Querido diário:
Dedicado ao Comentador Teixeira
Nesta postagem daqui, recebi um comentário que me fez ficar pensando se devia ou não expressar minha verdadeira opinião. Aqui falei algo e recebi como resposta que, quando surgisse a oportunidade, eu deveria falar a respeito, não mais que destinado a acicatar a discussão. Com charmosa modéstia, o Comentador Teixeira disse: Se aparecer a oportunidade, comente mesmo. Assim vou buscando entender o muito que não sei." Não sei se também soa como charmosa minha perfeita crença que o mesmo acontece comigo. Já andei falando em uma dessas minhas já quase 2000 postagens numa frase (motto) que li (aqui, com o doce comentário de Maria da Paz) numa velha revista Ciência Hoje: viver como se fosse morrer amanhã, estudar como se não fosse morrer nunca. (E agora mesmo acabei de ver que milhares de pessoas disseram esta frase, até jogador de futebol).
Teixeira falou sobre as preocupações dos neo-liberais em, entre outras coisas, quererem implantar o estado mínimo. Reconheço que poderia eu aqui estar distorcendo o contexto em que este comentário foi tecido (ou interpretado). E, se não cheguei no ponto relevante, peço clemência por deixá-lo de lado, tomando-o apenas como escusa para falar mais sobre minha visão relativa ao tempo presente. Baseada, claro, naquilo que considero ser um futuro decente.
Eu, sempre com minhas dúvidas sobre se me acham de esquerda, fiquei preocupado, pois considero que nós, da extrema esquerda, queremos mesmo o estado mínimo, na verdade, queremos é o estado nulo, pois queremos destruí-lo e criar um tipo de sociedade em que a presença do estado será desnecessária. Nunca fui de ler muito sobre esta visão, embora, em minha tenra adolescência, eu tenha lido "O Estado e a Revolução", do velho Lênin. E lembro do exemplo que ele deu sobre um velhote sisudo apartando a briga de dois garotos levados: não precisa de polícia nem estado, nem nada. O cidadão responsável substitui, com enormes vantagens, o aparato repressivo governamental. Mas isto é bem diferente daquele "estado mínimo" que quer mesmo é submeter as classes populares e que usa todos os mecanismos de que dispõe (autoritariamente ou não) para fazer a distribuição da renda pender para o capital, em detrimento do restante da sociedade (trabalhadores empregados e desempregados e indivíduos alheios ao mercado de trabalho, como os doces velhinhos aposentados).
Depois tem a frase que também volta e meia me retorna à lembrança e que usei no título da postagem. Sempre pensei ser de Marx, mas nunca achei a referência. Dando uma olhadinha aqui e ali no próprio blog, vi que referi a Saint-Simon, um dos "socialistas utópicos" daqueles tempos. E escrevi lá:
[...] claro que quero substituir o governo dos homens pela administração das coisas, mas não deste jeito reacionário, preocupado em reduzir os impostinhos dos burguesinhos! por fim, se é que é para ter impostos e não prejudicar a alocação de recursos (ou seja, no mercado dos fatores), devemos retirá-los do bloco B21 da matriz de contabilidade social, ou seja, isentar os produtores. mas não podemos isentar as instituições, que -de acordo com esta conceptualização- são as proprietárias dos serviços dos fatores levados aos mercados de fatores (trabalho e capital). ou seja, cobrar impostos indiretos causa distorções alocativas. cobrar impostos diretos gera outras distorções que não são de interesse para a discussão. [aquele negócio de afetar a "capacidade de trabalhar" é um dos maiores lixos culturais da história da ciência econômica!].
Ao ler há poucos instantes os comentários (entre os quais está o de cujus, vi o de Maria da Paz, feliz com o epíteto de "esquerda troglodita" para uma turma que bem conheço. Por exemplo, tem gente que quer a regulamentação da imprensa, discussão que me parece fora de foco neste momento em que o Brasil tem tanto problema requerendo a atuação de um governo decente. Tenho em mente os pais e avós dos meninos de rua e sua prole!; tenho em mente a impunidade, os altos vencimentos dos juízes, a roubalheira generalizada, a falta de motivação de um número expressivo de funcionários públicos, tanta coisa para um governo que fica extemporâneo pensar que este pode ainda liderar o setor produtivo do país), pensei novamente naquela imagem de que a turma do lado esquerdo do círculo trigonométrico não é a minha. Teremos, talvez, alguns pontos em comuns, talvez a defesa da democracia. Nem sei se temos em comum a defesa da liberdade como valor humano supremo.
