12 dezembro, 2010

Cocaína, crack e maconha (entre outras drogas)

querido diário:
diário ou quase, né? não juro que serás diário, ainda que eu acredite que quem escreve diário é porque saiu do armário. mas quem escreve sempre que pode, se fizer poeira, sacode. ok, o tema é difícil. não sou a favor do consumo de drogas, ao contrário. vivo quebrando a cabeça para entender as atuais políticas públicas que não mostram qualquer sinal decente de reduzi-lo. seja como for, para começar o assunto, admito o "consumo recreativo", desde que este seja devidamente conceituado e, em particular, não seja deixado "ao mercado" o encargo de tratar da provisão deste bem regular (ou seja, não é livre, nem de mérito, nem de demérito).

então não é que nas p.34-35 do jornal Zero Hora de hoje há enorme reportagem sobre o "avanço das drogas", cuja "Onda do tráfico inunda o Litoral". fazer a como que rima entre "onda" e "inunda" e associar uma "onda" ao "litoral" lembra o surf, o surfista, sei lá. o que vemos no tom geral das matérias são contradições internas e avaliação equivocada tanto das causas como das consequências das atuais políticas de combate ao consumo inadequado.

por exemplo, a juíza Cristiane Hoppe, da Vara Criminal de Osório já vai acusando: "Sem consumidor não haveria tráfico de drogas." não apenas esta é a visão de "incriminar a vítima". mas, além desta crueldade para com o doente, o viciado, há um truísmo estupefaciente. claro que sem consumidor não haveria tráfico. sem ofertantes também. mas o principal é que "tráfico" só ocorre porque há alguns salvadores da pátria e da saúde dos filhos dos outros que insistem em que consumir drogas é crime e não sintoma. e fogem à velocidade do fogo na palha (esta é em homenagem à onda litorânea) de olhar o fenômeno sob lunetas diferentes daquelas criadas por seu moralismo. porque não são capazes de ver a multidimensionalidade do fenômeno envolvido. só existe tráfico porque existe repressão!

o primeiro histograma da matéria mostra o consumo das três drogas que dão título a minha postagem dominical: um espantoso aumento na apreensão de cocaína e crack e igualmente estupefaciente queda na apreensão da maconha. o juiz Ademar Nozari, "a uma década na Vara Criminal de Capão da Canoa" diz: "O tráfico preocupa bastante. Percebo crescimento a cada ano." ele dá suporte à hipótese de que -quanto maior é a apreensão- maior é o tráfico, ou seja, há uma fração eterna e imutável entre a quantidade apreendida e a quantidade transacionada. exceto para a maconha que -por ter menor apreensão- tanbém aponta para outras fontes de distribuição. e, cá entre nós, misturar maconha com crack é pedir incomodação para tratar seriamente do problema. claro que não foi o juiz que misturou.

de sua parte, o promotor Marcelo Araújo Simões dá uma dica sobre como acabar com os homicídios, prática totalmente elogiável: "A sensação é de que 75% dos homicídios ocorrem por causa do tráfico. Um em cada quatro inquéritos é motivado por drogas." tempos atrás, cheguei a ver coisas parecidas ocorrendo com a progressista cidade de Montenegro do Brasil. quer acabar com este tipo de baixaria? mude a política. não se deve afrontar a lei da oferta e procura para provisão de bens regulares! não se deve fechar os olhos para o problema. não se deve deixar guiar pelo moralismo que é insensível à moral da superioridade absoluta da vida humana sobre todos os meandros não-libertários. se não é assassinato, também tem arrombamentos, como diz o próprio autor da reportagem, o sr. José Luís Costa: "jovens viciados em crack, suspeitos de arrombar mais de 20 casas de veranistar por mês na cidade." não é à toa que nunca pensei seriamente em cultivar a tradição gaúcha e que me foi passada de ter casa na praia. para financiar o tráfico de drogas, responsável pela corrupção dos costumes? nem morta!

parece que há mais sabedoria do que a média da negadinha no pensamento do delegado Paulo Perez, de Tramandaí do Brasil: "É como enxugar gelo. Prendemos um traficante, mas aparecem outros". esta de "enxugar gelo" parece estar na moda no mesmo caderno do "onda litorânea"...
ao pensar sobre estes problemas de meu cotidiano (daí a razão de eu manter-te, querido diário), passei a considerar que a melhor maneira de desarticular este mercado de drogas é trnasformar a droga em um bem de demérito legalizado e de consumo garantido pelo governo. ou seja, distribuição gratuita (o que não é a mesma coisa que "bem livre", não é mesmo?). claro que precisamos ter u mgoverno decente, um governo em que a corrupção não seja permeável como água na areia (esta também surge em homenagem à onda litorânea). então pensei: podemos fazer um convênio com algum centro acadêmico de estudantes ciências penais em alguma faculdade suíça, para que este supervisione o estado brasileiro no gerenciamento da oferta gratuita e não caiamos em tentação de deixarmo-nos corromper por incentivos materiais derivados do uso inadequado da prioridade (depois de destruir os incentivos para ofertantes privados) ao enfoque ao problema sob a perspectiva da saúde pública: o lugar de viciado (não estou falando de consumo recreativo, por definição) é nas mãos de médicos, assistentes sociais, e quetais, nunca de traficantes, malvados, meliantes!
DdAB
a imagem, que editei, veio daqui.

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