28 março, 2011

Desenvolvimento Sustentável: odeio lixo seco

querido diário:
há muito que sou da campanha "odeio lixo seco", pois sua legenda econômica diz que os papeleiros distribuídos por toda a América do Sul são trabalhadores terceirizados pelas prefeituras de toda a América do Sul. concordo com a legenda, claro, discordo da terceirização, claro, e solidarizo-me com os trabalhadores informais, inclusive com os doentes mentais informais, os viciados informais e tudo o mais que a informalidade trás de atraso. claro que também me solidarizo com a indução de poemas pela contemplação de estrelas a que os trabalhadores sem teto são submetidos pela -disse Stanislaw Ponte Preta- "atual conjuntura".

hoje, até agora, li Zero Hora de modo aleatório, piadinhas daqui, fotinho acolá e noticiazinha bem ali. um caderno cá, outro lá. não vi nenhum erro, já é uma vitória. eles vêm a mim em ondas, como o mar.

Deus, nosso senhor Jesus Cristo, morreu na cruz para nos salvar. ok, ok, não é bem isto, hoje é segunda feira, ontem foi domingo e apenas ante-ontem é que foi sábado, como quer o poema viniciano. seja como for, na p.1 do Segundo Caderno do combativo jornal, lemos uma declaração, que cito o texto verbatim:

Nós estamos só pelo velhinho lá em cima - resume Sidnei.

pensei filosoficamente: "se estamos pelo velhinho ou se não estamos por ele, seja como for, estamos todos na mesma enrascada". talvez também haja gradações no grau em que nos envolvemos na enrascada. outro poeta carioca (besides Vinicius de Moraes), Billy Blanco, disse: "todo mundo é igual quando a vida termina, com a terra por cima e na horizontal". tem gente que finge que não sabe e não consegue adotar um curso de ação que leve a mais desenvolvimento das forças produtivas que se encarregaria de expandir as fronteiras tecnológicas da humanidade e garantir não apenas existência digna, mas principalmente existência digna e longa. viver menos de 1.000 anos é uma baixaria, pois sabemos que o Sol viverá muitos milhares de vezes esta cifra!

pois bem, Sidnei é um dos amigos do finado Ismael. 'seo' (no dizer de José J. Veiga) Ismael gerou um blog. depois de morto. sabe-se lá o que ele gerou em vida. o blog é seuismael.blogspot.com. foi criado pela genial artista Maria Tomaselli (Cirne-Lima). ela comoveu-se com a história de 'seo' Ismael, que foi assassinado por um pedreiro -diz ela, diz o jornal- no dia de natal do ano findo de 2010. ela mesma descobriu que "pedreiro" nada tem a ver com o setor industrial, subsetor da construção civil, mas com usuário de pedras de crack. o usuário matou Ismael porque -penso- não ganhava suas pedras gratuitamente de alguma autoridade sanitária/belevolente suíça, mas precisava usar o mecanismo de mercado no Brasil. o mecanismo de mercado, bem sabemos, não diferencia ética de ótica, malvado de malfadado, etc.. nem sempre o malvado é o malfadado. o fado de Ismael é que é casca grossa.

seus amigos, de fotos estampadas na página que acima refiro, pareceriam seres normais, artistas da geração pé-na-estrada, sei lá. pareceriam com meus professores de segundo grau, pareceriam com meus professores da UFRGS e Oxford, pareceriam com meus colegas da UFRGS, UFSC, PUCRS e Oxford. pareceriam com gente. até -diria eu, emocionado- parecem mesmo. há tempos, numa reunião do Conselho de Justiça e Segurança do Menino Deus, propus que nos dirigíssemos às autoridades e requerêssemos (com liminar, se fosse o caso), reciclagem dos papeleiros. poderíamos substituí-los por burros de carga e a sociedade poderia suborná-los para deixarem-se treinar para uma vida menos thrilling do que à que são submetidos pelas forças do imperialismo internacional e, principalmente, pela hierarquização das prioridades dos políticos.

claro que a reciclagem é moda, tanto é que Zero Hora tem um escorreito caderno às segundas-feiras intitulado  "Nosso Mundo Sustentável". são lascas de árvore que se transformaram em oito páginas, de dezenas de milhares de exemplares. não sou contra a imprensa. não sou contra os mendigos, não sou contra o bem, a verdade e o conhecimento. o que sou contra é a função de utilidade dos políticos que dão peso tão diminuto à componente altruísta. na verdade odeio mais o político egoísta (alfa igual à unidade, ou mesmo alfa a partir de 0,5; tinha que ser majoritariamente altruísta, ou devia escolher a profissão de pedreiro).

tudo isto mistura com a charge da p.2 do cronista Marco Aurélio, que mostra dois santos conversando e comemorando o "Dia do Planeta" e um dizendo ao outro: apagaram as luzes, de sorte que podemos ver com mais acuidade os fogos de artifício (mutatis mutandis). os fogos de artifício seriam a brigada anti-voo líbio. mais adiante, no mesmo Segundo Caderno a que me referi há instantes, vemos na p.3 uma tira de Rekern: três quadrinhos. no primeiro, vê-se a Torre Eiffel e o dístico: "liberté...", no segundo, está o Arco do Triunfo e a "égalité..." e no terceiro, vemos um dos aviões de guerra a serem adquiridos pelo Brasil (ou sei lá) e o dístico: "bombardé!!!". faço meu protesto com mais dois haikais (talvez os primeiros da categoria dos haikais sinaléticos) sem título:

SEM TÍTULO i
felizes dos amigos do seo Ismael que:
.a. ainda estão vivos
.b. ainda vivem no Brasil.

SEM TÍTULO ii
infelizes dos amigos do seo Ismael que:
.a. ainda estão vivos
.b. ainda vivem no Brasil.
DdAB
p.s.: por puro acaso, indaguei a um menino de rua a diferença entre "chop" e "cut". ele respondeu que " 'chop' é quando tu toma chope e 'cut' é quando tu mata um gato". na língua do "p", pensei que Pedro Pedreiro é proposta do passado, no pretérito perfeito, em particular.
p.s.s.: a imagem saiu d(aqui) e parece que não era bem a intenção deles ilustrar uma postagem como a minha. como sabemos, a contabilidade social estuda o desempenho da sociedade humana nas dimensões econômica, sócio-demográfica e ambiental. voto pela colocação em primeiro plano da reciclagem humana, depois é que viria a ambiental. e, claro, estamos mal, ainda que, também Vinicius disse: "e no entanto é preciso cantar".

Nenhum comentário: