15 outubro, 2019

Preocupações Generalizadas: Olga Paulo e eu


Testemunhei (e até participei) uma troca de ideias muito criativa entre Olga Veiga e Paulo Baptista no Facebook, a partir de uma postagem da primeira. Fiquei particularmente tocado ao ver a matéria da Carta Capital (que não li, pois a revista não foi capaz de me prender como assinante) em que a turma do Capital dos Carta prenuncia a queda de Bolsonaro. Já falei aqui no blog ter recebido uma enorme lição de democracia do prof. Eugênio Cánepa ao falar que a maior motivação para o golpe militar de 1964 foi o medo que Leonel Brizola fosse alçado à presidência da república. Cánepa voltou a exibir  sua proverbial sensatez: se a ordem democrática for mantida, e se efetivamente Brizola fosse eleito, ele teria seus quatro anos de presidente da república e então se retiraria, pois nem se falava em reeleição, como a que ungiu Fernando Henrique a seu segundo mandato. O país veria novas eleições sem quebrar a ordem institucional. O preço pago naquela vintena de anos de repressão jamais poderá ser avaliado. Da mesma forma, felizmente, portador de menos violência, o impeachment da presidenta Dilma voltou a jogar o país nas barras da quebra institucional. E até hoje estamos pagando, agora com Jair Bolsonaro aterrorizando as pessoas de boa vontade com sandices e um programa promotor de ainda maior desigualdade no Brasil. Dito isto, vamos ao Facebook:

OLGA VEIGA:
E [a pergunta] que não quer calar..."Volta a pergunta: o que explica que Bolsonaro aí fique, apesar de tudo? Se não é por apreço à estabilidade institucional, se, em seu caso, a 'legitimidade das urnas' é amplamente questionável, se exprime um sentimento minoritário e se, além disso, é um presidente de péssima qualidade, por que permanece no cargo?"

PAULO BAPTISTA:
O que explica Bolsonaro no poder é a mediocridade da oposição a ele se organizar manifestada nas eleições...

DdAB (entrei na conversa):
Estão pensando em impeachment? Sou contra! Sobre a legitimidade das eleições, lembro que o voto obrigatório corrompeu e corromperá todos os processos eleitorais neste país. Mesmo porque imagino que, se Lula tivesse sido o candidato do PT (com rala frente de esquerda apoiando-o), não é impossível que seu coeficiente de rejeição durante todas as pesquisas eleitorais o tivessem condenado à derrota.

Obviamente não apoio o Sérgio Moro, algoz da democracia e do direito no Brasil.


OLGA:
Não, tbm sou contra. O custo é muito alto e quem paga é o povo. O que me espanta é o apoio, o voto. Acho que eles (oposição/eleitores) não entenderam que pior que perder uma eleição é perder a democracia. É 'como as democracias morrem'.... Faltou percepção.

PAULO BAPTISTA:
Olga, esta percepção faltou não foi por parte do eleitor, foi por parte de quem estava em condições de encaminhar o processo de forma a não se correr o risco que se antevia. O que ocorreu, conforme dito por alguns (talvez possam identificar) foi a chamada 'dança à beira do abismo'. Os líderes que são seguidos cegamente frequentemente levam a isto.

OLGA:
Desse ponto de vista, concordo que foi essa 'dança a beira do abismo' que levou à cegueira aqueles que seriam os 'guardiões da democracia' e, que ao serem confrontados com extremistas e demagogos deveriam fazer um esforço orquestrado para derrotá-los.
Por outro lado, também cabe aos eleitores estarem atentos aos sinais de alerta que podem ajudar a reconhecer um autoritário que poderá colocar a democracia em risco (do livro “Como as democracias morrem”)...lendo hehehe:
1) Rejeitam, em palavras ou ações, as regras democráticas do jogo;
2) Negam a legitimidade de oponentes;
3) Toleram ou encorajam a violência;
4) Dão indicações de disposição para restringir liberdades civis de oponentes, inclusive a mídia.
Coincidência....


