Diz o jornal Zero Hora de hoje a sua página 2 que "[u]m grupo de pediatras gaúchos está se mobilizando na defesa da reabertura imediata das escolas." Garrei de pensar que esses pediatras devem ser imbecis por não entenderem que é melhor ser louco que ser morto. Quero dizer: volta às aulas deverá desencadear uma enorme demanda por enterros, pois a criança convive com outra criança que convive com um adulto que convive com outro adulto, cada um deles podendo portar nuvens de vírus covid-19.
Mas, diria Shakespeare, bem atijolada, qualquer ideia nova debaixo do sol pode dar o que falar. Então, investi-me de coragem e li mais um trechinho:
... o afastamento do convívio com outras crianças pelo período prolongado de mais de um ano ocasionou um aumento de doenças psiquiátricas especialmente para aquelas que já apresentavam predisposição, assim como um impacto negativo no desenvolvimento biopsicossocial, atrasos de marcos do desenvolvimento nos menores de dois anos, como a fala e a comunicação não-verbal, obesidade e puberdade precoce nas crianças em idade escolar, déficit de cognição e aprendizado, e distúrbios do sono, que deixa toda classe pediátrica com grande preocupação.
Dei uma editadinha aqui e ali no texto dos pediatras, mas não é exagero dizer o afamado sic, que mesmo sem uma ou duas vírgulas sinalizando entradas paralelas, dá para entender. Ademais, pela primeira vez, li o termo "biopsicossocial" que sempre ouvi associado às imbecilidades de certos profissionais da educação e da saúde. Pelo menos faltou o "ambiental", não é mesmo? O final é irrelevante, para os fins a que me proponho enfatizar. Mas repito o que quero destacar:
"[...] ocasionou um aumento de doenças psiquiátricas especialmente para aquelas que já apresentavam predisposição [...]"
Ao ler isto no texto divulgado pelo jornal, evoquei uma das pérolas que eu esculpia (?) em aula quando ensinava a teoria elementar do preço. Lá criei um problema de solução com matemática do ensino fundamental em que a turma era desafiada a ficar jogando aquelas curvas de oferta e procura pra tudo que é lado. Culminava propondo a legalização da maconha e simultâneo estabelecimento de um imposto sobre a mardita, dado um mercado do qual essas curvas eram conhecidas. Resultado: depois da legalização e do imposto, o preço subia e a quantidade demandada caía.
Pelo indisfarçável moralismo gritado por minhas curvas de oferta e procura, quando se via a queda na quantidade resultante da nova política, eu dizia "adoro drogas" (e até antes disso, para ativar o apetite da turma para o estudo da microeconomia). Claro que adoro drogas no sentido moralista. E adoro a imbecilidade daqueles que dizem que a maconha é a porta das drogas mais pesadas.
E adorei os pediatras, em outro contexto, dizerem aquele "aumento de doenças psiquiátricas especialmente para aquelas que já apresentavam predisposição." E não é isto o que acontece com aquelas crianças que tinham predisposição para a doença mental e foram à maconha encontrar conforto para suas mazelas espirituais? E não foi precisamente o mercado ilegal de drogas que fez com que a repressão familiar e a sagacidade dos traficantes convidassem os pobres infantes a imergir nesse mundo tão ou mais letal para jovens que a pandemia que hoje nos acossa?
Um tanto platonicamente, meu texto acaba com uma série de perguntas.
DdAB
2 comentários:
Não sou do ramo e não sei qual a solução, não sei qual a melhor escolha, mas em termos de aprendizado, a atual situação do ensino é uma tragédia que vai se refletir por anos a fio.
Grato pelo comentário Antonio. [Antonio Augusto?]
A atual proscrição do comércio regular de drogas afetou todas as dimensões da vida nacional, iniciando pelo sistema judiciário e chegando à escola. Praticamente, em Porto Alegre, todas as escolas têm traficantes posicionados do lado de fora da escola e garantindo a oferta de todas as drogas, inclusive a maconha adicionada de drogas realmente perigosas.
DdAB
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