17 agosto, 2020

Palocci e o Fim-da-Picada

Parte da delação de Palocci está inserida nos autos de ação penal da Operação Lava Jato

Durante o fim-de-semana, vi aqui e ali denúncias de Antônio Palocci. Quero dizer, não a 'caguetagem' que Palocci praticou contra Lula, a delação premiada no processo da Operação Lava-Jato curitibana. Como lembramos, Palocci 'caguetou' Lula, falando em recebimento de propinas, e tudo mais.

Óbvio que, para tornar-se delator, ele estava se defrontando com acusações severas e queria reduzir suas penas. Pois o jornal Zero Hora -sempre ele, até quando?- na página 8 da edição eletrônica de hoje, tem reportagem de três colunas sobre a delação do esculápio das finanças pessoais.

Diz o jornal:

   No documento finalizado na última terça-feira e enviado ao ministério público federal, [o delegado Marcelo Feres] Daher apontou que as afirmações dadas pelo delator 'foram desmentidas por todas as testemunhas declarantes e por outros colaboradores da justiça' e 'parecem todas terem sido encontradas em pesquisas na internet, porquanto baseadas em dados públicos sem acréscimo de elementos de corroboração, a não ser notícias de jornais.'

Diz o Planeta 23: pouca gente no Planeta Terra gosta de alcaguetes, mas considero esta delação de Palocci uma das mais mesquinhas da história da Operação Lava-Jato. E desse triste episódio de longa duração, tirei três lições e confirmei outra que já aprendera:

a) a Lava-Jato curitibana, destacando a dupla denunciada pelo jornal The Intercept Brasil, nomeadamente, Deltan Dalanhol e Sérgio Moro, tinha mesmo, agora se comprova factualmente, um viés persecutório contra Lula. O ex-presidente foi parar na cadeia, contrastando com os atos de vilania desses dois funcionários federais. Entristece-me saber que esses criminosos nunca verão a justiça penalizando-os pelas injustiças praticadas.

b) depois de ver-se preso e com limitadas chances de inscrever-se como candidato à presidência da república na eleição de 2018, Lula e a direção do PT não foram capazes de fazer um exercício de teoria dos jogos elementar: a indução reversa. Já falei nisto aqui neste Planeta: imaginemos a situação em que Lula está tomando posse no cargo de presidente. Semanas antes, ele teria que ver sua vitória confirmada pelo tribunal eleitoral. Disso, em primeiro ou segundo turno, ele deveria ter conquistado a maior parte dos votos válidos. E antes dessa estrondosa vitória das urnas, ele deveria ter sido inscrito candidato numa chapa completa, ou seja, com presidente e vice-presidente. Pois Lula não fez nada disso, com a aquiescência do futuro (naquele pretérito) candidato a vice-presidente, o dr. Fernando Haddad. E de toda direção do PT, que nunca ouviu falar em teoria dos jogos, talvez por considerá-la um esbirro da direita. Nada dessas ações do protocolo eleitoral aconteceu. Lula inviabilizou a candidatura da coalizão PT-PCdoB. Mas, porém todavia entretanto, o pavor popular ao neo-liberalismo e à personalidade narcisista de Jair Bolsonaro estava assustando a turma que, provavelmente iria eleger Haddad-Manuela. 

c) neste preciso instante, na antevéspera (digo, oito dias antes) da realização do primeiro turno da eleição, Sérgio Moro agiu como um coronel-da-política, visando à vitória a qualquer custo. Tudo que podia incriminar Lula foi feito, inclusive aquela 'caguetagem' do esculápio. Acabo de olhar na internet o que o Google dá de retorno quando se digita "moro libera delação de palocci". As três entradas iniciais são:

https://brasil.elpais.com/brasil/2018/10/01/politica/1538428364_331167.html: Moro libera delação onde Palocci diz que Lula sabia de corrupção na Petrobras.

https://epoca.globo.com/sergio-moro-entra-na-campanha-eleitoral-ao-suspender-sigilo-de-parte-da-delacao-de-palocci-23126422: Sergio Moro entra na campanha eleitoral ao suspender sigilo de parte da delação de Palocci.

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/07/moro-achava-fraca-delacao-de-palocci-que-divulgou-as-vesperas-de-eleicao-sugerem-mensagens.shtml: Moro achava fraca delação de Palocci que divulgou às vésperas de eleição, sugerem mensagens.

d) mas falta-me o principal ponto, aquele me trouxe a postar sobre o fim-da-picada. O jornal cita o delegado que diz: "a não ser notícias de jornal". Ou seja, nada fora comprovado, Moro sabia, Haddad mal teve tempo de deixar-se conhecer como candidato a presidente da república. Os eleitores de baixa renda, digo, baixo rendimento mental, pularam no colo do oportunista Jair Bolsonaro. As notícias de jornal, hoje a polícia declara, eram reles notícias de jornal, sem comprovação de qualquer tipo.

Quanto a este item (d), que posso dizer? Alguém da comunidade ou do estado deveria punir os tais jornais que "repercutiram" notícias originárias de fontes não-idôneas. Cadeia para eles. E também para Lula que, de dentro da cadeia, não foi capaz de contar com um assessor (inclusive o economista Haddad) para dizer-lhe que preso não pode candidatar-se a cargos eletivos. E que, dado o ódio que -como dizem- a zelite nutria por Lula, inclusive a ministra Rosa Weber do STJ, tava na cara que ele não seria libertado para concorrer à eleição. Nem mesmo para participar, nas ruas, nos comícios, da bissexta campanha de Haddad.

Moraleja: no país da impunidade, juiz ladrão vai muito além do futebol. 

DdAB

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