Querido diário:
Acabaram-se as férias. Também pudera, 20 horas de hotel é para cansar qualquer 1. De volta a Porto Alegre, banho, malas, aquelas coisas, dormir, acordar e defrontar-me sobre o capacho do apartamento com um exemplar dela, a Zero Hora, Zero Herra e Zero Burra. É muito jornal para um ex-turista.
Por condicionantes neurológicas (ou coisa pior), recolho-a da prateleira mais adequada (o capacho, hahaha) e abro-a, vejo as manchetes da capa, normalmente o principal para este nanico dos gaúchos é o futebol. Fala-se numa decisão na América. Pensei: "América, USA?" Não era, era o Geromel, jogador do Grêmio, incumbido da "missão de parar o time campeão da Sul-Americana". A Sul-Americana não é, por supuesto, uma estrada de ferro ligando Ushuaia a El Paso, nada disto. Pelo contexto presumo tratar-se de futebol.
Na parte da Política e Diversão, ainda na capa lemos "AINDA SEM SOLUÇÃO. Malas de Geddel podem ter ligação com desvios na Caixa. Créditos de R$ 5,8 bilhões para empresas como JBS estariam na origem dos R$ 51 milhões achados em apartamento do político." Pensei: "Divirto-me (e sofro ainda mais) ao lembrar dos amigos e parentes que saudaram a indignação de Aécio Neves com os resultados da eleição do final de 2014, que o afastaram do cargo a que considerava estar celestialmente aquinhoado: a presidência da república. E que culminaram com o impeachment e as gravações comprometedoras". E continuaram saudando, durante algum tempo, talvez por estupefação com a turma dos "malfeitos" denunciados pela presidenta Dilma, assim que recebeu o cargo do presidente Luis Inácio Lula da Silva em 2010. Até que nem sei bem o que dizem hoje, parece-me não ver nenhuma saída decente: um mea culpa, uma declaração de burrice, uma declaração de patriotismo e confissão de ingenuidade ao acreditar em contos da Carochinha em plena posse de sua maioridade penal.
Pois tem mais assuntos na capa que não vou comentar, mas ainda faltam dois. O primeiro fala no Rio Grande do Sul, além do Geromel. Agora lemos: "Piratini conta com extinção de fundações até metade de abril. Governo quer encerrar atividades de oito instituições como parte de seu plano de redução de despesas. Servidores amparados por liminar reivindicam estabilidade e seguem trabalhando em outras funções." Claro que já dá pra ver que é uma mensagem abobada, aburrada, pois o pessoal da FEE, de quem mais entendo, está trabalhando nas mesmíssimas funções: fazer o número falar sobre a sociedade gaúcha. Que pensei? "Esses caras só podem estar exercitando mesmo é uma vingança pessoal. Ou atendendo a interesses pecuniários que lhes foram evidenciados por criteriosas análises de custo-benefício sobre o enriquecimento patrimonial do estado gaúcho e de seus -atrevo-me a acrescentar- mais diletos servidores, o trio Carlos Búrigo, Cleber Benvegnú e Márcio Biolchi, com suas polpudas pecúnias de funções gratificadas ou cargos comissionados."
Lembra? Estava recolhendo o jornal do capacho, também seguindo hábito milenar, passei a olhar a quarta-capa. Nem sempre vou ao dropszinho
A única certeza do brasileiro é o Carnaval no próximo ano."
Graciliano Ramos, escritor brasileiro (1892-1953).
SOUZA, Jessé (2015) A tolice da inteligência brasileira; ou como o país se deixa manipular pela elite. São Paulo: LeYa.
E tirei uma conclusão que nem precisava ter lido: ele -Jessé- diz que a tolice é pensar o Brasil de tudo que é jeito, de cima pra baixo, de baixo pra cima de um lado pro outro, do outro para um terceiro, da justiça ao crime com qualquer tipo de categorização que não a desigualdade. A bronca por aqui é dois terços mais desigual que os cândidos países exportadores de produtos primários, nomeadamente, a Austrália e o Canadá, países -como sabemos- de grande extensão territorial. Países, como sabemos, com terras comprometidas para o uso agrícola pela presença de muito gelo ou muita areia. Mas até de areia, nóis pode falar comhttp://turismo.guiamais.com.br/cidades/porto-alegrehttp://turismo.guiamais.com.br/cidades/porto-alegre exação, pois também temo nossos deserto no Alegrete, né, sô?