Por exemplo, acho que trabalhar é um sacrifício e quando a turma pede "emprego e renda" tremo nas bases. Quem quer emprego podendo ter renda? Haverá muita gente querendo, claro. Mas devemos entender que muito emprego é inimigo da produtividade (pela própria definição de produtividade do trabalho, ou seja, PIB por trabalhador) e, além disto, a sociedade não gosta de desperdiçar horas de vida. Pelo menos foi isto que disse Marx. E aí tem mais coisas da esquerda trigonométrica: tem gente que até hoje não leu ou não entendeu os volumes 2 e 3 do Capital. Aliás, nem o volume 1, pois terá sabido apenas da seção 2.
Admito que tenho outros problemas a resolver para criticar mais acremente a tentativa de romper com o sistema. E isto tem a ver com os conceitos de fetichismo e alienação. Um dia prestarei contas de estudos que ainda farei sobre estes dois temas. Enquanto isto, vou querendo mesmo a maior participação dos "trabalhadores independentes livremente associados" nas economias monetárias. E vou querendo do estado a provisão (com produção pelo mercado sempre que possível) de bens públicos e bens de mérito. Em outra postagem (aqui) já falei sobre minha concepção de inserção crescente de bens de mérito como de oferta gratuita pelo setor privado (com provisão pública e universal, obviamente). Meu comovente exemplo é que o whisky de 13 anos terá provisão pública apenas depois que a bebida com 12, 11, dez, etc. seja acessível a todos. Para não falar em garrafas PET e as autênticas chinelas havaianas...
E vou dizendo mais. Aquele negócio de incentivar a indústria que a turma do círculo trigonométrico tanto deseja não me parece nem keynesiano nem marxista. Será então o quê? Não é keynesiano, pois no modelo do economista britânico quem manda é a demanda, ou seja, tudo é determinado pela demanda final. E a transposição para o modelo de insumo-produto é tão velha quanto myself, com um artigo de Richard Goodwin. Não é marxista, pois todo mundo que leu a primeira frase do volume 1 sabe que "a riqueza das sociedades humanas em que rege o modo de produção capitalista é dada por uma imensa acumulação de mercadorias". E, claro, depois aprendemos que mercadoria é apenas aquilo que foi vendido. Isto significa que, para incentivar a produção de mercadorias (o que Marx e alguns seguidores contemporâneos não querem; eu quero reformas que conduzam ao socialismo, mas nada de socialismo hoje), devemos incentivar que as produzidas ontem deem o salto mortal hoje!
Hoje é domingo. Vou parar por aqui. Deixo claro que meter mais governo para mandar nos homens é fria (ver mais aqui), onde há um ideário parcialmente fora do círculo trigonométrico, mas assentado sobre o eixo dos cossenos, à esquerda. E a Petrobrás, a Vale do Rio Doce, como privatizar, como socializar? Vou parar por aqui.
DdAB
P.S. Minha próxima postagem será uma exposição da Matriz de Contabilidade Social, a que tanto me refiro e creio nunca tê-la exposto didaticamente. Fiz e faço e farei propaganda do livro em que ela é feita em picadinho, mas aqui no blog terei a oportunidade de reescrever todo o blim-blim-blim quase dez anos depois de ter comedo a envolver-me naquela encrenca de quase seis anos de duração, ou seja, acabou há precisos quatro anos quando o livro saiu:
BÊRNI, Duilio de Avila e LAUTERT, Vladimir (orgs.). Mesoeconomia; Lições de Contabilidade Social. A Mensuração do Esforço Produtivo da Sociedade. Porto Alegre: BookMan, 2011.
P.S. Minha próxima postagem será uma exposição da Matriz de Contabilidade Social, a que tanto me refiro e creio nunca tê-la exposto didaticamente. Fiz e faço e farei propaganda do livro em que ela é feita em picadinho, mas aqui no blog terei a oportunidade de reescrever todo o blim-blim-blim quase dez anos depois de ter comedo a envolver-me naquela encrenca de quase seis anos de duração, ou seja, acabou há precisos quatro anos quando o livro saiu:
BÊRNI, Duilio de Avila e LAUTERT, Vladimir (orgs.). Mesoeconomia; Lições de Contabilidade Social. A Mensuração do Esforço Produtivo da Sociedade. Porto Alegre: BookMan, 2011.
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