24 agosto, 2019

Ulysses: o caso de Haines, Hynes e Haynes.

Como sabemos, declaro-me especialista na primeira sentença do "Ulysses", de James Joyce: "Sobranceiro, fornido, Buck Mulligan postou-se no alto da escada, portando uma tigela de barba em que encontravam-se, entrecruzados, um espelho e uma navalha". Estamos vendo uma citação imperfeita da tradução de Antônio Houaiss [ver o verbatim dele no rodapé]. E ela própria imperfeitinha, pois aquele "fornido" entre vírgulas devia dar lugar a "o fornido Buck Mulligan". Houaiss pisou na bola!

Mas acho que todo mundo que se mete a mexer com a primeira sentença do "Ulysses" (meu caso, claro) está condenado a, mais cedo ou mais tarde, também cometer erros. Nunca publiquei, creio, mas acho que andei fazendo confusão com os nomes de Haines, Haynes e Hynes, que parece que aparecem (...) no livro. Tenho três arquivos em formato PDF ou assemelhado. Vejamos o que pesco ao "localizar" cada um desses nomes.

Não tendo o PDF da edição Penguin-inglesa, atenho-me à edição Gabler-em-inglês do Projeto Gutemberg. Vejamos

Haines: citado 66 vezes
Haynes: não tem
Hynes: citado 35 vezes

Segundo arquivo: tradução para o espanhol de J. Salas Subirat

Haines: citado 69 vezes, ou muito me engano
Haynes: tem uma vez no parágrafo que já vou transcrever
Hynes: citado 33 vezes, ou muito me engano.

Agora vai a transcrição:

BLOOM.
—Eso quise decir, Leopardstown. Y Mariquita ganó siete chelines con un caballo de tres años llamado Nolodigas y volviendo a casa de Foxrock, en ese viejo carricoche de cinco asientos; tú estabas en tu apogeo entonces, y tenías puesto ese sombrero blanco con un ribete de piel de topo que la señora Haynes te aconsejó comprar porque estaba rebajado a diecinueve chelines once, un pedacito de alambre y un trapo viejo de pana, y te apuesto lo que quieras a que lo hizo a propósito.

Terceiro arquivo: tradução para o italiano por Gianni Celati

Haines: citado 59 vezes
Haynes: não tem
Hynes: citado 34 vezes

Aqui já comentei o livro que segue:

JOYCE, James (2014) Ulisses. Lisboa: Relógio D'Água. Tradução de Jorge Vaz de Carvalho.

Vemos na página 10:
"Quanto tempo vai ficar Haines nesta torre?".
Na página 24, vem o pobrema:
"Pararam, enquanto Haynes examinava a torre e dizia por fim: [...]"

Ou seja, o tradutor de Portugal encaçapou um "Haynes" onde ninguém respondia por esse nome. E faz solitária companhia ao velho Salas-Subirat.

Que mais posso dizer neste sábado?

DdAB
P.S. Aqui vemos o Houaiss citado literalmente: "Sobranceiro, fornido, Buck Mulligan vinha do alto da escada, com um vaso de barbear, sobre o qual se cruzavam um espelho e uma navalha."
P.S.S. Mas olha esta que achei ao procurar a imagem na Amazon que nos encima. Tá aí um outro Haynes:
 Narrator Tadhg Hynes: "I first decided to record Ulysses in October 2015. Little did I know then what an unforgettable 18 months lay ahead. Having already recorded Dubliners and Portrait (and being terrified of Ulysses), I decided to give myself a year just to read it. However, after about four episodes I started recording it and became hooked.
P.S.S.S. Respondo a questão sobre o que mais posso dizer, depois de ter dito tudo o que disse. Entendo que as queimadas desta temporada na Amazônia Brasileira e a reação internacional ao amadorismo grosseiro do presidente da república vão provocar um turning point em seu comportamento. Ele passou a entender que precisa de contenção para reduzir danos. Como sabemos, "errare humanum est, mas persistir na burrice asinus est. Pedi ao Google tradutor para traduzir "persistir na burrice é coisa de burro" e ele disse: "stultorum est stultitia est, perseverare", que eu modificaria para
"stultorum perseverare stultitia est".

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