremos por décadas e até milênios enfurnados em nossas naves, transitando por entre galáxias, sem maiores contatos humanos. ou ainda, com pequenas comunidades. um troço assim.
DdAB

01 março, 2010

Imperador Duilio

querido blog:
vou contar algo que me aconteceu há dois dias na concorrida cidade de Roma. antes, explico o título da postagem de hoje. procurei "imperador duilio" no Google Images. nada veio. aí separei: imperador + duilio. e veio-me, de aproveitável, esta imagem de Toshiro Mifune, meu grande sósia japonês, de quem vi tantos filmes e tão maravilhosos.

cinema? life is but a dream, isn't it? por que busquei "imperador duilio"? porque um motorista de táxi disse que Roma teve cinco grandes imperadores, cujos nomes agora me fogem... não sei por que razão, ele tratou de deixar claro que "Duilio" não se encontrava entre eles. nem entre os imperadores. eu mesmo sempre soube (aprendi num dos livros infantis de Monteiro Lobato, se é que o fiz) que Duilio foi o general que comandou o exército romano na Primeira Guerra Púnica.

mas a conversa em italiano não prosperava, o que me leva a pensar que ele não terá dito o que agora direi como sendo dele. talvez seja, a conversa não prosperava excessivamente, uma espécie de definição de vida:

boa vida não é fazer o que a gente quer,
mas valorizar o que a gente faz

DdAB