Ok, ok. Dei mais umas olhada na quarta capa e destacou-se: "CAROLINA BAHIA. O governo Micher Temer volta do Carnaval com a imagem ainda mais desgastada. Página 21." Claro que marquei na paleta. Parece-me que a Carolina faz parte daquela troupe que achava que, com o impeachment da presidenta Dila a linha sucessória apontava para o Papa Francisco.
Segui altaneiro. Página 2, Túlio MIlman, um senhor que às vezes diverte-me, às vezes incomoda e que não hesito em classificar como intrinsecamente reacionário, até no inconsciente: tá aqui uma propaganda subliminar, de seus sonhos a sua digitação: "CAINDO DE MADURO. Uma investigação séria e profunda no mundo dos livros escolares no Brasil seria um serviço à nação." Maduro? O rapaz é contra o bolivarianismo, por razões de direita, digo eu, que sou crítico feroz, olhando o espetáculo pela esquerda. Em minha opinião, o Brasil precisa de investigações sérias e profundas em tantas dimensões da vida comunitária que nem sei bem onde começar. Atrevo-me a propor o fechamento dos estados, assembleias, senado e poder judiciário. E fazer esta investigação já aos cuidados da empresa júnior vinculada a alguma universidade europeia, que tomaria como medida inicial (logo, seria a minha segunda) a implantação da renda básica, evitando o roubo.
E o resto do Túlio da página 2? Em outro box, ele diz: "TROLAGEM. A máquina de destruição de reputações montada no Brasil acaba afastando potenciais bons candidatos da política." Precisa comentar? Luciano Hulk, Pelé, Sílvio Santos, Amarildo (que jogou 1962 no Chile), Zagalo? E não seria função da imprensa precisamente investigar a vida social de neguinhos como os que citei, mais Bolsonaro, e por aí vai?
Pois bem, aí pulei para a página 10, ou melhor, fui lendo e achando tudo muito como direi... Na página 10, tem o que pode ser uma boa notícia ou péssima, vai saber. Fala-se em "NOTÍCIAS. ECONOMIA. Após quatro anos, vendas de carros mais baratos voltam a aumentar." Tomara. E pulei para a página 12. Aí a baixaria segue muito além de Zero Herra. Fala-se do gol-a-gol do supremo tribunal em matéria de questões controversas. Agora estamos vendo o auê dessa corte com aquela decisão de 2016 que me pareceu puro casuísmo: condenado em segunda instância não pode concorrer a eleições e pode ir para a cadeia. Era ou http://turismo.guiamais.com.br/cidades/porto-alegrenão era destinada a meter Lula no xilindró? E agora? Há, segundo o jornal, cinco ministros que consideram oportuno manter o casuísmo, pois chegou a hora H: meter Lula na cadeia. São eles: Alexandre Moraes, Carmem Lúcia, Edson Fachin, Luis Roberto Barroso e Luiz Fux. Votam com compreensão contrária: Celso de Mello, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski. Deu 5x5. Falta o voto de "ditadora esclarecida" de que nos fala Kenneth Arrow para a sra. Rosa Weber. A boa notícia para a candidatura de Lula é que, lá naquele 2016, ela votou contra esse negócio de condenar sem ter passado em julgado a última possibilidade de defesa do réu. Diz o jornal, e o Planeta 23 tá com ele, a Zero Hora, que ela tem dado sinais de que vai mudar de opinião. Ou seja, casuísmo dentro do casuísmo.
Na página 16, não sei se me alegro ou choro de tristeza pela bola fora do repórter interino da seção Campo Aberto. Eis a manchete principal: "ONDE FAZ SECA, CHUVA VAI SER ESCASSA". Pensei: "e, provavelmente, onde faz chuva a seca é que se faz escassa." Parei por aí. Mas fui dar uma olhada, claro, no restante do jornal e deparei-me com a coluna a que já referi, mas agora li, de Carolina Bahia. Vou citar apenas um trechinho responsável pela queda de todos os butiás que eu armazenava nos bolsos: "Aliados do presidente ainda sustentam que,http://turismo.guiamais.com.br/cidades/porto-alegrehttp://turismo.guiamais.com.br/cidades/porto-alegre se a economia reagir até abril, Temer poderá se candidatar à Presidência da República." Pensei, dispensei, tornei a pensar e caí na gargalhada.
Depois, na página 36, lemos a PIADA DO DIA: Por que o decorador foi ao médico? Para resolver um problema 'de coração'!
DdAB
A imagem saiu daqui. É Porto Alegre, é nóis.
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