06 junho, 2016

As Aposentadorias e o Uso Ideológico da Aritmética

Razão entre a População em Idade Ativa e a de 65 Anos de Idade ou Mais.

Querido diário:

Uns tempos atrás (aqui), fiz simulações sobre o futuro da população brasileira, ou melhor, dos velhos. Um país sem velhos não pode existir, pela simples razão de que os incentivos a que os jovens se tornem velhos são incontornáveis. Simetricamente, caso os jovens sejam ameaçados de desaparecimento físico ao chegarem à velhice, dificilmente devotar-se-ão a uma vida de trabalho e estudo: cai tudo na cachaça tão cedo quanto possível.

Segue-se logicamente que eu estava olhando o blog de Leonardo Monastério (aqui) e -olha daqui, olha dali- cheguei neste blog aqui, assinado por Mansueto Almeida. É que Mansueto assumiu um cargo no ministério da fazenda antes daqueles aumentos generalizados para os funcionários públicos e a criação dos 14 mil novos cargos. Ainda estou sem saber se Mansueto pediu demissão do novo emprego. Tudo isto é superinteressante, pois leva-me a pensar precisamente no oposto da lição ("moraleja", diriam os hermanos) intentada pelo autor lá do blog: o país tava falido, mas agora está ainda mais...

abcz
17 DE MAIO DE 2016 POR MANSUETO
A aritmética previdenciária: é difícil entender?

Dois gráficos mostram porque nós brasileiros precisamos nos preocupar com a previdência. Precisamos debater a questão de forma séria e desapaixonada. Uma das piores coisas que pode acontecer a um país é “demonizar” o debate, ou seja, as pessoas se recusarem a debater determinados temas.

As pessoas têm o direito de pensar diferente, propor soluções diferentes, etc. Mas vamos debater a questão previdenciária porque o processo de envelhecimento da população brasileira será muito rápido e, hoje, o Brasil já gasta com previdência (inclusive LOAS/BPC) mais de 12% do seu PIB.


Pensei: "Aritmética? Isto é comigo." Se hoje gasta-se 12% do PIB (ou seja, 12/100), se o PIB dobrar e a previdência estacionar (isto é, 12/200), esses 12% caem para 6%, não é mesmo? Lancei-me com maior arrojo a estas simulações científicas. Então, se aqueles 12 passarem a, digamos, 30, mas o PIB subir para 300, mesmo assim, não alcançamos aqueles temidos 12%. 

Olimpicamente, dei-me conta de que o problema da previdência é apenas manifestação do ódio dos privatistas contra os estatistas, um troço destes. E tem mais.

O gráfico pictórico lá de cima informa que hoje são necessários oito trabalhadores para sustentar um velho. E que, em 2040, quatro trabalhadores sustentarão um velho. Em outras palavras:

em 2015, oito trabalhadores sustentavam um aposentado
em 2040, quatro trabalhadores é que o sustentarão.

Também podemos pensar que aqueles mesmíssimos oito trabalhadores precisarão agora sustentar dois aposentados e não mais um.

Digamos que o PIB de 2015 seja de D$ 8, o que, considerando oito trabalhadores, evidencia uma produtividade do trabalho de D$ 1/trabalhador. E um PIB per capita de 8/12

Agora, se nesses 25 anos, a produtividade do trabalho dobrar, então teremos os mesmos D$ 8 de PIB sendo gerados por apenas quatro trabalhadores. E aqueles outros quatro trabalhadores gerarão mais D$ 8. Isto significa que o PIB será de D$ 16, para ser repartido entre 10 pessoas (oito trabalhadores mais dois aposentados).

Olha o quadro: em 2015 o PIB era D$ 8, com emprego de oito trabalhadores, produtividade do trabalho de D$ 1/trabalhador e renda per capita de D$ 0,89. Se a produtividade do trabalho crescer menos de 3% a.a. nesses 25 anos, os oito trabalhadores agora produzem D$ 16, a produtividade dobra e a renda per capita passa a D$ 1,6. This is arithmetics. This is entertainment.

Moral da história: ou dá um jeito de fazer a turma viver menos ou dá um jeito de fazer os capitalistas dobrarem a produtividade do trabalho em um quarto de século (não esquecendo que, na China, ela dobra em oito ou nove anos).

Mas tem mais moral para a história: essa macacada que considera que é o trabalhador que paga as aposentadorias acredita, de maneira ingênua, na teoria do valor trabalho. A maneira sofisticada de entender quem gera valor adicionado (ou seja, não estamos falando de "valor", mas de "valor adicionado") é apelar para a equação quantitativa da moeda
MV = PQ
e entender que quem gera o valor adicionado é basicamente a oferta monetária MV. Se emite muito, tem inflação, se emite pouco tem deflação. Se emite nos trinques, tem crescimento de Q com estabilidade de P.

DdAB
P.S. Tá aqui o segundo gráfico de que fala Mansueto:

P.S.S. Aqui não explorei o fato de que o custo de oportunidade do emprego de um velho é o emprego (talvez apenas uma fração própria) de um jovem. Troquei algumas ideias com amiga/o/s no Facebook e coloco aqui apenas um comentário meu: E tenho um complemento, um comentário que fiz no site de Marcelo De Oliveira Passos, tendo a ver com a contribuição de Eliane Sant'Ana (aqui editadinho):Quem está interessado no tema, especialmente a questão do velho deslocando empregos dos jovens, recomendo dar uma olhada no livro de microeconomia de Samuel Bowles (velhinho, mas que troca por dois mais jovens... e que tem em inglês, italiano e espanhol, estas duas últimas disponíveis na internet) a literatura sobre "Why firms don't sell jobs". No caso, imagino que um belo mercado ausente é o que permitiria ao jovem comprar o emprego do velho. Ou uma renda básica -como a que acaba de ser aprovada por apenas 1/4 dos suíços- para todos.

P.S.S.S.: coloco agora (0h48min de 11/jun/2016 todos os comentários) do Facebook:
Comentários
Ricardo Holz Infelizmente, nao tenho mais esperanca no INSS :'(
Ricardo Holz Nao para a minha hora da aposentadoria pelo menos
Duilio De Avila Berni Sabes, Ricardo, que sou defensor da renda básica universal. E, com ela, também se resolve boa parte do problema das aposentadorias. Neste caso, o mínimo com que poderias contar se Eduardo Suplicy fosse o presidente, seria esse valor. Serias ainda convidado a fazer algum segurinho, algum plano de previdência completamente dissociado da perspectiva de se deixarem os velhinhos morrerem de fome
Dejalme Andreoli Meu colega. Tudo isto é para sobrar dinheiro para aumentar os ganhos dos especuladores financeiros. Isto faz com que ós , economistas deveriamos ,atualizar os conteudos da teoria econômica que é ensinada em nossas faculdades.
Duilio De Avila Berni E o que me deixa doido, Dejalme, é que tem gente que fugiu daquela aula de divulgadores kantianos que diferencia proposições positivas das normativas. Parece óbvio que o carinha que citei no blog, ao dizer 
"Uma das piores coisas que pode acontecer a umpaís é 'demonizar' o debate [sobre o déficit da previdência], ou seja, as pessoas se recusarem a debater determinados temas." Eu acho que essa turma privatista não consegue entender que o velho esquema de financiar gastos previdenciários com "poupança" fracassou sem remissão há muitos anos. [Editei daqui para baixo:] Temos a elevação da idade média da população como virtude da modernidade:
.a. viver mais é bom, é utilitarista, mas é bom,
.b. o mundo moderno cria uma solução automática para a elevação da longevidade: a estrondosa diferença de produtividade entre a geração atual e a futura.
Duilio De Avila Berni E tenho um complemento, um comentário que fiz no site de Marcelo De Oliveira Passos, tendo a ver com a contribuição de Eliane Sant'Ana (aqui editadinho):
Quem está interessado no tema, especialmente a questão do velho deslocando empregos dos jovens, recomendo dar uma olhada no livro de microeconomia de Samuel Bowles (velhinho, mas que troca por dois mais jovens... e que tem em inglês, italiano e espanhol, estas duas últimas disponíveis na internet) a literatura sobre "Why firms don't sell jobs". No caso, imagino que um belo mercado ausente é o que permitiria ao jovem comprar o emprego do velho. Ou uma renda básica -como a que acaba de ser aprovada por apenas 1/4 dos suíços- para todos.
http://press.princeton.edu/titles/7610.html


Bowles, S.: Microeconomics: Behavior, Institutions, and Evolution. (eBook and…
Luiz Gustavo Ferreira Ramos Simplesmente perfeito... Acho que vou te procurar para apreender um pouco mais sobre isso... Importante visão para combater aqueles que pregam que a previdência está quebrada ou vai quebrar...
Ricardo Holz Acho q meus 3 anos de experiencia em previdencia privada nao valeram de nada mesmo...
Duilio De Avila Berni Gustavo e Ricardo: somos obrigados a refletir sobre isto. A maior longevidade do brasileiro deve ser saudada com alegria. E também devemos louvar a possibilidade de termos uma economia dinâmica cujos ganhos de produtividade permitam que a geração presente (lá do futuro) produza para si e para seus ascendentes (como tem orgulho de produzir para os descendentes).
Resumo: a morte dos velhinhos não deve ser vista como solução para o problema previdenciário, pois o aumento da produtividade garante maior nível de vida para todos.
Duilio De Avila Berni Quando os arautos do conservadorismo reclamam que o aumento da longevidade da turma criará problemas na previdência, eu fico pensando o que os impede de pensar em resolver os problemas:
.a. da educação, este sim respondendo pela possibilidade de elevar a produtividade ao longo das gerações e
.b. criar mecanismos distributivos da demanda final da economia, de sorte a garantir taxas de investimento que viabilizem os aumentos na produtividade.

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