Querido diário:
Tivemos os maragatos combatendo os ximangos. Antes, no Brazil-com-z, eram ximangos contra jurujubas. Depois, os saquaremas contra os luzias e, no Brasil-com-s, os petralhas antagonizando os coxinhas. E tudo vice-versa. E onde isto vai parar? Lá naqueles ximamgos-maragatos, houve mesmo guerra civil, conhecida pela prática da degola. Ambos os lados passavam a faca na garganta de seus irmãos, antecipando o descolamento alma-corpo.
Aqui, postei longamente sobre pilhas de coisas e destaco a fúria do povo
desgovernado:
Temo, claro, pelo Brasil, temo que a política esteja tão corrompida, os partidos tão corrompidos, o controle do estado pagando pay-offs tão elevados, que pode ser que as manifestações daqui de 2013 pouco ou nada resultem em mudanças e tenhamos o que aconteceu em 1848, conforme lemos [na biografia de Schopenhauer]:
Em setembro de 1848, o parlamento alemão, reunido em Frankfurt-am-Main, aprovou o armistício de Malmö, assinado na Suécia. A Prússia havia declarado guerra à Dinamarca em função das pretensões territoriais desta sobre a Silésia: todos achavam que era uma ação patriótica da parte dos prussianos e a retirada da Prússia foi considerada por muitos como uma traição. A aprovação deste armistício pela Assembleia Nacional Alemã foi considerada como prova de impotência e uma desonra nacional. A isto era necessário acrescentar o desgosto geral dos decepcionados, que haviam esperado muito mais da Revolução de Março, tanto no âmbito político como na área social.
Em 18 de setembro, tudo explodiu violentamente. Uma multidão enfurecida assaltou a Assembleia Nacional. Foram erguidas barricadas pelas ruas de Frankfurt-am-Main e ouviu-se o disparo de tiros. Dois proeminentes representantes da contrarrevolução, que eram membros da Assembleia Nacional e tinham sido capturados durante o assalto, o príncipe Lichnowsky e o general Auerswald foram brutalmente assassinados pela multidão. Lichnowsky foi decapitado e Auerswald teve os braços arrancados antes de se ver transformado em alvo para tiros. Ernst Moritz Arndt, que então já era bastante velho, lamentou-se: 'A enchente que nos inunda a todos foi-se acumulando ao longo de toda uma geração, por causa da estupidez, cobiça e despotismo dos governantes; agora os diques se romperam e toda a lama e imundície que estavam no fundo da represa saltaram sobre nossas cabeças."
E aqui o livro cuja leitura estou praticamente terminando, Susan Sontag, "O Amante do Vulcão", página 276:
O homem de negro [que era Scarpa, o chefe da polícia de Nápoles] olhava fixamente para o duque [um intelectual napolitano da época], não para seu rosto, mas para o pesado abdômen branco, que se dilatava e se contraía com seus soluços. Seus pés estavam vermelhos - levara tiros nas duas pernas -, mas ele continuava ereto na cadeira, os braços novamente atados nas costas.
Nem o homem de negro e nem seus guardas fizeram menção de intervir. Mas os atormentadores do duque haviam parado. Embora parecessem saber que ele não os deteria, não tinham certeza se podiam continuar. Todos tinham medo do homem de negro- exceto o barbeiro, que era um informante seu.
O barbeiro deu um passo à frente, navalha na mão, e cortou fora as orelhas do duque. Quando elas caíram da sua cabeça, um avental de sangue apareceu na parte de baixo de seu rosto. A multidão urrou, a fogueira estremeceu, e o homem de negro cantarolou com satisfação e foi embora, para que o drama pudesse continuar até o final.
*
Você viu quando eu fui embora, disse Scarpia no dia seguinte, numa taberna junto ao porto, para um homem da turba que estava a seu serviço. O que aconteceu depois? Ele continuou vivo?Sim, patrão, disse o homem. É o que eu estou dizendo. Ele chorava e o sangue escorria pelo rosto e pela cabeça.
Ainda vivo?
Sim, senhor, patrão. Mas o senhor sabe o que acontece quando o suor escorre pelo peito da gente -
[...]
-pois então, o sangue estava empapado aqui no meio do peito, e ele ficava tentando fazer o suor escorrer.
[...]
Soprando. Sabe como é, patrão. Ficava só sobprando. Só isso. Para fazer o sangue escorrer para baixo. Daí uma camarada nosso achou que ele estava tentando fazer uma mágica, soprar nele mesmo para conseguir desaparecer, e deu mais um tiro nele.
E aí ele morreu?
Quase. Perdeu tanto sangue.
Ainda vivo?
Sim, sim. Daí chegou mais gente nossa e o pessoal começou a atacá-lo com facas. [...]E aí nos enfiamos o corpo dele no barril de alcatrão e o jogamos na fogueira.
Em outras campanhas, já anunciei: sou Da Paz, sou pela paz. Não gosto de grenal, não gosto de flaflu, não gosto daquela viagem de seio bom-seio ruim. Não gosto de pensar que uma guerra civil diferente da que já vivemos, com milícias armadas, venha a empanar meus últimos anos/décadas de vida.
DdAB
Imagem: trata-se de um dos quadro que George Romney fez da sra. Emma Hamilton. Retirei-o do verbete da Wikipedia (em inglês) sobre o Almirante Nelson. Não posso explicar tudo o que estas sentenças implicam: quem é Emma? Como o Almirante Nelson foi parar em Nápoles? E ela própria? O romance de Sontag contempla estas personagens históricas e alguma ficção, é claro.
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