23 dezembro, 2021

Investigação sobre o Conceito de Equilíbrio em Marx (Parte I)

Frases com mais de quatro linhas são proibidas, não se equilibram... Esta pérola da redação de TCCs não é de minha autoria, embora conste do livro de "métodos e técnicas" que co-organizei com Brena Fernandez. E tem mais: no livrinho sobre como fazer teses, Umberto Eco diz que parágrafos não devem ser muito grandes, a fim de "arejar o texto". Sabidos os integrantes da humanidade que nos levam a entender que estas regras não são estéreis. Seja como for, vou citar um material que meu ex-aluno e ex-orientando André Luis Contri selecionou para mim, há muitos anos.

A história é que ele assistiu a um curso que dei na graduação da UFRGS basicamente sobre economia marxista. E ao curso seguiu-se, com minha participação e incentivo, um inevitável seminário com os alunos interessados, uma boa meia-dúzia, incluindo Contri. Anos depois, conversando amigavelmente com ele, falei que Marx era equilibrista, mas não lembrava em que parte do volume 1 d'O Capital me baseei. Mas jurava que o pinta era mesmo equilibrista. 

Então agora decidi mexer naquele texto de André Contri (na verdade, citações e observações bibliográficas). Mas fui à internet para não digitar o paragrafão das páginas 246-7 do livro cujo link dou lá mais prá baixo. Contrariamete a meu hábito, o texto de Marx vai todo sem destaque, exceto o trecho citado por Contri, que vai em cor deste tipo e o negrito é dele mesmo. Marx não tinha nem coloridos nem negritados nesta parte.

[...]

But, in spite of the numerous analogies and links connecting them, division of labour in the interior of a society, and that in the interior of a workshop, differ not only in degree, but also in kind. The analogy appears most indisputable where there is an invisible bond uniting the various branches of trade. For instance the cattle-breeder produces hides, the tanner makes the hides into leather, and the shoemaker, the leather into boots. Here the thing produced by each of them is but a step towards the final form, which is the product of all their labours combined. There are, besides, all the various industries that supply the cattle-breeder, the tanner, and the shoemaker with the means of production. Now it is quite possible to imagine, with Adam Smith, that the difference between the above social division of labour, and the division in manufacture, is merely subjective, exists merely for the observer, who, in a manufacture, can see with one glance, all the numerous operations being performed on one spot, while in the instance given above, the spreading out of the work over great areas, and the great number of people employed in each branch of labour, obscure the connexion. But what is it that forms the bond between the independent labours of the cattle-breeder, the tanner, and the shoemaker? It is the fact that their respective products are commodities. What, on the other hand, characterises division of labour in manufactures? The fact that the detail labourer produces no commodities. It is only the common product of all the detail labourers that becomes a commodity. Division of labour in society is brought about by the purchase and sale of the products of different branches of industry, while the connexion between the detail operations in a workshop, is due to the sale of the labour-power of several workmen to one capitalist, who applies it as combined labour-power. The division of labour in the workshop implies concentration of the means of production in the hands of one capitalist; the division of labour in society implies their dispersion among many independent producers of commodities. While within the workshop, the iron law of proportionality subjects definite numbers of workmen to definite functions, in the society outside the workshop, chance and caprice have full play in distributing the producers and their means of production among the various branches of industry. The different spheres of production, it is true, constantly tend to an equilibrium: for, on the one hand, while each producer of a commodity is bound to produce a usevalue, to satisfy a particular social want, and while the extent of these wants differs quantitatively, still there exists an inner relation which settles their proportions into a regular system, and that system one of spontaneous growth; and, on the other hand, the law of the value of commodities ultimately determines how much of its disposable working-time society can expend on each particular class of commodities. But this constant tendency to equilibrium, of the various spheres of production, is exercised, only in the shape of a reaction against the constant upsetting of this equilibrium. The a priori system on which the division of labour, within the workshop, is regularly carried out, becomes in the division of labour within the society, an a posteriori, natureimposed necessity, controlling the lawless caprice of the producers, and perceptible in the barometrical fluctuations of the market-prices. Division of labour within the workshop implies the undisputed authority of the capitalist over men, that are but parts of a mechanism that belongs to him. The division of labour within the society brings into contact independent commodityproducers, who acknowledge no other authority but that of competition, of the coercion exerted by the pressure of their mutual interests; just as in the animal kingdom, the bellum omnium contra omnes [war of all against all – Hobbes] more or less preserves the conditions of existence of every species. The same bourgeois mind which praises division of labour in the workshop, lifelong annexation of the labourer to a partial operation, and his complete subjection to capital, as being an organisation of labour that increases its productiveness - that same bourgeois mind denounces with equal vigour every conscious attempt to socially control and regulate the process of production, as an inroad upon such sacred things as the rights of property, freedom and unrestricted play for the bent of the individual capitalist. It is very characteristic that the enthusiastic apologists of the factory system have nothing more damning to urge against a general organisation of the labour of society, than that it would turn all society into one immense factory. 

Trecho colorido é o que foi marcado por André Country. O negrito também é dele. Eu selecionei o parágrafo monstro retirado daqui. Ele dá ainda as traduções brasileiras de duas obras, mas preferi traduzir pelo Google Tradutor e revisar o trecho colorido no paragrafão: 

As diferentes esferas de produção, é verdade, tendem constantemente para um equilíbrio: pois, por um lado, enquanto cada produtor de uma mercadoria é obrigado a produzir um valor de uso, para satisfazer uma necessidade social particular, e enquanto a extensão desses desejos difere quantitativamente, ainda existe uma relação interna que estabelece suas proporções em um sistema regular, e um sistema de crescimento espontâneo; e, por outro lado, a lei do valor das mercadorias determina, em última instância, quanto de seu tempo de trabalho disponível pode ser gasto com cada classe particular de mercadorias. Mas esta tendência constante ao equilíbrio, das várias esferas da produção, é exercida, apenas na forma de uma reação contra a constante perturbação desse equilíbrio.

Assumo eu daqui em diante. Entendo que se a perturbação do equilíbrio é contínua, obviamente também sua recomposição também é. Houve construção e, como se diz modernamente, desconstrução do equilíbrio num processo interminável de busca e rejeição: desequilíbrio gera equilíbrio que gera desequilíbrio que gera equilíbrio, até o fim dos tempos capitalistas.

DdAB

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