21 setembro, 2016
Pulverização da Esquerda
Querido diário:
Como sabemos, Carta Capital -que às vezes designo, com afeto, de Capita dos Carta- circula desde sábado, mas tem a data de capa da quarta-feira. A de hoje é n. 919 e tem algo na página 42:
"Associo a universalização da terceirização ao processo de uberização da força de trabalho no Brasil. A ideia do serviço de táxi desregulamentado do Uber é inviabilizar impostos e tributos."
Gelei, degelei, tornei a gelar. Era uma entrevista com Márcio Pochmann, iniciada na página 41. É que ando preocupado em encontrar um denominador comum de pontos programáticos que permitam pensarmos em uma aliança entre as esquerdas para concorrerem a cargos públicos com uma coalizão, uma frente de partidos de esquerda.
Como balão de ensaio, lancei um quarteto:
.a. luta pela implantação do governo mundial,
.b. voto facultativo,
.c. voto distrital e
.d. parlamentarismo.
Já ouvi até dizerem que este programa caracteriza (-me) como coxinha. Logo eu, que nunca usei esta expressão e nem pensei que poderia ser objeto da ira de algum comentarista contrariado por meio dela.
Nem falei em outras obviedades, como voto universal e proibição de financiamento empresarial para atividade política. E haverá outras que nem chego a sugerir serem atributos exclusivos da esquerda e que tampouco representam mais que clamores por uma política decente, o que não há no Brasil, pelo menos desde o tempo em que posso testemunhar.
Então, Márcio Pochmann é -se bem julgo- gaúcho, formado em economia bem no ano em que comecei a lecionar microeconomia na UFRGS (e não foi, talvez por isso mesmo, meu aluno). Mal graduou-se, foi estudar na Unicamp. tornando-se mestre e doutor. É figura pública para os economistas em geral, foi presidente do IPEA, e figura pública em Campinas, onde foi candidato a prefeito.
E o que me chamou a atenção é que Marcos Pochmann acha anormal que o Uber se recuse a pagar impostos, acha normal -se bem entendo- que todo mundo que desenvolve alguma atividade produtiva deve pagar impostos.
E aí voltei a pensar: será que toda a esquerda sabe que os impostos -como o que o Uber deveria pagar- são regressivos e desprezam o princípio da capacidade de pagar? Se não sabe, talvez um bom curso de teoria da escolha pública possa ajudá-lo a "clarear as ideia", como diz o gauchês. E será que a esquerda poderá pensar seriamente em uma aliança, dada a existência de visões tão díspares sobre o tipo de tributação mais adequado à promoção do desenvolvimento econômico e a redução da desigualdade? Será que ela sabe que todos -mesmo os incidentes sobre os bens de demérito, como o cigarro- os impostos indiretos são distorcivos sobre o sistema de preços? Será que ela sabe? Será que ela pensa? Perguntas retóricas, eis que tenho a esperança de que uma boa parte da esquerda, aquela na qual me insiro, tenha mais clareza sobre o que nos enfraquece e o que (inclusive nossas prédicas) fortalece nosso inimigo.
DdAB
Imagem: um pulverizador voltado para a esquerda.
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4 comentários:
Prezado Duílio, o Marcus não conhece o Márcio, esse último, não conhece teoria da escolha pública que também não conhece jogos cooperativos, nessa quadrilha, como aquela do Ulisses que tanto nos intriga, todos perdemos, o nós, o vós e todos os eles. Grande abraço, s.
ps refiro-me ao Ulisses na versão Bernardina, p. 367.
Beleza de visita, amado filósofo.
Página 367 lida. "O romance é uma máquina de gerar interpretações", disse Umberto Eco. E aqui entendo que Homero e Joyce são contrários aos impostos distorcivos sobre a produção, inclusive aqueles incidentes sobre as bebidas alcoólicas destinadas a "hombres y perros", agora citando J. L. Borges.
Bom fim-de-semana.
DdAB
Acabei de colocar nova diatribe em meu mural lá no Facebook contra a candidata Luciana Genro, cargo de prefeita de Porto Alegre, no ponto específico de achar que o Uber deve pagar "impostos". Acho que não deveria pagar imposto algum. Seja como for, voltei aos argumentos que desenvolvi acima e apenas então é que entendi que o sábio filosofo Anaximandros percebeu que -sem desrespeito- troquei "eine mal" o nome de Márcio por Marcos. Lamento.
DdAB
Acabei de colocar nova diatribe em meu mural lá no Facebook contra a candidata Luciana Genro, cargo de prefeita de Porto Alegre, no ponto específico de achar que o Uber deve pagar "impostos". Acho que não deveria pagar imposto algum. Seja como for, voltei aos argumentos que desenvolvi acima e apenas então é que entendi que o sábio filosofo Anaximandros percebeu que -sem desrespeito- troquei "eine mal" o nome de Márcio por Marcos. Lamento.
DdAB
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