PAULO BAPTISTA:
Olga, talvez seja exigir muito dos eleitores. As lideranças estão muito empenhadas em demarcar cada qual o seu espaço de poder, espaço que devem dividir com os seguidores. Se for necessário levam ao extremo a disputa para não cederem nem um pouco desse espaço. E não faltam seguidores que os impulsionem a agir assim. Neste momento a política se torna uma paixão. Campo fértil para os que sobem aos palanques para discursos inflamados. Exemplos como o de Mujica e Mandela que , embora extremamente populares, reconhecem o momento de deixar o processo avançar sem eles, são poucos. Para isto é necessário humildade e um sentido da história que está muito escasso.

OLGA VEIGA:
Pois é, tudo é um risco, se os eleitores fossem engajados com valores democráticos, a democracia estaria salva? Não, a história já mostrou que não. Ao contrário, também não saberíamos o que viria pela frente. Por isso é que eles devem estar atentos. Não creio que seria 'exigir muito'.
Quanto a essas lideranças empenhadas em demarcar espaços e levar o poder ao extremo, aí que é que mora o perigo e, é aí que entram os eleitores, que devem avaliar os riscos para “impor limites” e não 'impulsionar' os tiranos.
Agora, comparativamente, Mujica e Mandela tiveram um processo de saída naturalmente, se é que entendi tua colocação. Mas, considerando as circunstâncias, aqui no caso, nossas lideranças deveriam ter, além de humildade, sabedoria de que o país está à frente do partido e que é de vital importância colocar seus interesses partidários de lado quando a democracia está em risco.


PAULO BAPTISTA:
Mujica e Mandela abriram mão de manter candidaturas de reeleição. Em nenhum momento parecem ter nutrido a expectativa de se tornarem estrelas mundiais da política. Mujica está, no entanto, bem presente e atuante na política conforme se pode constatar em intervenção recente em evento na Argentina. Argentina na qual, aliás, de forma inteligente a oposição evitou de acirrar o radicalismo e candidatar Cristina Kirchner. Tudo indica , no entanto, que ganha a eleição. Acredito que talvez Cristina possa não ter gostado mas, pelo menos, entendeu que era necessário sair da linha de frente. https://ametadesul.blogspot.com/.../ustedes-son...

OLGA VEIGA:
Sim, Mandela já era uma estrela e saiu por questões de saúde. Mujica não tinha mais o apoio do povo, agiram certo na hora certa. Aqui alguns poderiam ter feito o mesmo e Bolsonaro não teria sido eleito.

OLGA VEIGA (novamente):
Sim, Mandela já era uma estrela e saiu por questões de saúde. Mujica não tinha mais o apoio do povo, agiram certo na hora certa. Aqui alguns poderiam ter feito o mesmo e Bolsonaro não teria sido eleito.

PAULO BAPTISTA
Segundo o Ciro o que tem?

OLGA VEIGA:
o resultado das eleições não seria alterado.

A conversa acabou por aí. E eu fiquei pensando mais ardentemente ainda na lição dada pela Argentina com a legislação eleitoral que permite/induz a uma prévia entre todos os candidatos no primeiro turno, levando apenas os dois mais votados ao segundo. Lá a esquerda ingressou unida e dizem os estudiosos do tema que sua eleição ainda este mês é super provável.

Aqui, a "sabedoria da natureza" nos dá uma chance, um ensaio geral: as eleições municipais de 2020. Imagino que uma linha de argumentação deveria ser:
.a que é esquerda
.b quem são os partidos de esquerda
.c não fazer alianças com partidos da não-esquerda.

Dos 5 mil municípios do país não serei capaz de indicar candidatos a prefeitos e vereadores para todos. Mas do Brasil tenho meu candidato que deve quebrar a cabeça para escolher (se é que não o fez) um partido de esquerda para ingressar e concorrer à presidência: Renato Janine Ribeiro.

DdAB

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