11 agosto, 2014

Furtonati e a Pobreza



Querido diário:

No outro dia, um zelador predial tachou-me de ser um daqueles que não gosta de pobres. Eu tentei argumentar não gostar de pobreza, nem da riqueza, por exemplo, dos políticos, não gostar -em suma- de desigualdade. Ele disse que isto eram apenas desculpas e que a realidade realmente real (tremi ao ouvi-lo dizer isto e cheguei mesmo a pensar que ele teria sido meu aluno num desses malfadados cursos noturnos em que andei enfiado há alguns anos). Entretivemos um final feliz, quando eu esclareci não gostar de pobres, no sentido de considerar que um trabalhador precário deve ser redimido desta condição por meio de um emprego decente.

Empregos decentes para gente de baixo nível de qualificação não podem ser delegados (e eu quase disse 'relegados') ao setor empresarial. O setor empresarial deve ser incentivado a competir estrondosamente na corrida pelos ganhos de produtividade, o que quer dizer menos emprego, menos emprego, menos emprego. Disse-nos Michael Porter que "os custos nunca são suficientemente baixos" e, claro, referia-se a todos os custos, mas bem sabemos há milhares de anos que o mais fácil deles de cortar é o da mão-de-obra. Emprego decente para desqualificado? Apenas no setor público (e não estou fazendo piada com os políticos, estes grandes charlatões nacionais) é que há lugar para gente "em treinamento", com aquela ladainha da aba do blog: três horas de ginástica, mais três de aula e outras três de trabalho comunitário. Nas horas de aula, o que se estuda, basicamente, é português, matemática e empreendedorismo. É uma tentativa singela de Utopia no sentido de permitir ao trabalhador deste, assim chamado, serviço municipal, de deslocar aquela turma, primeiro, para um emprego decente (férias, domingos pagos, assistência médica diferenciada) e depois para a criação de um auto-emprego decente (por contra-exemplo, papeleiro).

Pois foi aí que o zelador enquadrou-me como dos que odeiam pobres. Eu dizia estas coisas: vamos acabar com os papeleiros, pois o DMLU é que deveria pagá-los em empregos decentes.

E o prefeito Fortunati, que alguns eleitores passaram a designar como Fortonati? Quem mais, se não o prefeito, deveria tentar encaminhar os moradores da Av. Borges de Medeiros, debaixo do viaduto, ao deus-dará? Quem é que tem a responsabilidade de dar tratamento decente aos pobres? Quem odeia os pobres, o que quer vê-los fora das ruas (empregos decentes, moradias decentes, etcéteras decentes)? Quem são os amigos do povo, enfim?

DdAB
A foto, tirada com celular baratinho, é de minha autoria. E posso dizer que vemos (não digo que vi na hora) lá adiante um gari, ou seja, um trabalhador em serviço de baixos requerimentos de qualificação, mas que detém um emprego decente, emprego este de provisão pública. O gari, juro, não pede dinheiro (uns poucos o fazem, actually, mas são desincentivados a persistir na mendicância disfarçada nos trajes de trabalhador organizado), tem direito a repouso semanal remunerado, férias anuais, dias feriados com féria, aposentadoria, etc.

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