Querido diário:
Eu estava deixando passar sem comentários o assassinato de Marielle Franco, pois -descontada a questão familiar e de solidariedade humana que cerca todas as tragédias deste porte- não creio que haja qualquer tipo de lição a tirar. Já sabemos tudo e temos até duas correntes em boa medida antagônicas sobre as políticas públicas que devem ser implementadas para evitar a repetição da tragédia. Há uma peculiaridade no caso, contudo: foi a primeira agressão ao senso comum desde que Temer inventou a intervenção militar no Rio de Janeiro.
Embora eu próprio não tenha falado no tema, muito li a respeito. Felizmente, por razões também pessoais, pouco "frequentei" as redes sociais durantes estes últimos dias, de sorte que os atropelos ao bom-senso ficaram ao largo de mim. Hoje li em Zero Hora, página 15, o extraordinário artigo de Fábio Bernardi. Intitulando-se "Marielle, Luiz Octávio e todos nós", o autor, obviamente está falando do assassinato da vereadora carioca, mas também fala no cabo Luiz Octávio, morto no mesmo dia em que mataram Marielle, sendo o 26o. militar a cair neste ano. Neste contexto, diz Fábio: "Não importa se você está na esquerda ou na direita, estamos em guerra e estamos perdendo."
Tomei esta esquerda-direita para mote, pois o autor, além daquele 26 mortes, fala em outras cifras que deixam-me com os pés no chinelo, ou melhor fico sentindo que há coisa de pé-de-chinelo nessa polarização brasileira. Em minha linguagem vemos a polarização entre liberalizmo e social-democracia. Claro que nem todos os brasileiros -toscos e bizarros em sua maioria- assim veem. Por exemplo, alguém que aprecie as propostas que Jair Metralha faz para salvar o Brasil dessa guerra só pode ter falsa consciência, especialmente se estamos falando de alguém de pouca instrução e baixa pecúnia.
Cifras: Marielle elegeu-se vereadora.
Quase metade dos 46 mil votos de Marielle vieram de bairros nobres da zona sul carioca e da Barra da Tijuca. Ela fez 1.027 votos no Leblon e apenas 22 na Rocinha; 2.742 votos em Copacabana e só 50 no Complexo da Maré. Boa parte das favelas vota hoje nas bancadas evangélica ou da bala, as mesmas que a esquerda chama de fascista e de onde vêm aberrações do tipo 'quero ver defender direitos humanos agora' ou 'ela colheu o que plantou', que nascem do ódio político e da preguiça de ser cidadão."
Não falei tratar-se de um artigo extraordinário? Não falei que Fábio Bernardi é um cara extraordinário? Se bem entendo sua qualificação no artigo quinzenal ("diretor de criação"), ele é um cara da publicidade. É o tipo de gente que admiro, como um time de jornalistas e outros profissionais que lidam com os meios de comunicação com o fim de vender. Carros e jornais, etc.
Então pulei para minha conclusão: pé-de-chinelo não vota em defensores de políticas econômicas de cunho social-democrata. A falta de educação é de tal monta que, com razão, Fábio fala em gente que voltou a acenar com aquela sandice de quem defende bandido deve até agradecer por ser morto por eles. Senti-me tocado com a forma elegante como Fábio expressa essa vergonhosa grosseria. E fiquei fazendo minha auto-análise, redimindo-me: Eu defendo a ingesta, por exemplo, de quiabo e porco, mas não quero nem ser absorvido ou ingerido por um deles e nem, menos ainda, transformar-me num quiabo ou num porco.
DdAB
Peguei a imagem no Google aqui.
P.S. deixei para outro dia a definição de pé-de-chinelo, aliás condição que não comunaliza todos os portadores de chinelos, como é o fato da elegante dezena de dedinhos pintados na foto que nos encima.
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