23 junho, 2015

A Farsa do PT



Querido diário:

Hoje em dia, em plena era da velocidade, do tudo rápido, do fast food, para ganhar tempo a história já vai se produzindo diretamente na condição de comédia (Marx aqui; Aécio aqui), deixando a tragédia para precisamente os mesmos, digamos, os 70% mais pobres do Brasil. Em compensação, os últimos eventos do mundo político tiveram, por um lado, o 5o. Congresso Nacional do PT ocorrido entre 11 e 13 de junho corrente. E, por outro, as declarações que se sucederam. Tudo começou com a de Lula, na página 8 de Zero Hora de hoje. Cito "Recados, ataques, desabafos" da página 9:

   Precisamos construir, porque hoje a gente só pensa em cargo, só pensa em emprego, só pensa em ser eleito. Ninguém trabalha mais de graça.
   Não sei se o defeito é nosso, se é do governo. Eu acho que o PT perdeu um pouco a utopia.
   O PT precisa voltar a falar para a juventude. O PT está velho. Eu,que sou a figura proeminente do PT, tenho 69 (anos), estou cansado, já estou falando as mesmas coisa que falava em 1980. Fico pensando se não está na hora de fazer uma revolução neste partido (...), colocar gente nova, que pensa diferente, mais ousada.
Os dois parênteses estão no original.

Claro que aí não se resume toda a cultura humana desde a primeira bactéria. Mas não posso deixar de brincar com:

.a. no mínimo desde 1989, fui simpatizante do PT e nunca, nunca de núncaras, fui sequer convidado a entrar no partido. Quando Collor ganhou a eleição, eu, em desagravo, iria filiar-me. Peguei o fusca de minha irmã e fui até a Av. João Pessoa, esquina Rua Sebastião Leão. Não havia vaga para estacionar, o que me levou a mudar de ideia e não filiar-me a nada. Quando ocorreu o plebiscito das armas, achei ridículo fazerem aquela pergunta e me decidi pela desobediência civil e parei de votar, umas duas ou três eleições, se bem conto. Quando, há quatro anos e meio, Dilma quase empatava com Serra na campanha eleitoral, preparei-me para votar no segundo turno, dar minha contribuição àquele projeto em que nem sequer mais acreditava. Pois não aceitaram meu voto. Depois, das as esdrúxulas regras constitucionais brasileiras, queria renovar meu passaporte. Não pude, pois precisava provar ser "em dia" com as obrigações militares e eleitorais, logo eu, um pacifista e desgostoso da política. Tive que pagar uma multa à -assim chamada- justiça eleitoral (também devem ganhar fortunas os juízes...). E depois venho votando nessa malta (ver, por exemplo, aqui e, mais agressivinho, aqui; não que o Raul o seja, mas ele faz parte da farsa há muitos anos).

.b. Na hora não notei, levei um ano ou até quatro para fazê-lo. Quando Olívio Dutra elegeu-se prefeito, acho que ele devia ter feito eleições dentro de todas as repartições municipais para determinar as chefias do programa de trabalho sobre como implementar a lei do orçamento. E não aparelhá-lo com cargos e comissões, indicações e CCs. Claro que ser governo é complicado, mas um partido decente deveria ter um plano decente de tomar o governo e não ser tomado pelos oportunistas. O PT fracassou e bem sei disto há muito tempo.

.c. Eu, que sou uma figura proeminente do Planeta 23, fiquei pensando que talvez esteja mesmo velho para dar soluções como reformador ao futuro do Brasil. Ainda assim, não me contenho! Penso que a saída é fortalecer o poder judiciário, substituindo a atual malta por estudantes de direito vinculados à empresa júnior de alguma universidade de um dos países decentes. Não me lembro se há cidades abandonadas no Brasil, exceto as que jazem sob o leito de certas barragens de produção hidrelétrica. Sugiro mesmo fechar a hidrelétrica, cercar a cidade fluvial, meter todos os criminosos em seu núcleo e fazer uma cerca de arame farpado duplo para impedir os escapamentos. E contratar policiais suecos para administrar a encrenca.

E agora parou a brincadeira: passo a citar uma declaração de Olívio Dutra, meu stalinista preferido. Mas que o homem é bom, não há dúvida. E que está na contramão do PT pelo menos desde que foi apeado do ministério das cidades, ou o que o valha. A rigor, creio firmemente que ele está na contramão há muito mais tempo que este episódio de sua vida. Diz o Bigode (o lá de cima é o original staliniano):

-Que bom que Lula está dizendo isso, mas ele esteve no congresso (nacional do partido, em Salvador no começo do mês) e não foi tão enfático. O PT perdeu uma grande oportunidade de se reavaliar, de dizer para o povo brasileiro que teve gente importante nos seus quadros que errou feio e, em parte, por frouxidão das instâncias partidárias - opinou o ex-governador Olívio Dutra.
Parênteses e itálico do original.

Que digo? Já disse isto mil vezes e acabo de fazê-lo: o partido deixou-se predar, transformando-se em partido de ladrões. E por fim, que não tem fim? Carolina Bahia na página 21, em sua coluna tradicional, tem:

Lula e a água no pescoço
Depois de jogar água fria na fervura dos petistas durante o congresso do partido, agora Lula resolveu atiçar a militância. O que mudou? O presidente da Odebrecht foi preso na Operação Lava-Jato e há o claro temor de que as investigações cheguem ao próprio Lula. Sentindo a água no pescoço, o ex-presidente quer a militância mobilizada e defende, agora, uma revolução no partido. Para Lula, o PT perdeu a utopia e precisa deixar de pensar em cargos e partir para salvar o projeto. Mas quem sempre mandou nos rumos do PT e valorizou a distribuição generosa de cargos foi o próprio Lula. O partido é hoje aquilo que ele ajudou a construir.
O negrito está no original.

A vida é difícil, pois considero o comentário de Olívio como de esquerda e o desta jornalista de direita. E o meu, que sou do extremo da esquerda, tão, tão, tão à esquerda que até já caí fora dos 180 graus negativos do círculo trigonométrico?

DdAB
P. S. Uma vez que boa parte do tom da postagem é de escárnio, nada melhor que concluir com esta imagem:
É o mesmo bigode, né? É a mesma bebida!

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