01 novembro, 2016

A Desigualdade Brasileira em 2036


Querido diário:

Esses 20 anos que nos separam de 2036 não acenam com enormes possibilidades de mudança na desigualdade entre os indivíduos (ou suas famílias). A desigualdade exibe, como sabemos, várias dimensões, como as verificadas na saúde, na educação, na moradia, na nutrição, na escolarização, no aprisionamento (paro de citar, mas basta pensar mais um pouco, a fim de ampliá-la, ou fazer desdobramentos, como é o caso da saúde, com promoção, reparação, etc.).

Como avaliar? Em qualquer das dimensões por meio das quais a desigualdade se expressa, quem é mais saudável, pobre ou rico? educado, pobre ou rico? bem instalado, pobre ou rico? bem nutrido, pobre ou rico? etc.

A desigualdade econômica dirá respeito à renda (to be true, receita) ou à riqueza, e costuma ser medida por meio do índice de Gini (variando de zero a um, diz que o zero é a igualdade perfeita e o um é a desigualdade absoluta). Boa parte da determinação da renda depende do reconhecimento no mercado de fatores de produção da importância da contribuição do indivíduo (e outra boa parte depende do poder de monopólio que o proprietário do fator exerce sobre o sistema, destacando o poder da classe capitalista sobre a classe trabalhadora). Por exemplo, um médico e um açougueiro contribuem para a formação do produto social, costumando-se atribuir ao médico mais méritos na hora de avaliar-lhes os esforços relativos.

Além da renda, a desigualdade pode ser atenuada ou expandida em resposta à importância de outros mecanismos alheios ao mercado de fatores de produção. Trata-se, no caso, de transferências realizadas entre os indivíduos (mesadas, donativos) ou da ação do governo (dando ajuda ou tributando os rendimentos dos indivíduos). O governo ainda pode atuar sobre a desigualdade (além da renda) por meio do direcionamento do gasto público (educação, saúde, etc.) ou imiscuindo-se na provisão de bens ou serviços que ali no início estavam configurando as dimensões da desigualdade. Por exemplo, se pobre mora em casas menores que a dos ricos, o governo pode dar-lhes acesso ao crédito para ampliá-las.

Por falar em crédito, o acesso ao crédito para essa reforma da moradia, ou para pagar uma viagem de estudos, ou para -principalmente- favorecer o indivíduo a criar seu próprio emprego (empreendedorismo) é outra forma importantíssima de combater a desigualdade e incentivar a mobilidade.

Então, além da renda, as transferências familiares ou governamentais podem ampliar as diferenças de rendimentos entre os indivíduos. Por exemplo, os juízes ganham lá seus vencimentos regulamentares que são complementados com o auxílio moradia. Ouço agora dizer que eles (alguns, claro) um auxílio de R$ 7.500 para complementar a educação de seus petizes. E por aí vai.

Tudo indica que aquela PEC 241, que pensa substituir a lei do orçamento com uma legislação mais potente (mudança constitucional) deve mexer estonteantemente com a magnitude de qualquer índice de Gini que queira avaliar a desigualdade naquelas dimensões a que referi lá em cima. Por exemplo, o número de quartos das casas dos pobres ou dos ricos, a área de suas respectivas cozinhas, o número de cáries dos filhos, e por aí vai. Qual é o problema com a lei do orçamento? É que ela nunca foi cumprida. E com essa escandalosa PEC? Pecado, claro, pecado contra qualquer iniciativa de reduzir a desigualdade com essas medidas palmares de que falei. Mas o otimismo não nos deve abandonar de modo absoluto, pois a probabilidade de que esta farsa criada pela "área econômica" do atual governo ("o orçamento público deve ser gerido como a economia familiar: ningúem gasta mais do que ganha", um verdadeiro atentado a qualquer manual de introdução à economia) não dure nem um dia no mandato do sucessor de Michel Temer.

Fico estupefato ao imaginar que esses governantes usurpadores pensam que, com este tipo de medida, estão criando boa vontade nos "investidores". Como se alguém "do ramo" fosse acreditar que as aleivosias criadas por esses falsos profetas merecem algum grau de seriedade.

DdAB
A imagem é da cobra Apófis, signo egípcio do caos, que deve colidir com a terra, precisamente quando as despesas públicas abandonariam o caos. A boa notícia é que a Terra pode ser varrida até antes do caos ser implantado definitivamente no Brasil.

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