05 abril, 2017
A Tolice Industrializante: uma abordagem de insumo-produto
Querido diário:
Andei argumentando que é uma tolice (na linha de Jessé Souza e a inteligência brasileira ficar satisfeita com explicações para o funcionamento da sociedade que não levem em conta em primeiríssimo lugar a enorme desigualdade presente praticamente desde o descobrimento) pensar que o Brasil poderá imitar o esforço de recuperação do peso da indústria na economia despendido pelos países capitalistas avançados, quando a sociedade é tão carente de bens públicos (como a segurança e o saneamento) e de bens de mérito (como a educação e a saúde).
Tomei os dados da matriz de insumo-produto brasileira de 1980, originária de uma base de dados que comecei (com a substantiva ajuda de Joaquim Guilhoto) a montar a partir de minha tese de doutorado e que, neste formato de oito setores, foi usada no melhor paper que fiz in my life (aqui: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-63512006000100004). Na tabela que nos encima, temos três pares de colunas derivado dessa matriz, concernentes a oito setores. O primeiro par mostra a demanda final e a demanda total da situação original. Observemos as cifras do total setorial da demanda final (igual ao total dos insumos primários, ou seja, PIB mais importações ou M) e da demanda total (demanda final/que/também/contempla/as/importações mais os insumos intermediários).
No segundo par de colunas, eu começo o exercício contrafactual. Decidi duplicar a demanda final dos SIUP - serviços industriais de utilidade pública (energia elétrica, água, saneamento e limpeza urbana). Digamos que concentramos esse gasto apenas no saneamento: começando com esgotos, teremos a produção de canos, cimento, tijolos e culminaremos por dar esgoto à população. Uma vez que elevamos a demanda final de 6.594 para 13.188, naturalmente, a demanda final aumentou de 849.886 para 856.480. E com ela também aumentou na mesma cifra o total dos insumos primários (PIB + M).
No terceiro par, tomei o mesmo aumento feito anteriormente sobre a demanda final, ou seja, aqueles 6594, mas joguei-o sobre o setor de bens de produção. Imagino que, no material de transportes (ali inserido), a turma do fetichismo industrial vai começando com aqueles aviões invisíveis que devem render uma grana nos mercados mundiais de armas. Com este aumento de despesa, serão necessários alguns canos, pouco cimento, muitos eletro-eletrônicos, mas finalmente praticamente nenhum metro linear de esgoto (na verdade, há menos de 200 unidades da quantidade monetária de demanda induzida sobre os SIUP)...
Nosso gap escatológico com relação aos grandes países industrializados do mundo seguirá precisamente o mesmo, neste segundo caso. Uma vez que a demanda final elevou-se naqueles 6.594, obviamente os insumos primários (PIB + M) também o fazem precisamente nesse montante. O que aumentou com essa investida sobre a indústria pesada foram os insumos intermediários. E pra que elevá-los, se o PIB é o mesmo do resultante do gasto em esgotos? Esgotos, como sabemos, têm muito mais importância para manter saudável uma população do que aviões para lançar gases sobre populações civis.
A moral da história formulo-a agora em outros termos: para que gastar em bens de produção, pensando em resolver um problema de esgotos, com o aumento do "emprego e renda" se podemos gastar diretamente no SIUP e, com isto, ter esgotos e até menor uso de insumos intermediários? É fetichismo, minha gente.
DdAB
(Edições feitas às 10h32min de 6/abr/2017).
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2 comentários:
Sem contar que, no caso dos avões invisíveis para atacar pessoas com gases tóxicos, qualquer esgoto ficará mais contaminado...
... reforçando as razões para países estropiados como a maioria dos integrantes da ONU deem prioridade à formação de capital humano, não é mesmo, Leila?
DdAB
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